A segunda turma do Supremo Tribunal Federal absolveu o casal Gleisi Hoffmann, senadora e presidenta do Partido dos Trabalhadores, e Paulo Bernardo, ex-ministro dos governos Lula e Dilma Rousseff, da acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Os dois eram acusados, juntamente com o empresário Ernesto Kugler, de participarem de suposto esquema de corrupção que envolveu também a Petrobras.
Esse esquema seria um desvio de dinheiro para a campanha de Gleisi para senadora em 2010.
As acusações foram baseadas em delações feitas para a Operação Lava Jato, por Paulo Roberto Costa, ex-diretor da estatal, e o doleiro Alberto Yousseff, e carecem de provas consistentes.
Na votação, os ministros do STF, Luiz Edson Fachin, relator, e Celso de Mello, revisor, decidiram absolver Gleisi das acusações, mas condená-la por falsidade ideológica e caixa dois.
Os demais ministros, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, votaram pela absolvição total, por verem que as delações eram contraditórias e as supostas provas, "raquíticas", no dizer de Gilmar.
A absolvição do casal parece animadora, diante do que virá no julgamento do pedido de liberdade de Lula, na próxima semana.
Segundo a jornalista Mônica Bergamo, devido ao plenário do STF negar o habeas corpus ao ex-presidente, dificilmente o pedido de libertação será aceito pela segunda turma que o julgará.
Aparentemente, a segunda turma tem uma animosidade com a Operação Lava Jato, com exceção de Edson Fachin.
Mas, infelizmente, a perseguição a Lula está acima da Operação Lava Jato, embora orquestrada por ela.
Essa perseguição faz parte de um grande establishment político, judiciário, empresarial, midiático e até mesmo social, que quer banir Lula da corrida presidencial de qualquer maneira.
Entre essa parcela de brasileiros, existem aqueles que pedem intervenção militar.
Prefiro não ser otimista em relação à hipótese de libertação de Lula. A reabilitação política de Lula é um caminho longo que, na hipótese dele conquistar novo mandato presidencial, só terá sossego se ele puder finalizar esse mandato, em 31 de dezembro de 2022.
Nesse longo caminho, os obstáculos poderão ser enormes e não podemos ignorar o que foi feito contra Getúlio Vargas, no segundo mandato, e contra João Goulart, em 1964.
Não podemos gritar "Lula Livre" jogando o presidente num mar de tubarões.
Sabemos os esforços da defesa, aproveitando todos os recursos das leis, brasileiras e internacionais, com a ajuda do advogado britânico Geoffrey Robertson, para salvar o ex-presidente e declarado pré-candidato a novo mandato.
Infelizmente, porém, o Brasil vive um regime de exceção, no qual as regras, a ética social e os escrúpulos são postos às favas para fazer prevalecer os interesses das classes conservadoras.
O problema é que, no STF, há gente da pesada empenhada em barrar Lula de qualquer maneira: Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso.
Não se sabe o que vai acontecer. Na segunda turma, há juristas contra a sentença de prisão em segunda instância.
Só Fachin é firmemente a favor da manutenção da sentença. Aparentemente, os demais preferem ver o condenado aguardando em liberdade até o esgotamento dos recursos jurídicos previstos por lei.
A prisão de Lula, sem dúvida alguma, é mesquinha, ilegal, arbitrária e feita por motivos bastante ridículos, como a estória mal contada do "triplex do Guarujá", na qual se inventou até um elevador privativo do ex-presidente.
Mas a base de oposição a ele é uma superestrutura de forças dominantes, patrocinadas pelo Departamento de Estado dos EUA, e comprometidas com pautas antipopulares.
Entre estas pautas, está o fim dos direitos dos trabalhadores e a venda de riquezas nacionais para o exterior.
A Rede Globo anda pressionando o STF a votar contra o pedido de liberdade de Lula.
A ministra Rosa Weber assumiu a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, podendo usar a Lei da Ficha Limpa para barrar a candidatura de Lula.
Luís Roberto Barroso já declarou, segundo reportagens de O Globo e Valor Econômico (revista especializada também das Organizações Globo), que "recomenda" a segunda turma do STF a confirmar a condenação a Lula.
Segundo Barroso, a sentença condenatória foi "dada e revista" por "três juízes igualmente sérios e competentes".
Barroso ainda é citado pela reportagem como um pretenso idealista que "compreende" as posições divergentes dos ministros do STF:
""A opinião positiva (de Barroso) sobre Moro, adverte, não se estende a todos os colegas de Corte: 'No Supremo também existe uma divisão entre os que desejam empurrar a história, acreditando que estamos criando um novo país, uma nova ordem, e os que têm pactos profundos com a velha ordem. Portanto, todo processo de transformação vive resistências. E essas pessoas da velha ordem têm aliados em toda parte.'"
Barroso, que definiu Sérgio Moro como "homem sério" que "resolveu enfrentar a corrupção sistêmica do Brasil", se enquadra nesses defensores da "nova ordem", na verdade a ordem dos neoconservadores que retomaram o poder em 2016.
Por ironia, Barroso teve divulgada uma foto de infância ao lado do amiguinho Agenor, que depois se tornou o saudoso cantor e compositor Cazuza.
Muito provavelmente, Cazuza estaria defendendo Lula, Dilma Rousseff e as forças progressistas.
Imagino se Cazuza estivesse vivo, calvo mas altivo como sempre, discursando, aos 60 anos, a favor da libertação de Lula, gritando "Lula Livre" para a plateia.
A situação do Brasil hoje está delicada, mesmo com o Supremo tendo aprovado dois atenuantes.
Além do atenuante da absolvição de Gleisi Hoffmann, tivemos, no último dia 14, a decisão do STF de proibir a condução coercitiva de investigados para depoimentos.
Notem o perfil de quem votou a favor, seis ministros, e contra, cinco.
Quem votou a favor: Gilmar Mendes, Rosa Weber, Dias Toffoli, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
São os ministros considerados "menos austeros" na defesa da plutocracia política.
Já quem votou contra a proibição e, portanto, a favor da condução coercitiva, são os mais inflexíveis:
Luiz Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Carmen Lúcia.
Foi um placar apertado, no qual um voto fez a diferença. Se Rosa Weber, que eventualmene segue a orientação da Globo, fosse votar a favor da condução coercitiva, ela teria sido mantida.
Mas o xadrez político tem seus moderados, o que não garante que Lula possa ser libertado.
As forças progressistas perderam o protagonismo político, e não podem se precipitar buscando alianças "alienígenas" para obter visibilidade e prestígio.
Não serão os estúdios da Rádio Metrópole, em Salvador, ou das equipes de som de "funk" que abrirão a cela para Lula sair da prisão para o Palácio do Planalto.
Nos esquecemos que Mário Kertèsz é filhote da ditadura e apoiou Fernando Henrique Cardoso em 2000 (daí que ganhou dele, de presente, a "flexibilização" do horário do programa A Voz do Brasil).
Além disso, também nos esquecemos que, antes de ser empurrado para a agenda esquerdista, o "funk" era a "menina dos olhos" das Organizações Globo, que nunca escondeu suas parcerias entusiasmadas e felizes com os funqueiros.
As ovelhas não iriam usar as raposas para salvá-las dos lobos. E as galinhas não iriam usar as hienas para salvá-las das raposas.
O momento é de muita cautela. A vitória da defesa de Gleisi Hoffmann e Paulo Bernardo foi apenas uma vitória relativa, dentro de um intrincado jogo político.
Ela não significa a luz no fim do túnel do golpe político. Até porque a luz foi apenas uma fogueira acesa dentro dessa túnel.
O golpe veio para ficar e as forças progressistas devem agir com mais prudência, abrindo mão um pouco do protagonismo político-institucional e priorizando o protagonismo histórico das mobilizações e protestos.
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