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A SEGUNDA AGONIA DOS DESABRIGADOS DO EDIFÍCIO DE PAISSANDU


Mais chocante do que a tragédia em que sofreram os desabrigados do extinto edifício Wilton Paes de Almeida, no bairro de Paissandu, em São Paulo, é o tratamento que eles recebem de parte da sociedade.

Eles são tratados como se tivessem sido criminosos, condenados porque fizeram ocupação irregular e porque supostamente fazem parte de militantes sem-teto.

Não fosse suficiente o sofrimento que tira o sono de muitos, assustados com a lembrança do fogo ardendo diante deles, destruindo tudo rapidamente, esses moradores têm que aguentar esses ataques.

O ex-prefeito João Dória Jr. foi um dos que chamaram as vítimas dessa tragédia de "criminosos".

Jair Bolsonaro também os criminalizou ainda cometeu o erro de atribuir as vítimas a ligação com o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto, mas o líder do MTST, Guilherme Boulos, negou tal suposição.

O edifício Wilton Paes de Almeida, abandonado há anos e ocupado, sem autorização, por cerca de 250 pessoas, era uma construção de 1966 que o incêndio destruiu completamente.

Na madrugada, o fogo atingiu o edifício, que já era muito frágil e não tinha sequer elevador, o que fez com que o vão do poço ajudasse no agravamento do incêndio.

Segundo o corpo dos bombeiros, um resgate de uma das vítimas só não foi possível por pouquíssimos segundos, e a vítima acabou desaparecida entre os escombros.

Em São Paulo, quatro edifícios construídos na década de 1960 sofreram incêndios.

O edifício Andraus, inaugurado em 1962, sofreu um incêndio em 1972, matando 16 pessoas e destruindo seus 27 andares. Foi recuperado e o edifício existe até hoje.

O edifício Grande Avenida, inaugurado em 1966, sofreu dois incêndios que destruíram seus andares: um em 1969, sem vítimas e outro em 1981, com 17 mortos. Foi recuperado e continua existindo.

O edifício Joelma foi inaugurado em 1971 e sofreu a pior tragédia desse tipo, sendo totalmente destruído por um grave incêndio, matando 188 pessoas.

O Wilton Paes de Almeida tornou-se o quarto. Até agora sem informação oficial de mortos, com apenas um confirmado. O edifício foi destruído e deve demorar para haver um novo destino para a área, provavelmente um novo prédio.

Neste último caso, as vítimas não eram moradores autorizados nem profissionais, mas moradores informais, ocupantes que viam num prédio abandonado uma opção urgente de moradia.

O prédio, que além de ter abrigado a Superintendência da Polícia Federal, tinha escritórios de diversas empresas, estava abandonado há tempos. Desde os anos 1970, quando, em 1977, foi adquirida pela Caixa Econômica Federal, o edifício ficou inutilizado várias vezes.

São Paulo tem cerca de 22 mil imóveis inutilizados, que poderiam servir para moradias, mas oferecendo todas as condições de segurança e orientando os moradores para ações preventivas.

Situações semelhantes existem em outras cidades, e em Niterói há um prédio abandonado na Rua da Conceição, outro com ocupação irregular no Rink e outro, também irregular, na Av. Amaral Peixoto, esquina com Rua Barão do Amazonas, e que tem até janelas sem vidros nem base de proteção.

É necessário que se veja essa situação, de maneira urgente, porque envolve questões fundamentais, que são as moradias, e poderia ajudar muito na desfavelização.

A desfavelização, que contraria a ideologia festiva do "ufanismo das favelas", é uma prioridade, que uma engenharia urbana persistente poderia fazer.

Ela poderia aproveitar prédios ou terrenos ociosos e aproveitá-los para construir moradias dignas para uma quantidade de favelados, a serem transferidos gradualmente.

Com isso, as favelas seriam desocupadas e demolidas, substituídas por ambientes urbanos dignos e sustentáveis.

É um trabalho de intenso e longo planejamento logístico, no qual se desocupam as favelas para suas casas, desabitadas, fossem demolidas.

Dessa forma, as áreas demolidas seriam usadas para construir novos bairros, com estrutura urbana bem melhor.

É muito triste ver a situação dos desabrigados do Wilton Paes de Almeida. Não há como culpá-los.

Eles ocuparam o prédio organizados em um movimento, porque não tinham onde morar sem ter que pagar caro por isso.

E agora que perderam tudo, eles merecem maior atenção, como tantas e tantas pessoas que perderam tudo nas favelas que se incendiaram em São Paulo.

Seria preciso que as forças progressistas pensassem nisso, em vez de apelar para o "ufanismo das favelas" que só serve para transformar construções precárias em "paisagens de consumo" para o "safari humano" das elites esnobes.

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