Pular para o conteúdo principal

CULTURA MUSICAL NO BRASIL VIVE SITUAÇÃO VERGONHOSA


Dias atrás, o genial João Donato faleceu e o que temos na música brasileira? Michael Sullivan cantando Xuxa (?!) e Tim Maia? Furacão 2000? É O Tchan? Série com Chitãozinho & Xororó? O "trap", o consórcio de "funk" e da terceira divisão do hip hop brasileiro cuja batida tem o som de lata de ervilha? 

A notícia de um festival de inverno a ser realizado na Marina da Glória, no Rio de Janeiro, é reflexo desse cenário cultural lamentável em que vivemos. Da MPB autêntica, o que temos são nomes de grande talento, mas inócuos no contexto artístico e sociocultural atual, e que já estão veteranos e idosos, em maioria. 

De resto, MPB carneirinha tipo Anavitória e interações entre "provocativos" como Liniker com o cantor de sambrega Péricles (de uma corrente politicamente correta que age como pastiche do samba autêntico, o que eu chamo de "imitasamba").

E isso para não mencionar os citados Michael Sullivan e Furacão 2000. Aliás, noto em Michael Sullivan e no DJ Rômulo Costa o mesmo semblante cínico, de grandes oportunistas musicais, que se vendem falsamente como "vanguarda" sendo, na verdade, o que há de mais retaguarda na música.

Mas, no sistema de valores invertido e deteriorado que é o brasileiro, quem tem talento, sensibilidade, senso crítico e tem mais de dois neurônios funcionando é que sofre discriminação. O verdadeiro preconceito massacra a MPB autêntica, o Rock Brasil, as canções bem feitas e bem arranjadas, aos músicos que tocam instrumentos de maneira magistral e compõem de maneira formidável.

A arrogância que contamina desde intelectuais e artistas conhecidos apenas no meio dos "bacanas" - aquela burguesia sociocultural que, digamos, fica sempre "se achando" - , mas atinge também muitos jovens e adultos narcisistas nas redes sociais, tenta inverter as coisas.

Ultimamente, esses usurpadores do senso comum, que se acham "donos da verdade absoluta", enquanto glorificam a canastrice musical de um Michael Sullivan e acham que o trap é a "salvação do planeta", esculhambam nomes como Tom Jobim, João Gilberto, Renato Russo, Cazuza e Raul Seixas, só não fazendo isso com Rita Lee, Elis Regina e o ainda vivo (ainda bem) Milton Nascimento para não causar sérios problemas de natureza identitária, cuja punição é o cancelamento nas redes sociais e o linchamento virtual do "tribunal da Internet", principal órgão do Supremo Tribunal do Umbigo.

Vivemos uma situação sociocultural deplorável, onde a mediocridade se expressa principalmente pela multiplicação, como um câncer, de subcelebridades e pseudoartistas que, uma vez conquistada a fama, se recusam a largar o osso, e ainda ficam tirando onda. 

Quando a sensata Paola Carosella - uma argentina que entende mais de Brasil do que muito brasileirão na moda hoje em dia - criticou a subcelebridade Virgínia Fonseca por postar no Instagram fotos com "cara de bunda" (olhar sem muita expressão), esta reagiu com "fotos sensuais" como se estivesse provocando a outra.

Se vemos isso no âmbito comportamental em geral, é claro que vemos que a trilha sonora, que aos poucos substitui piseiros e sofrentes pelo "pagode romântico" com sorriso maior que a boca e pelo trap com suas latas de ervilha "percussivas", tem que seguir esse quadro lamentável.

É de chorar que, com esse cenário sociocultural - em que se acredita na ilusão de que é só chover dinheiro que a mediocridade musical "melhora", o que vimos não ter resultado prático algum - , o Brasil se acha na certeza absoluta de que vai se tornar potência de Primeiro Mundo. Nem em sonhos. O nosso país ainda tem muito que aprender para ser um país realmente desenvolvido, mesmo para atingir os parâmetros imperfeitos dos países do G7.

O Brasil dos últimos tempos sobe nos pedestais e o que as subcelebridades mais fazem é viajar para o exterior. Ficam ostentando sua extravagante mediocridade nas fotos das redes sociais, mas vamos combinar que, quando estão lá, são completos anônimos fazendo turismo sem necessidade, enquanto muita gente com mais talento, mas sem emprego e sem vez na vida não deseja muito senão ter uma qualidade de vida satisfatória.

Hoje o governo Lula fala em taxar os super-ricos, mas o que vemos é que estão surgindo outros super-ricos, não bastassem os empresários e banqueiros ajudados por Michel Temer, Jair Bolsonaro e Coronavírus. Temos gente que não tem o que dizer ganhando demais, porque eles têm a habilidade de dar sentido a coisas sem sentido, num contexto em que trabalhar em Comunicação deixou de ser um compromisso de informar bem para ser uma tarefa de divertir e fazer os outros rirem.

Não há condição para o Brasil virar potência de Primeiro Mundo, porque um país desenvolvido não se faz com parquinho de diversões para a "boa" sociedade brincar e desperdiçar sua grana nababesca em doses igualmente nababescas de cerveja e cigarro. Esse pessoal é justamente o que há de mais atrasado no nosso país e sua arrogância é bem receptiva para esses festivais de música que combinam uma MPB veterana mais inofensiva, uma MPB recente mais carneirinha, provocativos identitários de plantão e o que vier de brega-popularesco a transformar nossos ouvidos em esgoto.

Um país de quinta categoria não pode virar nação de Primeiro Mundo. A vida não é um parquinho de diversões.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

RELIGIÃO DO AMOR?

Vejam como são as coisas, para uma sociedade que acha que os males da religião se concentram no neopentecostalismo. Um crime ocorrido num “centro espírita” de São Luís, no Maranhão, mostra o quanto o rótulo de “kardecismo” esconde um lodo que faz da dita “religião do amor” um verdadeiro umbral. No “centro espírita” Yasmin, a neta da diretora da casa, juntamente com seu namorado, foram assaltar a instituição. Os tios da jovem reagiram e, no tiroteio, o jovem casal e um dos tios morreram. Houve outros casos ao longo dos últimos anos. Na Taquara, no Rio de Janeiro, um suposto “médium” do Lar Frei Luiz foi misteriosamente assassinado. O “médium” era conhecido por fraudes de materialização, se passando por um suposto médico usando fantasias árabes de Carnaval, mas esse incidente não tem relação com o crime, ocorrido há mais de dez anos. Tivemos também um suposto latrocínio que tirou a vida de um dirigente de um “centro espírita” do Barreto, em Niterói, Estado do Rio de Janeiro. Houve incênd...

LULA GLOBALIZOU A POLARIZAÇÃO

LULA SE CONSIDERA O "DONO" DA DEMOCRACIA. Não é segredo algum, aqui neste blogue, que o terceiro mandato de Lula está mais para propaganda do que para gestão. Um mandato medíocre, que tenta parecer grandioso por fora, através de simulacros que são factoides governamentais, como os tais “recordes históricos” que, de tão fáceis, imediatos e fantásticos demais para um país que estava em ruínas, soam ótimos demais para serem verdades. Lula só empolga a bolha de seus seguidores, o Clube de Assinantes VIP do Lulismo, que quer monopolizar as narrativas nas redes sociais. E fazendo da política externa seu palco e seu palanque, Lula aposta na democracia de um homem só e na soberania de si mesmo, para o delírio da burguesia ilustrada que se tornou a sua base de apoio. Só mesmo sendo um burguês enrustido, mesmo aquele que capricha no seu fingimento de "pobreza", para aplaudir diante de Lula bancando o "dono" da democracia. Lula participou da Assembleia Geral da ONU e...

LUÍS INÁCIO SUPERSTAR

Não podemos estragar a brincadeira. Imagine, nós, submetidos aos fatos concretos e respirando o ar nem sempre agradável da realidade, termos que desmascarar o mundo de faz-de-conta do lulismo. A burguesia ilustrada fingindo ser pobre e Lula pelego fingindo governar pelos miseráveis. Nas redes sociais, o que vale é a fantasia, o mundo paralelo, o reino encantado do agradável, que ganha status de “verdade” se obtém lacração na Internet e reconhecimento pela mídia patronal. Lula tornou-se o queridinho das esquerdas festivas, atualmente denominadas woke , e de uma burguesia flexível em busca de tudo que lhe pareça “legal”, daí o rótulo “tudo de bom”. Mas o petista é visto com desconfiança pelas classes populares que, descontando os “pobres de novela”, não se sentem beneficiadas por um governo que dá pouco aos pobres, sem tirar muito dos ricos. A aparente “alta popularidade” de Lula só empolga a “boa” sociedade que domina as narrativas nas redes sociais. Lula só garante apoio a quem já está...

BURGUESIA ILUSTRADA E SEU VIRALATISMO

ESSA É A "FELICIDADE" DA BURGUESIA ILUSTRADA. A burguesia ilustrada, que agora se faz de “progressista, democrática e de esquerda”, tenta esconder sua herança das velhas oligarquias das quais descendem. Acionam seus “isentões”, os negacionistas factuais, que atuam como valentões que brigam com os fatos. Precisam manter o faz-de-conta e se passar pela “mais moderna sociedade humana do planeta”, tendo agora o presidente Lula como fiador. A burguesia ilustrada vive sentimentos confusos. Está cheia de dinheiro, mas jura que é “pobre”, criando pretextos tão patéticos quanto pagar IPVA, fazer autoatendimento em certos postos de gasolina, se embriagar nas madrugadas e falar sempre de futebol. Isso fora os artifícios como falar português errado, quase sempre falando verbos no singular para os substantivos do plural. Ao mesmo tempo megalomaníaca e auto-depreciativa, a burguesia ilustrada criou o termo “gente como a gente” como uma forma caricata da simplicidade humana. É capaz de cele...

“COMBATE AO PRECONCEITO” TRAVOU A RENOVAÇÃO REAL DA MPB

O falecimento do cantor e compositor carioca Jards Macalé aos 82 anos, duas semanas após a de Lô Borges, mostra o quanto a MPB anda perdendo seus mestres um a um, sem que haja uma renovação artística que reúna talento e visibilidade. Macalé, que por sorte se apresentou em Belém, no Pará, no Festival Se Rasgum, em 2024. Jards foi escalado porque o convidado original, Tom Zé, não teve condições de tocar no evento. A apresentação de Macalé acabou sendo uma despedida, um dos últimos shows  do artista em sua vida. Belém é capital do Estado da Região Norte de domínio coronelista, fechado para a MPB - apesar da fama internacional dos mestres João Do ato e Billy Blanco - e impondo a música brega-popularesca, sobretudo forró-brega, breganejo e tecnobrega, como mercado único. A MPB que arrume um dueto com um ídolo popularesco de plantão para penetrar nesses locais. Jards, ao que tudo indica, não precisou de dueto com um popularesco de plantão, seja um piseiro ou um axezeiro, para tocar num f...

O ERRO QUE DENISE FRAGA COMETEU, NA BOA-FÉ

A atriz Denise Fraga, mesmo de maneira muito bem intencionada, cometeu um erro ao dar uma entrevista ao jornal O Estado de São Paulo para divulgar o filme Livros Restantes, dirigido por Márcia Paraíso, com estreia prevista para 11 de dezembro. Acreditando soar “moderna” e contemporânea, Denise, na melhor das intenções, cometeu um erro na boa-fé, por conta do uso de uma gíria. “As mulheres estão mais protagonistas das suas vidas. Antes esperavam que aos 60 você estivesse aposentando; hoje estamos indo para a balada com os filhos”. Denise acteditou que a gíria “balada” é uma expressão da geração Z, voltada a juventude contemporânea, o que é um sério equívoco sem saber, Denise cometeu um grave erro de citar uma gíria ligada ao uso de drogas alucinógenas por uma elite empresarial nos agitos noturnos dos anos 1990. A gíria “balada” virou o sinônimo do “vocabulário de poder” descrito pelo jornalista britânico Robert Fisk. Também simboliza a “novilíngua” do livro 1984, de George Orwell, no se...

O NEGACIONISMO FACTUAL E A 89 FM

Era só o que faltava. Textos que contestam a validade da 89 FM - que celebra 40 anos de existência no dia 02 de dezembro, aniversário de Britney Spears - como “rádio rock” andam sendo boicotados por internautas que, com seu jeito arrogante e boçal, disparam o bordão “Lá vem aquele chato criticar a 89 novamente”. Os negacionistas factuais estão agindo para manter tudo como o “sistema” quer. Sempre existe uma sabotagem quando a hipótese de um governo progressista chega ao poder. Por sorte, Lula andou cedendo mais do que podia e reduziu seu terceiro mandato ao mínimo denominador comum dos projetos sociais que a burguesia lhe autorizou a fazer. Daí não ser preciso apelar para a farsa do “combate ao preconceito” da bregalização cultural que só fez abrir caminho para Jair Bolsonaro. Por isso, a elite do bom atraso investe na atuação “moderadora” do negacionista factual, o “isentão democrático”, para patrulhar as redes sociais e pedir o voicote a páginas que fogem da assepsia jornalística da ...

A RELIGIÃO QUE COPIA NOMES DE SANTOS PARA ENGANAR FIÉIS

SÃO JOÃO DE DEUS E SÃO FRANCISCO XAVIER - Nomes "plagiados" por dois obscurantistas da fé neomedieval "espirita". Sendo na prática uma mera repaginação do velho Catolicismo medieval português que vigorou no Brasil durante boa parte do período colonial, o Espiritismo brasileiro apenas usa alguns clichês da Doutrina Espírita francesa como forma de dar uma fachada e um aparato pretensamente diferentes. Mas, se observar seu conteúdo, se verá que quase nada do pensamento de Allan Kardec foi aproveitado, sendo os verdadeiros postulados fundamentados na Teologia do Sofrimento da Idade Média. Tendo perdido fiéis a ponto de cair de 2,1% para 1,8% segundo o censo religioso de 2022 em relação ao anterior, de 2012, o "espiritismo à brasileira" tenta agora usar como cartada a dramaturgia, sejam novelas e filmes, numa clara concorrência às novelas e filmes "bíblicos" da Record TV e Igreja Universal. E aí vemos que nomes simples e aparentemente simpáticos, como...

“JORNALISMO DA OTAN” BLINDA CULTURALISMO POPULARESCO DO BRASIL

A bregalização e a precarização de outros valores socioculturais no Brasil estão sendo cobertos por um véu que impede que as investigações e questionamentos se tornem mais conhecidos. A ideologia do “Jornalismo da OTAN” e seu conceito de “culturalismo sem cultura”, no qual o termo “cultura” é um eufemismo para propaganda de manipulação política, faz com que, no Brasil, a mediocridade e a precarização cultural sejam vistas como um processo tão natural quanto o ar que respiramos e que, supostamente, reflete as vivências e sentimentos da população de cada região. A mídia de esquerda mordeu a isca e abriu caminho para o golpismo político de 2016, ao cair na falácia do “combate ao preconceito” da bregalização. A imprensa progressista quase faliu por adotar a mesma agenda cultural da mídia hegemônica, iludida com os sorrisos desavisados da plateia que, feito gado, era teleguiada pelo modismo popularesco da ocasião. A coisa ainda não se resolveu como um todo, apesar da mídia progressista ter ...

O BRASIL DOS SONHOS DA FARIA LIMA

Pouca gente percebe, mas há um poder paralelo do empresariado da Faria Lima, designado a moldar um sistema de valores a ser assimilado “de forma espontânea” por diversos públicos que, desavisados, tom esses valores provados como se fossem seus. Do “funk” (com seu pseudoativismo brega identitário) ao Espiritismo brasileiro (com o obscurantismo assistencialista dos “médiuns”), da 89 FM à supervalorização de Michael Jackson, do fanatismo gurmê do futebol e da cerveja, do apetite “original” pelas redes sociais, pelo uso da gíria “balada” e dos “dialetos” em portinglês (como “ dog ”, “ body ” e “ bike ”), tudo isso vem das mentes engenhosas das elites empresariais do Itaim Bibi, na Zona Sul paulistana, e de seis parceiros eventuais como o empresariado carnavalesco de Salvador e o coronelismo do Triângulo Mineiro, no caso da religião “espírita”. E temos a supervalorização de uma banda como Guns N'Roses, que não merece a reputação de "rock clássico" que recebe do público brasile...