Infelizmente, prevalece no rádio o casamento forçado entre rock e futebol.
Caricatura do que ocorre na Inglaterra, isso motiva com que as chamadas "rádios rock" tivessem seus programas misturando debate esportivo, besteirol e futebol.
Poucas canções de rock são tocadas, e elas escapam do contexto. Nota-se que há muita força de barra nesses programas que só são "unanimidade" entre alguns sociopatas que se acham "donos da verdade" nos "tribunais" e "cartórios" das redes sociais.
Isso cria um efeito gozado: força o radialista a memorizar tanto as formações de músicos de várias bandas como a composição de times de futebol da temporada ou de outros tempos.
Faz o radialista que, normalmente, sabe da diferença entre Ronaldinho Fenômeno e Ronaldinho Gaúcho, ter que estar ciente de que o guitarrista Rory Gallagher nada tem a ver com os irmãos Gallagher do Oasis.
Além de tanta força de barra, os programas de "rock e futebol" que rolam nessas emissoras são o primor da chatice.
Primeiro, porque debates sobre futebol são quase sempre chatos. Há muito pedantismo e se divaga demais sobre atuação de times e até sobre bastidores de times de futebol.
Em Salvador, por exemplo, os programas que se recusavam a ir para o AM para "invadir o campo" das FMs, atrapalhando a segmentação musical, eram simplesmente insuportáveis.
Falavam de Bahia e Vitória e ainda divagavam sobre o dirigente político tal ou qual, e ainda de forma bastante tendenciosa.
Denúncias de jabaculê atingiram essas FMs, contrariando a visão corrente de que o esquema de propinas que atinge a Frequência Modulada era só musical. Nunca foi só musical e, no futebol, as propinas eram bem mais escandalosas.
Elas quase custaram a vida do "bom esquerdista" Mário Kertèsz - filhote da ditadura militar que tenta vender ao Brasil a falsa imagem de "apoiador de Lula" - , porque ele sofreu um infarto ao saber que foi denunciado por corrupção envolvendo dirigentes baianos de futebol.
Só os fanáticos por futebol aguentam ouvir essas coisas entediantes e pachorrentas. Os mais velhos aceitam essas chatices da forma "crua", pretensamente "jornalística" e pedante, embora hoje esse blablablá seja temperado por fundos musicais.
Já os mais jovens preferem o combo futebol com besteirol, a partir do trio "coxinha" Transamérica, Jovem Pan e 89 FM.
A fórmula é a mesma: adaptar o formato "Pânico da Pan" ao formato mesa redonda.
Sob o contexto "roqueiro", procura-se evitar a associação, embora mais do que óbvia, ao humorístico criado e patenteado pelo dono da JP, Antônio Augusto Amaral de Carvalho Filho, o Tutinha.
Desde os "Sobrinhos do Athaíde" ao "Quem Não Faz, Toma" (que na Rede TV! se chama Encrenca!), da 89 FM, passando pelo "Rock Bola" da Rádio Cidade, escondeu-se por baixo do tapete a mais do que explícita influência da Jovem Pan no radialismo supostamente roqueiro.
Eu não gostaria de criticar a Kiss FM, que estava se esforçando para se aproximar, mesmo de maneira limitada, da essência do radialismo rock dos anos 1980, mas ela anda adotando, recentemente, procedimentos mais próximos aos das "Jovem Pan com guitarras" dos anos 1990.
Como criar vários programas misturando besteirol e comportamento, como se observa no "Torpedo da Pan" e "Morning Show" da JP e, no âmbito "roqueiro", no "Esquenta" da 89 e nos programas "Hora dos Perdidos" e "DR" da Rádio Cidade.
Esses programas são de uma chatice ímpar.
As piadas são feitas para os próprios piadistas e sua "manada" das redes sociais rirem e se "consagraram" na TV com a versão televisiva do Pânico e de influenciou nomes como Danilo Gentili e as gerações menos expressivas (e mais populares) de youtubers.
Mas o maior problema está nos seus seguidores das redes sociais.
Não há como convencer eles, por exemplo, de programas de futebol e besteirol não combinam com rock'n'roll e que 99,99% dos jogadores de futebol torcem o nariz para o gênero.
Os ouvintes desses programas que misturam, à força, rock e futebol, é que são donos da "verdade absoluta" e só eles acham que futebol é "esporte rock'n'roll".
Em quantidade, esses midiotas não lotam sequer uma arquibancada de futebol de várzea, mas eles falam como se pensassem ser a maioria esmagadora de toda a população planetária.
E aí, voltando à Kiss FM, o programa lançado é justamente aquele que derrubou a Brasil 2000 FM, o Na Geral.
Um dos apresentadores desse embuste radiofônico é Lélio Teixeira, que aliás foi o algoz da antiga 97 Rock, histórica rádio de rock paulista dos anos 1980.
Como numa dessas manobras do tipo "morde e assopra", Lélio botou no lugar da 97 Rock a popíssima Energia 97, no ar até hoje, e montou programa de futebol e besteirol na emissora.
Mas, deixado o legado, Lélio foi fazer gerência artística (como se chama o cargo de coordenador de programação de uma rádio) na outrora college radio Brasil 2000, que desde 2000 iniciou seu calvário, contratando Tatola e tudo.
Cheguei a ouvir, via Internet, a programação da Brasil 2000. Fiquei indignado quando um locutor de voz bem mauriçola foi falar em cima da introdução de uma música da banda Hole, da viúva de Kurt Cobain, Courtney Love.
Não bastasse a locução "estilo Jovem Pan" contaminar o radialismo rock - há uma mania das "rádios rock" mirarem sempre o público adolescente feminino, que geralmente não curte rock - , ainda havia falação sobre as introduções e finais das músicas, atrapalhando a audição.
Resultado: a Brasil 2000 acabou, depois de uma morte relativamente lenta, e deu lugar à sisuda Estadão FM, que deve procurar estabelecimentos comerciais para anabolizar audiência.
Ninguém aguenta blablablá em FM, e essas emissoras, sobretudo usando o formato full time do "Aemão" (all news ou variedades), precisam camuflar a baixa audiência comprando sintonia em lojas e outros lugares (até taxis ou portarias de prédios, por exemplo).
É um meio de "roubar" o número de fregueses atendidos por esses estabelecimentos e creditá-los, falsamente, como se fosse o número de ouvintes da emissora sintonizada, que, na prática, é ouvida por ninguém, pois nem o gerente ouve emissoras do tipo.
Mas hoje o rádio FM chega a ter emissoras com apenas 50 ouvintes em regiões metropolitanas inteiras, e isso é um grande tabu nas páginas especializadas de rádio.
É só você apontar essa realidade, confirmada no cotidiano, nesses espaços, e você será linchado, chamado de "Zé Ruela" para baixo.
Paciência. Para certos radiófilos lambedores de gravatas - também vi busólogos lambedores de gravatas - , o que vale é a ficção dos "dados oficiais" montados em escritórios ou estúdios de rádio e TV.
Como discutir a realidade nas redes sociais, sobretudo quando gerações com menos de 45 anos de idade (alguns até chegam e ultrapassam essa idade, mas a maioria não) vivem num contexto hipermidiático, hipermercadológico e hipertecnológico?
Como explicar, por exemplo, a qualidade do ar atmosférico para aqueles que pensam que "ar puro" é o ar condicionado de escritórios, consultórios, lojas, estúdios e até automóveis e ônibus?
Na Inglaterra, pelo menos, apesar do entusiasmado apreço de roqueiros ao futebol local, eles nunca o veem como "esporte rock'n'roll".
Junta-se o futebol com o rock assim como o queijo com a goiabada. Mas lá existe um contexto social para isso.
Aqui, todavia, unir futebol e rock é como jogar um litro de mel na panela da feijoada.
Fica ruim. Mas o que é o pior para aqueles que, nas redes sociais, sempre defendem o "quanto pior, melhor".
As redes sociais são assim porque criou-se uma indigesta mistura de politicamente correto com cultura trash e produziu-se falsas preciosidades cult através do lixo veiculado pelo mainstream.
Enquanto isso, é risível que os fãs do intragável combo "futebol, besteirol e rock" finjam odiar o Galvão Bueno, considerado o apresentador de futebol mais chato do país.
É praxe dos midiotas falar mal de pessoas e símbolos que eles adoram, desde o Luciano Huck até o imperialismo dos EUA.
Eles falam mal para evitar alguma associação. Precisam xingar o cruzeiro marítimo em que embarcam, para que não sejam vitimados pelo primeiro aicebergue que atingirá seu Titanic digital.
Diante disso tudo, dou cartão vermelho para essa péssima mistura de rock e futebol feita no Brasil e prefiro ficar longe da falsa realidade das redes sociais.
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