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BEYONCÉ KNOWLES E A QUESTÃO DO IDENTITARISMO


Como a Ivete Sangalo, a cantora estadunidense Beyoncé Knowles é do tipo de ídolo que não pode ser criticado, porque seus fanáticos fãs reagem de maneira violenta e furiosa.

Eu, por exemplo, não posso abrir comentários porque, no caso de posturas polêmicas, como considerar Ivete Sangalo uma grande canastrona musical, isso geraria reações de fazer os bolsonaristas parecerem um bando de moleques pequenos e inofensivos.

Devo explicar que Ivete tem até boa voz, embora limitada nos alcances vocais (em "A Lua Que Eu Te Dei", por exemplo, ela desafina feio no final), e o repertório é medíocre e pretensioso.

Mas não se pode exercer senso crítico no Brasil. Na Internet existe muita gente reacionária, mesmo sob o verniz da esquerda festiva ou do isentismo passa-pano.

Chamar Emicida e Criolo de medíocres é um ato de coragem, que nem o musicólogo mais técnico se atreve a arriscar. Para todo efeito, Emicida, Criolo, Ivete Sangalo e similares são "verdades absolutas e indiscutíveis" e devem ser vistas como "gurus visionários e salvadores da humanidade planetária".

Lá fora, Beyoncé Knowles até tem seus fanáticos, mas, por incrível que pareça, é no Brasil que ela também tem os "bolsomínions" para chamar de seus.

No exterior, Beyoncé corresponde àquela "obrigatoriedade" do chamado "capital cultural" (ver Jessé Souza).

Assim como, no Brasil, os homens burgueses nascidos na década de 1950 são "obrigados" a gostar de Frank Sinatra e os nascidos nos anos 1960 são "obrigados" a gostar de Elton John, nos EUA as mulheres descoladas nascidas, pelo menos, entre 1978 e 1987, têm que gostar de Beyoncé.

É mais ou menos a lógica do alistamento militar no gosto musical etário. Em que pese reconhecer ou não os valores desses cantores, isso soa um dirigismo musical etário. E acho isso muito ruim.

Não vejo problema se um homem à beira dos 70 anos de idade prefira ouvir Adolescents a Frank Sinatra, ou quem caminha para os 55 anos prefira as novidades eletrônicas da Audio Library do YouTube do que qualquer balada romântica pós-Live Aid dos músicos britânicos pós-1968.

Ou alguém que, no Brasil, tem uns 52 ou 53 anos achar que Pennywise é melhor do que Dire Straits.

Assim como não vejo problema em uma moça nascida em 1980 ou 1981 no Brasil preferir Sylvia Telles a Ivete Sangalo e, nos EUA, preferir Laura Nyro a Beyoncé Knowles.

Mas esses protocolos existem, e são defendidos com unhas e dentes pela multidão obscurantista das redes sociais.

Dito isso, vamos para um texto de alguém com coragem de poder tirar Beyoncé do seu pedestal.

É um texto de Carlos Fernandes, do seu perfil no Facebook, reproduzido no Diário do Centro do Mundo.

Ele desfaz o mito de Beyoncé que inspira a idolatria cega que se tem principalmente no Brasil, onde há a vassalagem extrema a tudo que representa hit-parade nos EUA (mesmo se os ídolos forem britânicos, italianos, canadenses ou suecos).

E aí ele lembra de coisas como Beyoncé estando "abraçada ao marido que a espancou" - o que contraria a imagem de "empoderamento feminista" que tanto blinda a cantora - e comentou o oportunismo da estrela que, só por ser negra, se apropriou das raízes do povo africano.

Ela realizou um videoclipe em "homenagem" aos africanos e, em seguida, tomou de suas mãos um diamante avaliado em R$ 161 milhões.

Ela ainda apareceu ostentando uma joia da Tiffany's, ao lado do marido Jay Z, um rapper milionário e de alta visibilidade que disputa os holofotes com Kanye West, o astro pretensioso que quer ser, em breve, conhecido apenas pelo home de "Ye".

Carlos Fernandes não citou outros aspectos duvidosos da cantora, como a sua marca esportiva Ivy Park ser acusada de explorar mão-de-obra escrava. 

Ou de apoiar o Partido Democrata dos EUA, progressista para os padrões da classe média estadunidense, mas reacionário quanto às políticas externas para o Oriente Médio e América Latina (inclui o Brasil).

Devemos lembrar que foi sob o governo do Partido Democrata que ocorreram os golpes contra João Goulart, em 1964, e Dilma Rousseff, em 2016.

O Partido Republicano é barra-pesada, no que se refere à política externa dos EUA, mas o Partido Democrata, neste setor, consegue ser pior, segundo especialistas, pelo zelo extremado ao seu país.

Fernandes alerta que o identitarismo é uma das armas mais estratégicas do liberalismo econômico, ou seja, é uma causa que está de acordo com o capitalismo e não o contrário.

E aí as esquerdas brasileiras reagem com vaias. Afinal, o identitarismo é o motor dessa "Contracultura de resultados" que prevalece no Brasil, com seu hedonismo permissivista, abusivo e cafona.

Um estranho identitarismo cuja rebeldia é de fachada, apenas imitando formalmente o aparato dos contraculturalistas de 1968-1969, a fase mais banalizada da Contracultura original. 

E isso com trilha sonora que, em vez de ser de rock, folk e MPB mais cabeça, é de brega em geral (da pisadinha ao "funk"), MPB carneirinha (tipo Anavitória ou Melim) ou pós-tropicalistas medianos (tipo Emicida e Criolo).

Já dá para ver que é uma pretensa Contracultura à brasileira, culturalmente menos relevante, até por achar que o esquerdismo vencerá sem esforço, apesar de, fora do Brasil-Instagram, o golpismo bolsonarista ser uma ameaça altamente considerável.

Daí que no Brasil hedonista de hoje, Beyoncé Knowles parece uma divindade. Mas nos EUA, pelo menos, ela é apenas um nome do mainstream que não faz sequer cócegas ao establishment. Lá fora ela nada tem da imagem libertária que só vale em países como o Brasil.


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