Pular para o conteúdo principal

COMO UMA SUPOSTA PSICOGRAFIA DE 1932 CHEGOU À VITÓRIA DE JAIR BOLSONARO?


A vitória de Jair Bolsonaro se deu, sabemos, pelo bombardeio de notícias falsas, as fake news, nos perfis do WhatsApp.

Foi um trabalho engenhoso que envolveu uma equipe que manipulou "robôs" para fazer com que postagens pró-Bolsonaro se propagassem nesse portal social popularizado pelos celulares.

CPFs chegaram a ter números gravados para serem usados em "robôs" que, se passando por amigos dos internautas, "recomendavam" postagens favoráveis ao candidato do PSL.

Era esse o método, planejado por Steve Bannon, o publicitário de Donald Trump, para ajudar na vitória de Bolsonaro.

A revista Veja, como pegadinha, não creditou Bolsonaro entre um dos beneficiários da Cambridge Analytica, empresa de Steve Bannon.

Estranhamente a reacionária revista colocou a presidenta do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffmann, como beneficiária, dado que é pura fake news impressa em uma revista da imprensa dita profissional.

Mas essa onda de fake news foi acolhida pelos brasileiros porque teve um precedente: a literatura fake dita "mediúnica", as supostas psicografias que muitos começam a apelidar de psicografakes.

Em tempos de João de Deus, hoje preso, devemos lembrar que mesmo os ditos "médiuns" mais tarimbados sempre produziram literatura fake.

Não houve um estudo sério nem o desenvolvimento de condições para atividades paranormais no Brasil.

Na contramão de Allan Kardec, que a partir dos espetáculos das tábuas Ouija, fez pesquisas sobre paranormalidade, no Brasil a paranormalidade se reduziu a um recreio nivelado ao das "mesas girantes".

Um dos "médiuns", o que usava peruca, fez uma grande pegadinha em 1932, ele que foi uma espécie de cruzamento de Aécio Neves com Jair Bolsonaro na religião dita "espírita".

Ele lançou um trabalho irregular que se anunciava como uma antologia poética ditada pelos grandes escritores falecidos há tempos.

O livro é tão estranho que se chamava "Parnaso", em alusão ao há muito superado movimento parnasiano, numa época em que até o Modernismo se tornava mainstream.

Até o escritor Humberto de Campos, que resenhou, com sutil reprovação, o aberrante livro - que ao longo do tempo sofreu estranhas alterações editoriais, cinco vezes num prazo de quase 25 anos - , era um neo-parnasiano com fortes acentos modernistas.

A propósito, o "médium" do estranho livro se apropriou, depois, de Humberto, e se promoveu com literatura fake usando outros mortos.

De lobby em lobby, o referido "médium" passou a ser um pretenso símbolo de "amor e bondade", numa campanha manipuladora inspirada no trabalho de um jornalista inglês, chamado Malcolm Muggeridge, que trabalhou na BBC.

Ele foi uma espécie de "marqueteiro" de Madre Teresa de Calcutá, beata reacionária com atividades duvidosas de suposta filantropia.

Em favor dela, Muggeridge criou um roteiro que parece novela, mas muita gente insiste em creditar como a "realidade das realidades". Religião tem desses negócios, de criar um terreno onde a fantasia se sobrepõe ao mais contundente realismo.

E aí fizeram isso com o "médium" brasileiro, com essa abordagem que transforma o religioso numa "mercadoria humana" para o consumo da beatitude de muitos.

É uma visão de "caridade" que nunca trouxe resultado concreto algum, só atende a casos pontuais, mas seus ínfimos resultados são compensados com uma adoração acima dos limites, aos níveis de um fanatismo religioso.

Essa idolatria encontra seu paraíso astral nas redes sociais, sobretudo no WhatsApp, onde se publicam memes com frases supostamente sábias desses ídolos religiosos, que na verdade não trazem sabedoria alguma.

No caso do "médium", seus fakes literários fizeram sucesso, são legitimados pelo mercado literário mais complacente e o pobre do Humberto tem sua obra original deixada de lado, em favor dos livros fake atribuídos a ele ou ao tal do "irmão xis".

E isso criou um terreno propício para que obras mentirosas tivessem mais crédito. Basta que uma obra fake soasse agradável para ela ser tida como "verdadeira".

As psicografakes traziam mensagens "edificantes", falavam de Jesus e prometiam a "paz na Terra". Trazem grotescas diferenças em relação ao respectivo estilo do autor atribuído, mas, como mentiras agradáveis, elas são aceitas por todos e até a Justiça recomenda tais aberrações literárias.

E aí, pronto. Vovô trouxe livros fake que dizia terem sido ditados por mortos (seja um "Olavo Bilac" ou uma "Auta de Souza" que "esqueceram" seus estilos peculiares na Terra), e o netinho foi educado a apreciar noticiário fake.

Mas como vovô falava coisas dóceis e o netinho era mais rebelde, então o netinho passou a gostar de falsidades agradáveis, porém mais agressivas. O vovô curtia música clássica, o netinho, rock pesado dos anos 90.

Vovô dava ouvidos ao padre Manuel da Nóbrega, o netinho preferiu algo mais hard, tipo Olavo de Carvalho ou, indo para gerações mais recentes, Nando Moura.

E aí, deu no que deu. Vovô era ultraconservador (embora as "esquerdas médias" vejam nele um suposto progressista) e o netinho seguiu a tendência.

E aí do "sofrimento em silêncio" que vovô dizia aos desafortunados, se deu a "revolta barulhenta" dos remediados.

Os remediados corriam o risco de perder seus privilégios porque os desafortunados tiveram um breve período de prosperidade, nas mãos de um torneiro mecânico que comandou o Executivo federal com admirável talento e empenho.

Daí as revoltas de 2016, que teve o apoio dos partidários do "vovô médium", que havia saído de cena após o estranho penta que só beneficiou a CBF e a "família Felipão" cujo treinador cumprimentou Jair Bolsonaro na final do Brasileirão.

E aí, as mentiras agradáveis que, no passado, fingiam receber mensagens de mortos, no presente produzem notícias falsas de interesse do mais convicto reacionarismo político-ideológico.

No Brasil que cultua essa indústria de fakes, já se produzem livros, documentários e o que vier por aí para glorificar o "vovô médium" e lembrar dos tempos em que ele punha peruca na cabeça e vestia paletós bregas e seus fanáticos seguidores lhes davam flores.

Este é um país em que a paranormalidade mais parece querer parar a normalidade cotidiana e barrar nossa luta por um Brasil realmente melhor.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

BURGUESIA ILUSTRADA E SEU VIRALATISMO

ESSA É A "FELICIDADE" DA BURGUESIA ILUSTRADA. A burguesia ilustrada, que agora se faz de “progressista, democrática e de esquerda”, tenta esconder sua herança das velhas oligarquias das quais descendem. Acionam seus “isentões”, os negacionistas factuais, que atuam como valentões que brigam com os fatos. Precisam manter o faz-de-conta e se passar pela “mais moderna sociedade humana do planeta”, tendo agora o presidente Lula como fiador. A burguesia ilustrada vive sentimentos confusos. Está cheia de dinheiro, mas jura que é “pobre”, criando pretextos tão patéticos quanto pagar IPVA, fazer autoatendimento em certos postos de gasolina, se embriagar nas madrugadas e falar sempre de futebol. Isso fora os artifícios como falar português errado, quase sempre falando verbos no singular para os substantivos do plural. Ao mesmo tempo megalomaníaca e auto-depreciativa, a burguesia ilustrada criou o termo “gente como a gente” como uma forma caricata da simplicidade humana. É capaz de cele...

“COMBATE AO PRECONCEITO” TRAVOU A RENOVAÇÃO REAL DA MPB

O falecimento do cantor e compositor carioca Jards Macalé aos 82 anos, duas semanas após a de Lô Borges, mostra o quanto a MPB anda perdendo seus mestres um a um, sem que haja uma renovação artística que reúna talento e visibilidade. Macalé, que por sorte se apresentou em Belém, no Pará, no Festival Se Rasgum, em 2024. Jards foi escalado porque o convidado original, Tom Zé, não teve condições de tocar no evento. A apresentação de Macalé acabou sendo uma despedida, um dos últimos shows  do artista em sua vida. Belém é capital do Estado da Região Norte de domínio coronelista, fechado para a MPB - apesar da fama internacional dos mestres João Do ato e Billy Blanco - e impondo a música brega-popularesca, sobretudo forró-brega, breganejo e tecnobrega, como mercado único. A MPB que arrume um dueto com um ídolo popularesco de plantão para penetrar nesses locais. Jards, ao que tudo indica, não precisou de dueto com um popularesco de plantão, seja um piseiro ou um axezeiro, para tocar num f...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

O NEGACIONISMO FACTUAL E A 89 FM

Era só o que faltava. Textos que contestam a validade da 89 FM - que celebra 40 anos de existência no dia 02 de dezembro, aniversário de Britney Spears - como “rádio rock” andam sendo boicotados por internautas que, com seu jeito arrogante e boçal, disparam o bordão “Lá vem aquele chato criticar a 89 novamente”. Os negacionistas factuais estão agindo para manter tudo como o “sistema” quer. Sempre existe uma sabotagem quando a hipótese de um governo progressista chega ao poder. Por sorte, Lula andou cedendo mais do que podia e reduziu seu terceiro mandato ao mínimo denominador comum dos projetos sociais que a burguesia lhe autorizou a fazer. Daí não ser preciso apelar para a farsa do “combate ao preconceito” da bregalização cultural que só fez abrir caminho para Jair Bolsonaro. Por isso, a elite do bom atraso investe na atuação “moderadora” do negacionista factual, o “isentão democrático”, para patrulhar as redes sociais e pedir o voicote a páginas que fogem da assepsia jornalística da ...

A RELIGIÃO QUE COPIA NOMES DE SANTOS PARA ENGANAR FIÉIS

SÃO JOÃO DE DEUS E SÃO FRANCISCO XAVIER - Nomes "plagiados" por dois obscurantistas da fé neomedieval "espirita". Sendo na prática uma mera repaginação do velho Catolicismo medieval português que vigorou no Brasil durante boa parte do período colonial, o Espiritismo brasileiro apenas usa alguns clichês da Doutrina Espírita francesa como forma de dar uma fachada e um aparato pretensamente diferentes. Mas, se observar seu conteúdo, se verá que quase nada do pensamento de Allan Kardec foi aproveitado, sendo os verdadeiros postulados fundamentados na Teologia do Sofrimento da Idade Média. Tendo perdido fiéis a ponto de cair de 2,1% para 1,8% segundo o censo religioso de 2022 em relação ao anterior, de 2012, o "espiritismo à brasileira" tenta agora usar como cartada a dramaturgia, sejam novelas e filmes, numa clara concorrência às novelas e filmes "bíblicos" da Record TV e Igreja Universal. E aí vemos que nomes simples e aparentemente simpáticos, como...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...