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O DRAMA DA "GERAÇÃO W"


Vendo os casos de Harvey Weinstein e Rosanne Barr, um acusado de abuso sexual, outra acusada de comentários racistas, fico pensando o que é realmente a "maturidade".

"Maturidade", para mim, é um passarinho que, quanto mais a gente quer pegar, mais ele foge.

Ou então fazer um rally em estrada escorregadia diante de um nevoeiro que dificulta a visão.

Ou então atravessar um abismo passando por um cordão de nylon ligando dois despenhadeiros.

Não me arrisco a supor que alcançarei a maturidade.

Na sociedade complexa em que se vive, maturidade é um luxo. Os que mais divagam sobre maturidade são os que mais se tornam vulneráveis a incidentes bastante incômodos, para não dizer chocantes.

Parece indelicado eu falar que, nos últimos anos, a meia-idade e a terceira idade são as fases mais complicadas da vida humana.

E muitos acham que sou indelicado, também, por achar que a fase dos cabelos brancos, ultimamente, quase nunca se relaciona com o amadurecimento. O corpo envelhece, mas a mente não acompanha.

Fico observando o caráter impulsivo que Weinstein teve até pouco tempo atrás. E que outros figurões de Hollywood, mesmo executivos e cineastas com seus 50 ou 60 e tantos anos, também assediando mocinhas e até rapazes.

Ou Roseanne Barr, estrela do seriado Roseanne, que ensaiou uma volta mas está definitivamente cancelado. Planeja-se um spin-off sem a participação da atriz protagonista.

É claro que existem exceções, mas a maioria das pessoas nascidas entre 1950 e 1974 - inclui o ano em que eu nasci, 1971 - se enquadra no que eu denomino de "Geração W".

O "W" tem a ver com expressões interrogativas em inglês, quase todas começando com a letra, como "why" (por quê), "who" (quem), "what" (o quê), e uma terminando com ela, "how" (como).

Em parte, a Geração W, no que se refere aos nascidos entre 1960 e 1974, é a Geração X mais atrapalhada.

A Geração W é aquela que não soube envelhecer e, num ritmo frenético do cotidiano, cheio de pressões e ambições de todos os lados, mantém neuroses juvenis e adolescentes até depois dos 50 anos.

Como eu observei, por exemplo, na geração de médicos, empresários e economistas que, nascidos na primeira metade dos anos 1950, se casaram com atrizes, modelos ou jornalistas bem mais novas do que eles.

Chegando aos 50 anos, por volta de 2004-2005, eles cismaram em ter uma bagagem de 70 anos.

Talvez seja vergonha em se casar com mulheres mais novas. Queriam se vincular com personalidades mais velhas.

Do Millôr Fernandes ao amigo de Pablo Picasso, fora Frank Sinatra, Benny Carter e Graciliano Ramos, os cinquentões do período 2004-2005 brincavam de "viver os anos 1930-1940".

Isso quando não tratavam Winston Churchill e Glenn Miller como se fossem seus tios.

A geração um pouco posterior, de empresários e profissionais liberais nascidos na segunda metade dos anos 1960, o pedantismo geracional era outro.

Se o pessoal born in the 50s brincava de ser adulto com referenciais de 1930-1950, o pessoal nascido uns 15 anos depois brincava de ser adulto com referenciais dos anos 1960-1970.

Falam de Elton John, por exemplo, como se tivessem acompanhado o nascer de sua carreira. Falam de Woodstock (o original de 1969) como se alguém lhes tivesse convidado para ir e eles recusaram.

Imagine convidar um bebê ou mesmo um feto na barriga da mãe para fazer parte da plateia de um festival de 1969?

A neurose "eu quero ser grande" que contamina as elites brasileiras coloca quarentões e cinquentões num contexto em que, diante da terceira idade, eles são crianças e adolescentes.

Há o menino que, com seus brinquedinhos, quer xeretar as conversas do pai com seus amigos.

Há o cinquentão que, com seu prestígio profissional, quer se interferir nas conversas de gente de setenta, oitenta anos.

Fico comparando os "coroas" brasileiros com os estrangeiros e chego à conclusão de que não dá para imitarmos os idosos de ontem. Aquela mania infantil da criança imitar o pai persegue a pessoa que, aos 50, 60 anos, transfere essa mesma mania para o contexto da terceira idade.

Há exceções de sessentões exemplares, aqui e ali. Mas exceção é exceção, não paga os prejuízos causados pela má regra, apenas se livra dos efeitos danosos que esta provoca.

No exterior (sobretudo EUA e Reino Unido), pelo menos, sessentões estão associados a movimentos de juventude como o punk rock e o pós-punk.

Fanzines, filmes alternativos, teatro performático, bandas de garagem podem não terem sido inventados pela geração nascida nos anos 1950, mas foi ela que consolidou tudo isso.

E há os ingleses e estadunidenses que, com seus 65 anos em média, podem entender de jazz, porque lá o ritmo permanece em evidência relativa, como o samba aqui no Brasil.

Aqui é que soa meio pedante, salvo exceções, alguém de seus 65 anos falar em jazz. Para cada um Reinaldo Figueiredo (o casseta não é meu parente), há uns tantos médicos e empresários que só ouvem o "jazz para namorar" ou os standards da fase áurea de Hollywood.

Esses médicos e empresários (ou advogados, economistas etc) fingem que entendem o jazz mais experimental (Charles Mingus, John Coltrane etc), fazem pose, mas não entendem uma linha melódica daquilo que ouvem.

É uma forma de fugir, de medo e de preconceito, da Legião Urbana que suas jovens esposas escutam no dia a dia.

E aí chego aos pais e filhos, só para me lembrar da famosa canção do grupo brasiliense.

Geralmente, os pais de 1950-1955 têm filhos nascidos, em média, entre 1978 e 1983.

E aí ocorre um dado estranho: as duas gerações "fogem" dos anos 1980, cada um à sua maneira.

Os mais velhos, por pensar que os anos 1980 são "década de surfista" e os mais novos, porque é uma década "cabeça demais" para seu hedonismo pragmático.

No contexto em que vivemos, com a amplitude da informação se avançando, é claro que um sujeito nascido em 1954 tem mais dificuldades de entender os anos 1940 do que seu filho nascido em 1979 em relação a coisas menos óbvias dos anos 1970 e 1980.

Mas as atribuições se invertem e o "coroão" posa de "testemunha ocular" do mundo dos anos 1930 e 1940. Imagino o aborrecimento que os octogenários sentem quando um cinquentão ou sessentão falam, com muito pedantismo, sobre o que os mais idosos viveram.

E o nascido entre 1978 e 1983 é que, com a Internet lhe oferecendo de bandeja uma gama maior de informações, é que acaba sonegando essa oportunidade.

No Brasil, costuma-se optar mais por complicações do que facilitações.

E há a falta de diálogo entre os nascidos da Geração W (nascidos entre 1950 e 1974) e os da Geração Y (de 1978 até 1995, os pré-mileniais), que influi nesse distanciamento ideológico.

Os mais velhos, correndo atrás de um passado que eles nunca viveram. Os mais novos, recusando a ir além do playground temporal dos anos 1990 e 2000.

Os primeiros, querendo aproveitar demais a oportunidade que quase nunca lhes é oferecida. Os segundos, desperdiçando um potencial de aprimoramento e ampliação de conhecimentos.

E assim chegamos a esse contexto confuso em que boa parte dos mais velhos são gente impulsiva como Harvey Weinstein e Roseanne Barr, médicos e empresários brasileiros de 65 anos que pensam ter 20 a mais e os políticos sessentões e setentões da retomada conservadora do Brasil e do mundo.

A Geração W, sinceramente, só não tem um W, o de "wisdom" ("sabedoria"). Precisam se rejuvenescer primeiro para buscar o caminho próximo ao, digamos, "maturidade" ou coisa parecida.

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