Pular para o conteúdo principal

UMA RÁDIO PERDIDA EM DUAS HISTÓRIAS


Não iria escrever mais sobre a Rádio Cidade, tomando como encerrado de vez o assunto.

Mas nas mídias sociais as pessoas embolaram as duas histórias.

Falavam do saudosismo da Rádio Cidade de 1977, com a vinheta "Cidade... ooooooi!"" (sem trocadilho com a Oi FM), mas descrevendo a fase recente do suposto "rock de verdade".

A Rádio Cidade morreu porque caiu em muita contradição.

No fundo foi uma rádio ressentida de não ter tido o carisma da Fluminense FM.

Até se esforçou para obter blindagem a tal "política da boa vizinhança", mas com toda certeza a Cidade era "bendita" demais para o rock.

Tudo ficou surreal demais, mas seria o cúmulo se a rádio sobrevivesse nos 102,9 mhz para comemorar 40 anos renegando a sua proposta original.

As pessoas caíam em contradição, falando dos primórdios de 1977 mas exaltando o rock'n'roll.

Em 1977 a Rádio Cidade era Donna Summer, Earth Wind & Fire, Bee Gees, Boney M, Village People, Frenéticas.

Naquela época existiam Iron Maiden e AC/DC, ainda que com outros vocalistas, e os Ramones já estavam no seu segundo LP.

Led Zeppelin, Black Sabbath e Deep Purple já eram considerados "velhos", apesar de uns anos de existência.

Não faria sentido celebrarmos os 40 anos da Rádio Cidade com uma trilha sonora da Fluminense FM.

Algo que parece vir de um livro da série FEBEAPÁ de Stanislaw Ponte Preta.

Era como ter de ir à praia da Zona Sul carioca usando uma jaqueta de couro. Não dá.

Algumas coisas esquisitas vieram no radialismo rock do Rio de Janeiro, diante dessa transformação do rock em seita tendo como "templo eletrônico" a Rádio Cidade.

Ficou até fácil qualquer locutor poperó virar "roqueiro" e se autopromover com isso.

Ficou beleza: o cara passa o tempo todo trabalhando com dance music, pop e brega em outras rádios, aí assume a "programação rock" da Cidade e vira "roqueirão da pesada".

Só falta um locutor pop desses arrumar coluna numa revista de rock e botar um ghost writer para escrever por ele.

Mas poucos esquecem que os locutores que passaram pela Cidade "roqueira" são locutores do tipo "esquemão", iguaizinhos aos de qualquer rádio pop.

Rhoodes, Paulo Becker, Demmy Morales e VanDamme são da mesma turma de Marcelo Arar, Mário Bittencourt, DJ Saddam, Victor Orelhinha e outros que vestem a camisa do pop dançante.

Uma mesma turma que queria virar o rádio FM de cabeça para baixo, derrubando rádios tradicionais, como Fluminense FM e Imprensa FM.

Ou mesmo a Rádio Cidade de 1977 que tocava "Good Times" do Chic e "Going Back to My Roots" do Odyssey e o  "rock" que mais marcou sua trajetória são as músicas "Rock The Boat" do Hues Corporation e "Rock With You" de Michael Jackson.

Se a Rádio Cidade tivesse honrado sua história, não teria forçado tanto a barra nos últimos anos.

A Cidade poderia ser Pearl Jam, Offspring e Guns N'Roses, tocando algo dos Titãs, Pitty e Legião Urbana, até Raimundos e CPM22, Scalene e Suricato.

Mas teria que colocar uma Rihanna, um Calvin Harris, um Pharrell Williams, uma Lady Gaga, uma Taylor Swift, um Kanye West, uma Beyoncé Knowles.

Não podia despejar rock pesado que até fazia os radialistas da Cidade torcerem o nariz. Soa estranho ouvir a vinheta de uma moça sexy sussurrar "Cidade..." e o toca-CD despejar um Slayer.

Fico até imaginando se o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, pudesse revelar gravações com locutores da Cidade esculhambando Ozzy Osbourne e Bruce Dickinson.

O fracasso se deu por causa disso. CONTRADIÇÕES.

A Rádio Cidade queria comemorar 40 anos roubando os louros da Fluminense FM.

Apesar da patota entusiasmada, a audiência da rádio caiu por um motivo bem simples.

A Rádio Cidade era pop demais para ser rock, e soou roqueira demais para o pop.

Desagradou gregos e troianos. Essa é a verdade.

Por mim, a Rádio Cidade morreu em 1995, o que veio depois foi uma "Jovem Pan com guitarras".

Não tinha que dar certo.

Agora acabou, e o jeito é pensar o radialismo rock do zero.

Sem os rhoodes e demmys, perdidos e boleiros, sem bandas cheias de clássicos e lados B para tocar, mas que se restringem a apenas um ou dois mega-sucessos na programação.

E parar de misturar as coisas, misturando a Rádio Cidade de 1977 com forçadas alusões ao rock.

Rádio Cidade nunca foi e nem será uma Fluminense FM. Teve até oportunidade de competir com a Eldo Pop, mas não quis.

Portanto, acabou. Adeus. Agora é só uma rádio digital na Internet.

Que não precisará comemorar 40 anos fingindo abraçar uma história que a própria rádio jogou no lixo.

Pop demais para o rock, rock demais para o pop. Agora chega.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

BURGUESIA ILUSTRADA E SEU VIRALATISMO

ESSA É A "FELICIDADE" DA BURGUESIA ILUSTRADA. A burguesia ilustrada, que agora se faz de “progressista, democrática e de esquerda”, tenta esconder sua herança das velhas oligarquias das quais descendem. Acionam seus “isentões”, os negacionistas factuais, que atuam como valentões que brigam com os fatos. Precisam manter o faz-de-conta e se passar pela “mais moderna sociedade humana do planeta”, tendo agora o presidente Lula como fiador. A burguesia ilustrada vive sentimentos confusos. Está cheia de dinheiro, mas jura que é “pobre”, criando pretextos tão patéticos quanto pagar IPVA, fazer autoatendimento em certos postos de gasolina, se embriagar nas madrugadas e falar sempre de futebol. Isso fora os artifícios como falar português errado, quase sempre falando verbos no singular para os substantivos do plural. Ao mesmo tempo megalomaníaca e auto-depreciativa, a burguesia ilustrada criou o termo “gente como a gente” como uma forma caricata da simplicidade humana. É capaz de cele...

“COMBATE AO PRECONCEITO” TRAVOU A RENOVAÇÃO REAL DA MPB

O falecimento do cantor e compositor carioca Jards Macalé aos 82 anos, duas semanas após a de Lô Borges, mostra o quanto a MPB anda perdendo seus mestres um a um, sem que haja uma renovação artística que reúna talento e visibilidade. Macalé, que por sorte se apresentou em Belém, no Pará, no Festival Se Rasgum, em 2024. Jards foi escalado porque o convidado original, Tom Zé, não teve condições de tocar no evento. A apresentação de Macalé acabou sendo uma despedida, um dos últimos shows  do artista em sua vida. Belém é capital do Estado da Região Norte de domínio coronelista, fechado para a MPB - apesar da fama internacional dos mestres João Do ato e Billy Blanco - e impondo a música brega-popularesca, sobretudo forró-brega, breganejo e tecnobrega, como mercado único. A MPB que arrume um dueto com um ídolo popularesco de plantão para penetrar nesses locais. Jards, ao que tudo indica, não precisou de dueto com um popularesco de plantão, seja um piseiro ou um axezeiro, para tocar num f...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

O NEGACIONISMO FACTUAL E A 89 FM

Era só o que faltava. Textos que contestam a validade da 89 FM - que celebra 40 anos de existência no dia 02 de dezembro, aniversário de Britney Spears - como “rádio rock” andam sendo boicotados por internautas que, com seu jeito arrogante e boçal, disparam o bordão “Lá vem aquele chato criticar a 89 novamente”. Os negacionistas factuais estão agindo para manter tudo como o “sistema” quer. Sempre existe uma sabotagem quando a hipótese de um governo progressista chega ao poder. Por sorte, Lula andou cedendo mais do que podia e reduziu seu terceiro mandato ao mínimo denominador comum dos projetos sociais que a burguesia lhe autorizou a fazer. Daí não ser preciso apelar para a farsa do “combate ao preconceito” da bregalização cultural que só fez abrir caminho para Jair Bolsonaro. Por isso, a elite do bom atraso investe na atuação “moderadora” do negacionista factual, o “isentão democrático”, para patrulhar as redes sociais e pedir o voicote a páginas que fogem da assepsia jornalística da ...

A RELIGIÃO QUE COPIA NOMES DE SANTOS PARA ENGANAR FIÉIS

SÃO JOÃO DE DEUS E SÃO FRANCISCO XAVIER - Nomes "plagiados" por dois obscurantistas da fé neomedieval "espirita". Sendo na prática uma mera repaginação do velho Catolicismo medieval português que vigorou no Brasil durante boa parte do período colonial, o Espiritismo brasileiro apenas usa alguns clichês da Doutrina Espírita francesa como forma de dar uma fachada e um aparato pretensamente diferentes. Mas, se observar seu conteúdo, se verá que quase nada do pensamento de Allan Kardec foi aproveitado, sendo os verdadeiros postulados fundamentados na Teologia do Sofrimento da Idade Média. Tendo perdido fiéis a ponto de cair de 2,1% para 1,8% segundo o censo religioso de 2022 em relação ao anterior, de 2012, o "espiritismo à brasileira" tenta agora usar como cartada a dramaturgia, sejam novelas e filmes, numa clara concorrência às novelas e filmes "bíblicos" da Record TV e Igreja Universal. E aí vemos que nomes simples e aparentemente simpáticos, como...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...