Nos dez anos da Lei do Feminicídio, o machismo sanguinário dos feminicidas continua ocorrendo com base na crença surreal de que o feminicida é o único tipo de pessoa que, no Brasil, está "proibida de morrer". Temos dois feminicidas famosos em idade de óbito, Pimenta Neves e Lindomar Castilho (87 e 84 anos, respectivamente), e muitos vão para a cama tranquilos achando que os dois são "garotões sarados com um futuro todo pela frente".
O que as pessoas não entendem é que o feminicida já possui uma personalidade tóxica que o faz perder, pelo menos, 20 anos de vida. Mesmo um feminicida que chega aos 90 anos de idade é porque, na verdade, chegaria aos 110 anos. Estima-se que um feminicida considerado "saudável" e de boa posição social tem uma expectativa de vida correspondente a 80% de um homem inofensivo sob as mesmas condições.
O feminicida tende a viver menos porque o ato do feminicídio não é um simples desabafo. No processo que se dá antes, durante e depois do ato de tirar a vida de uma mulher - geralmente cônjuge, mas também parentes, amigas, colegas de trabalho e mulheres mais jovens - , o homem sente uma raiva cega e doentia, que produz grandes doses de adrenalina, lhe tira o sono e lhe causa mal-estar, o que já atinge seriamente o organismo, produzindo reações que, no futuro, geram doenças gravíssimas.
O feminicida contrai tensões emocionais violentas que lhe afeta o organismo. Ele leva a masculinidade tóxica até as últimas consequências, por isso é surreal a crença de que eles seriam menos vulneráveis do que o "titio do churrasco" que, aparentemente, morre mais do que o feminicida, este sempre visto pela sociedade brasileira mais conservadora como o "Super-Homem que exterminou a Lois Lane". Para um país que é um paraíso de fake news, isso é um prato cheio.
Mesmo a bipolaridade emocional do feminicida, entre o orgulho e a frieza de ter cometido o crime, num momento e, em outro, a vergonha e o medo de sofrer uma represália, prejudica o organismo, além do fato de que muitos feminicidas são fumantes, alcoólatras etc. E seu desequilíbrio emocional, que os faz matarem suas mulheres durante uma discussão, é o mesmo que pode fazê-los morrer num acidente de carro ou numa reação de um ladrão durante um assalto a esses machistas da "honra ferida".
Sim, acidentes de trânsito, latrocínios, além de câncer e infarto, são males que assombram as vidas dos feminicidas, que produzem a tragédia que lhes acompanhará para sempre, como a sombra de suas mulheres-vítimas que lhes assombram de forma irreversível.
Apesar disso, é tabu para a sociedade brasileira qualquer hipótese de um feminicida morrer. O feminicida é "proibido de morrer" por conta de sentimentos que variam entre a superstição - as lendas de "casas abandonadas" onde viveriam, supostamente, fantasmas do feminicida e da mulher que ele matou - e a misericórdia tóxica, aquela que beneficia o algoz e amaldiçoa a vítima, típica do moralismo religioso medieval, ainda presente na sociedade brasileira de hoje.
Lá fora, já existem informações de feminicidas mortos antes dos 80 anos de idade. Já teve uma notícia recente de um homem nos EUA que matou a esposa e, quando ainda estava cavando, no quintal de sua casa, para enterrar o cadáver da vítima, ele sofreu um infarto fulminante. E já teve um psicopata que matou uma jovem e que, na prisão, morreu de Covid-19 há alguns anos.
CORONAVÍRUS
Só no Brasil é que temos relatos risíveis na imprensa de um Pimenta Neves "com grandes chances de ter câncer na próstata", relato dado em 2013 quando hoje, oficialmente, o assassino da colega jornalista e ex-namorada Sandra Gomide, ainda não faleceu. Ou seja, um feminicida que espera por um câncer que, em tese, não o matou com a imediatez com que matou, por exemplo, um Frank Zappa. Sem falar que o ex-chefe de redação do Estadão contraiu diabetes que atingiu um estágio pior do que o de Syd Barrett no fim da vida.
E já que falamos de Covid-19, começam a circular na Internet suspeitas de que a Covid-19 teria matado mais de três mil feminicidas entre 2020 e 2022. De maneira constrangedora, uma doença que matou mais de 650 mil brasileiros só noticiou um feminicida vítima da doença, oficialmente: um pobre idoso de 75 anos que estava preso em uma cadeia de Alta Floresta, no Mato Grosso, morto em 2020.
Há suspeitas que apontam a maior parte das possíveis ocorrências de feminicidas mortos pela Covid-19, cujos retratos predominantes seriam estes:
1) A maioria dos feminicidas mortos pela Covid-19 teria entre 42 e 78 anos;
2) A maioria seria de classe média abastada (segundo critérios de classe média do sociólogo Jessé Souza);
3) A maioria teria cometido crimes de feminicídio entre 1982 e 2010;
4) A quase totalidade cumpria liberdade condicional, ou seja, já estavam fora da cadeia faz muito tempo;
5) A maior parte dos óbitos envolveu feminicidas que, na ocasião dos crimes, viveram nos Estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pernambuco e Bahia;
6) Uma dezena dos feminicidas já havia cometido feminicídio após a entrada em vigor da Lei do Feminicídio, a maior parte destes óbitos de forma bastante prematura, antes dos 50 anos de idade.
Mandei um e-mail para o Ministério da Saúde pedindo algum levantamento de dados a respeito, mas até agora não recebi uma resposta. Também mandei uma postagem no X para os principais veículos de imprensa, sugerindo uma pauta a respeito.
Sobre a tragédia dos feminicidas, deveria ser um consenso e não um tabu, pois o feminicídio é apenas um efeito de uma personalidade tóxica que transforma machões em completo desequilíbrio emocional em pessoas potencialmente frágeis e doentes, a ponto de estarem vulneráveis até para morrer no volante ou sob a reação contrariada de um ladrão capaz de derrubar, com um tiro, o ex-policial feminicida metido a valentão.
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