Pular para o conteúdo principal

A LIBERDADE QUE A GERAÇÃO GOLPISTA DE 1964 DEU A SEUS NETOS

A BURGUESIA CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA APROVEITA O LEGADO DE LIBERDADE SONHADO PELOS SEUS AVÓS GOLPISTAS DE 1964.

Assim como a fruta não cai fora da árvore, as elites contemporâneas dificilmente podem esconder por muito tempo a herança de seus avós golpistas. Na sociedade "democrática" de hoje, mesmo os ditos "esclarecidos" não escondem seu caráter sensor, discriminando o senso crítico e só aceitando o debate desde que seja evitado justamente o principal: o debate.

A burguesia bronzeada que hoje apoia Lula e se julga "a classe social mais bacana do planeta" quer parecer "tudo de bom". Se acham "sábias" porque só são elas as beneficiadas de um combo social que inclui bons salários, muitos seguidores nas redes sociais e uma capacidade absurda de argumentação que pode transformar besteiras e mentiras em pretensas verdades.

Paciência. A geração que hoje domina as narrativas nas redes sociais pode parecer diferente de seus antepassados apenas na forma. Afinal, se seus avós não aguentavam um minuto de Jango no poder, os netinhos de hoje mal veem a hora de Lula assumir o quarto mandato. Mas, na essência, o caráter golpista continua valendo, sobretudo pela má vontade com o senso crítico que atrofia e sufoca a produção de saber nas universidades, às vezes entregues a teses tresloucadas, como a USP permitir trabalhos sobre uma hipotética "mudança genética" dos supostos "médiuns".

Os "democráticos bem de vida" de hoje, cuja única luta é para ficar com a palavra final nas redes sociais e a conduzir as narrativas de acordo com seus interesses de classe, sempre brigando contra os fatos, têm uma herança intelectual e lúdica que diz muito.

Suas vovós eram senhoras beatas e histéricas que clamavam contra as transformações da humanidade nos anos 1950 e 1960 e que, por isso, com terços e rosários na mão (estes cortesia do católico conservador estadunidense nascido na Irlanda, o padre Patrick Peyton), pediam um golpe militar para "botar ordem" no Brasil. Já os vovôs da atual burguesia de chinelos esbanjavam falso intelectualismo sentados nos sofás, cruzando as pernas para ler, nos jornais, os artigos pseudo-científicos dos "institutos" IPES-IBAD (quando o IPES era apelidado de IPÊS, para forjar simpatia).

Já os papais e mamães eram um pouco mais flexíveis. As mamães viraram dondocas a curtir as festas do colunismo social e aparecer nas colunas de Imbrahim Sued e Zózimo Barroso do Amaral, aos poucos trocando o som orquestrado comercial de Mantovani e Ray Conniff pela disco music. E os papais começavam a conhecer o soft power, um sistema de valores que adaptava o conservadorismo político, intelectual e econômico em uma metodologia mais racionalizada do que coercitiva.

Se ascendendo no Brasil de Fernando Henrique Cardoso, a burguesia contemporânea hoje se espalha, no seu mimetismo, entre as pessoas comuns, se aproveitando da relativa prosperidade trazida pelos dois primeiros mandatos de Lula.

Se os reacionários dos tempos do Orkut cooptaram as esquerdas - sobretudo em "tribunais de Internet" como os organizados pela comunidade "Eu Odeio Acordar Cedo" - para ficarem "desiludidas" com Dilma Rousseff e clamarem por um caminho que chegou ao bolsonarismo, os filhotes do "milagre" tucano de 1995-2002 cooptaram as esquerdas para defenderem uma "democracia do sim", sem senso crítico, sem debate e mantendo as velhas estruturas sociais.

Na "democracia do sim", a liberdade é, na teoria, para todos, desde que determinados "papéis sociais" previamente impostos sejam mantidos. A pobreza, por exemplo. Ser pobre deixou de ser, oficialmente, um sério problema social, para se tornar uma "identidade sociocultural", dentro da gourmetização da miséria que a cultura woke reforça, transformando as favelas brasileiras em paisagens de consumo e em verdadeiros "safáris humanos".

É muito difícil blogues como o nosso esclarecerem as pessoas. Não somos o fã-clube deslumbrado de Lula que se tornou o Brasil 247, mas também não somos os raivosos pseudo-intelectuais como Alexandre Garcia, Rodrigo Constantino, Monark e J. R. Guzzo, e muito menos suas traduções light como Luís Felipe Pondé, Eliane Cantanhede, Demétrio Magnoli  e Merval Pereira.

Há uma estranheza muito grande, mesmo quando blogues como o Linhaça Atômica procuram maior fidelidade aos fatos e questionar verdadeiros dogmas só porque são mentiras ou meias-verdades compartilhadas por um sem-número de pessoas em importantes setores da sociedade.

Temos um padrão de ver o Brasil que é diferente do pré-1964, não por causa de ideias clichês do tipo "os tempos mudaram". É porque, em abril de 1964, se ascendeu uma ordem social contemporânea que, embora seja descendente das velhas elites - os ancestrais mais próximos foram as elites latifundiárias que perderam o protagonismo pleno com a Revolução de 1930 - , tenta parecer mais "moderna" e, pretensamente "democrática", tenta ser a substituta do povo brasileiro.

As elites que retomaram o poder em 1964 e consolidaram seu domínio dez anos depois, com a Era Geisel, tiveram que desenhar um "novo Brasil" que persiste a duras penas, pois hoje o pensamento crítico, mesmo desqualificado pelo "senso comum", continua firme e forte.

O Lulismo 3.0 foi uma forma de disfarçar o DNA golpista da "boa" sociedade de hoje, fazendo com que valores privativos dessas elites se vendam como "universais". Vide a gíria "balada", um jargão privado da juventude riquinha da Faria Lima, eufemismo para um rodízio de pílulas alucinógenas (as tais "balas"), e que se imponhe como uma "gíria do Terceiro Reich", tentando a todo custo romper com a natural transitoriedade e limitação grupal das gírias.

A "boa" sociedade de hoje aproveita a sua liberdade que seus avós pediram nas marchas das famílias em 1964. Embora muitos se sintam horrorizados com a ideia, mas é verdadeiro que a "liberdade" sonhada em 1964 é a mesma sonhada em 2022. Os contextos é que mudam, mas o ideal é o mesmo, querer uma liberdade apenas para quem está bem de vida e quem estiver fora que lute para conquistar essa liberdade, dentro dos limites dos "papéis sociais" determinados pela burguesia ilustrada.

Por isso, há um pavor com a propagação do senso crítico, o que faz com que o negacionista factual, espécie de "isentão democrático" de hoje, seja o jagunço digital a pregar o boicote a páginas "incômodas", a blogues que "falam mal de tudo e de todos", que perturbam a "paz social" de uma "democracia" que só permite dizer "sim" e nunca dizer "não", garantindo a obediência social dos tempos do AI-5, mesmo em tempos "plenamente democráticos".

Agora que conseguiram um país feito para seus privilégios abusivos, dentro de condições de subserviência social de quem não nasceu em berços de ouro, a burguesia de chinelos precisa manter um país asséptico, em que todos precisam estar de acordo com tudo, para assim garantir a felicidade que os vovôs e vovós reacionários de 1964 sonharam para seus netos, que a conquistaram plenamente em 2023.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

BURGUESIA ILUSTRADA E SEU VIRALATISMO

ESSA É A "FELICIDADE" DA BURGUESIA ILUSTRADA. A burguesia ilustrada, que agora se faz de “progressista, democrática e de esquerda”, tenta esconder sua herança das velhas oligarquias das quais descendem. Acionam seus “isentões”, os negacionistas factuais, que atuam como valentões que brigam com os fatos. Precisam manter o faz-de-conta e se passar pela “mais moderna sociedade humana do planeta”, tendo agora o presidente Lula como fiador. A burguesia ilustrada vive sentimentos confusos. Está cheia de dinheiro, mas jura que é “pobre”, criando pretextos tão patéticos quanto pagar IPVA, fazer autoatendimento em certos postos de gasolina, se embriagar nas madrugadas e falar sempre de futebol. Isso fora os artifícios como falar português errado, quase sempre falando verbos no singular para os substantivos do plural. Ao mesmo tempo megalomaníaca e auto-depreciativa, a burguesia ilustrada criou o termo “gente como a gente” como uma forma caricata da simplicidade humana. É capaz de cele...

“COMBATE AO PRECONCEITO” TRAVOU A RENOVAÇÃO REAL DA MPB

O falecimento do cantor e compositor carioca Jards Macalé aos 82 anos, duas semanas após a de Lô Borges, mostra o quanto a MPB anda perdendo seus mestres um a um, sem que haja uma renovação artística que reúna talento e visibilidade. Macalé, que por sorte se apresentou em Belém, no Pará, no Festival Se Rasgum, em 2024. Jards foi escalado porque o convidado original, Tom Zé, não teve condições de tocar no evento. A apresentação de Macalé acabou sendo uma despedida, um dos últimos shows  do artista em sua vida. Belém é capital do Estado da Região Norte de domínio coronelista, fechado para a MPB - apesar da fama internacional dos mestres João Do ato e Billy Blanco - e impondo a música brega-popularesca, sobretudo forró-brega, breganejo e tecnobrega, como mercado único. A MPB que arrume um dueto com um ídolo popularesco de plantão para penetrar nesses locais. Jards, ao que tudo indica, não precisou de dueto com um popularesco de plantão, seja um piseiro ou um axezeiro, para tocar num f...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

O NEGACIONISMO FACTUAL E A 89 FM

Era só o que faltava. Textos que contestam a validade da 89 FM - que celebra 40 anos de existência no dia 02 de dezembro, aniversário de Britney Spears - como “rádio rock” andam sendo boicotados por internautas que, com seu jeito arrogante e boçal, disparam o bordão “Lá vem aquele chato criticar a 89 novamente”. Os negacionistas factuais estão agindo para manter tudo como o “sistema” quer. Sempre existe uma sabotagem quando a hipótese de um governo progressista chega ao poder. Por sorte, Lula andou cedendo mais do que podia e reduziu seu terceiro mandato ao mínimo denominador comum dos projetos sociais que a burguesia lhe autorizou a fazer. Daí não ser preciso apelar para a farsa do “combate ao preconceito” da bregalização cultural que só fez abrir caminho para Jair Bolsonaro. Por isso, a elite do bom atraso investe na atuação “moderadora” do negacionista factual, o “isentão democrático”, para patrulhar as redes sociais e pedir o voicote a páginas que fogem da assepsia jornalística da ...

A RELIGIÃO QUE COPIA NOMES DE SANTOS PARA ENGANAR FIÉIS

SÃO JOÃO DE DEUS E SÃO FRANCISCO XAVIER - Nomes "plagiados" por dois obscurantistas da fé neomedieval "espirita". Sendo na prática uma mera repaginação do velho Catolicismo medieval português que vigorou no Brasil durante boa parte do período colonial, o Espiritismo brasileiro apenas usa alguns clichês da Doutrina Espírita francesa como forma de dar uma fachada e um aparato pretensamente diferentes. Mas, se observar seu conteúdo, se verá que quase nada do pensamento de Allan Kardec foi aproveitado, sendo os verdadeiros postulados fundamentados na Teologia do Sofrimento da Idade Média. Tendo perdido fiéis a ponto de cair de 2,1% para 1,8% segundo o censo religioso de 2022 em relação ao anterior, de 2012, o "espiritismo à brasileira" tenta agora usar como cartada a dramaturgia, sejam novelas e filmes, numa clara concorrência às novelas e filmes "bíblicos" da Record TV e Igreja Universal. E aí vemos que nomes simples e aparentemente simpáticos, como...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...