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LULA DIZ UMA COISA E FAZ OUTRA


Enquanto se espera que alguma coisa se discuta para a tão esperada "reconstrução do Brasil", o presidente Lula, como se o nosso país estivesse bem e não mal, foi viajar ou então fazer reuniões, articulações políticas ou fazer comentários em discursos ou entrevistas. A fome não espera e esse problema, que fez Lula chorar em seus comícios da campanha passada, até agora não recebeu uma solução imediata.

Todavia, Lula procura ser um grande malabarista, um grande ilusionista. Ele viaja e se reúne para dar a impressão de que não está parado. Cria uma agenda movimentada, fértil em propostas e questões e estéril em resultados e decisões, para dar a impressão de que seu governo está a todo vapor. Pouco importam os pobres em geral morrendo famintos e desempregados, deixamos eles para lá e vamos curtir o Carnaval, não é mesmo?

Lula realizou viagens intensas, mais do que sua limitada saúde pode aguentar. E o Brasil pedindo socorro e o presidente vai viajar para o exterior, primeiro cumprindo os objetivos secundários de seu novo governo: promover sua popularidade, blindar sua pessoa e desmontar o bolsonarismo.

Na viagem dos EUA, Lula se encontrou com o presidente Joe Biden, mas também foi ver os parlamentares de esquerda dos EUA - seja de partidos "nanicos" deixados à margem do jogo político, seja um dos grandes partidos polarizantes, o Partido Democrata, de direita moderada, que serve de abrigo para setores esquerdistas (como o antigo MDB que, na ditadura militar, abrigou comunistas e até petebistas moderados) - , incluindo o senador Bernard Sanders.

E aí Lula foi entrevistado na CNN matriz - rede noticiosa bem mais organizada, profissional e competente do que a confusa franquia brasileira - , pela jornalista e cronista política da emissora, Christiane Amanpour, na edição de seu programa Amanpour, um dos mais destacados da programação da rede. Lula disse, a respeito de sua suposta prioridade de governo:

"A minha política é simples: é incluir o povo pobre no orçamento. O povo pobre tem que participar da economia. Nós temos que ter uma política muito forte de incentivo ao pequeno e o médio empreendedor individual. Nós temos que ajudar muito a pequena e média empresas, as cooperativas. Nós temos que voltar a fazer política de infraestrutura, na construção de habitação popular, saneamento básico, em obras de estradas e ferrovias. Ou seja, nós já temos na cabeça o projeto e, mais importante, sabemos como fazer. E pode ficar certo que daqui a quatro anos você vai ver o Brasil muito melhor do que eu recebi".

Lula também enfatizou a "democracia" em seu discurso, uma ideia que anda sendo alardeada em excesso, de forma estranha, não por ser uma ideia reprovável. É porque "democracia" acaba servindo de eufemismo para um projeto político brando, que traga benefícios relativos para as classes populares sem no entanto mexer nas estruturas desiguais da sociedade de classes, mantendo os benefícios dos mais ricos na sua essência.

O que incomoda em Lula é que o presidente quer fazer tudo, sem perceber que o contexto não é tão favorável assim. Lula quer arrombar as portas e derrubar os obstáculos à força, mesmo parecendo mais velho do que gente já finada como Erasmo Carlos e o há poucos dias falecido Burt Bacharach, que com 95 anos incompletos parecia melhor do que Lula.

O golpe político ocorreu há pouco tempo, em 2016. Quase todos os seus personagens estão vivos e fazendo história. Os maiores cérebros de 2016 passaram recibo em Michel Temer e Jair Bolsonaro e toda a multidão golpista que pediu a queda de Dilma Rousseff aparentemente se reduziu a um clubinho de lavajatistas e bolsonaristas, como os invasores de 08 de janeiro último, ou os ricaços-problemas do nível de Jorge Paulo Lemann, acusado de fraudes financeiras da Ambev e Lojas Americanas.

Não há, a meu ver, um contexto para a volta das esquerdas ao poder nem para a realização plena de um Lula que mostra não haver o fôlego político de antes. Pois, se tivesse, já teríamos visto alguma medida de combate à fome, o salário mínimo teria sido reajustado no mês passado - e, na pior das hipóteses, para um valor de pelo menos R$ 1.420, não R$ 1.302 ou R$ 1.320 - e programas de recuperação do emprego formal sendo postas em prática.

Deixar o aumento salarial para o Primeiro de Maio só servirá para a propaganda pessoal de Lula, que fará um espetáculo espalhafatoso para comemorar o reajuste. Só que, até lá, só para o reajuste para o valor de R$ 1.302, 90 reais a mais do que o atual, o brasileiro pobre já perdeu, nos quatro meses deste ano, R$ 360 que, mesmo de forma muito precária, ajudaria a abastecer a casa de alimentos ou pagar uma parte das contas pendentes.

Eu ando muito cético em relação à ânsia de Lula em colocar o Brasil no Primeiro Mundo, porque o contexto não é favorável e é bom demais para ser verdade ele ter as elites neoliberais apoiando ele e, em contrapartida, se acreditar que o presidente brasileiro conseguirá fazer um projeto político mais à esquerda.

Lula diz uma coisa e faz outra. E não é o tal descumprimento de promessas de campanha de natureza "moderada", como teria noticiado o portal UOL, das quais inclui a "conciliação" política e o evitamento da reeleição, pois Lula, acredite se quiser, admite poder se reeleger, num contexto em que, na música, Milton Nascimento e Ozzy Osbourne se aposentaram dos palcos.

Se eu tivesse tantas ilusões e fantasias que habitam a mente de Lula, capaz de, mesmo falando muito em "democracia", ter sido eleito em desobediência aos princípios democráticos de diversidade eleitoral - e ainda por cima com os lulistas ofendendo o concorrente Ciro Gomes enquanto se diziam "agredidos" por ele - , eu me sentiria em um estado de transe emocional e me sentiria irritado quando alguém fosse tentar a me colocar no âmbito da razão.

Pois não vejo sentido Lula querer tanto em quatro anos ou mais. O contexto não permite. As alianças que ele atraiu para si também não. O pouco tempo de distância em relação ao golpe de 2016 muito menos. E vendo que Lula se comporta como se o Brasil estivesse bem e não lançou o tão prometido programa de reconstrução do país no mês passado, apesar de tanto clamar "urgência" e "pressa" para tal fim, dá para perceber que Lula anda agindo como se fosse um ilusionista, um prestidigitador político.

Lula, na verdade, governa para a classe média identitária, a "boa" sociedade da elite do atraso que se recusa a ser chamada por este nome porque senão ela chora. São tataranetos das velhas elites escravocratas da Casa Grande, mas hoje essa patota se considera "tudo de bom", embora seu verniz de "novo" seja desmascarado pelo apreço a coisas velhas que soam medievais, sejam velhos ídolos cafonas, sejam religiosos como os tais "médiuns espíritas" ultraconservadores.

É para essa elite do atraso enrustida que Lula governa, desde que assumiu a parceria política com um Geraldo Alckmin que até hoje não pediu desculpas aos desabrigados de Pinheirinho, o extinto bairro popular de São José dos Campos. O povo pobre é só um detalhe, tratado, infelizmente, como se fosse um bando de animais esperando se tornarem burros e bois de carga e receber ração três vezes ao dia. Faminto e depreciado, o povo pobre não tem força física nem ânimo para participar da economia nem para ser feliz de novo. A fome não espera.

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