PRESIDENTE LULA ESTÁ MAIS PRÓXIMO DAS ELITES DO QUE DO POVO, POUCO SE EMPENHANDO EM ROMPER COM O LEGADO GOLPISTA DE 2016.
O presidente Lula tenta perseguir o seu mito de antigo líder popular, depois de todo o peleguismo ao se associar, com gosto, à burguesia “democrática”, levando ao paroxismo a ilusão que as esquerdas de 1964 tinham com a burguesia nacional, crença que foi crucial para o êxito do golpe de 1964.
Lula se tornou paródia do que ele foi no passado, mais do que o saudoso humorista Bussunda poderia encenar. Ele não convence com sua bravura tardia no ocaso do terceiro mandato, depois de desperdiçá-lo com muita festa. Nem mesmo a gravidade do legado do golpe de 2016 tramado por Michel Temer Lula se encorajou em romper. Agora ele tenta correr contra o tempo na busca frenética pela popularidade que se perdeu para sempre.
Afinal, o povo pobre da vida real, não o “pobre de novela” limpinho e ingênuo da narrativa midiática corroborada pelo lulismo, se sentiu traído e abandonado por Lula. Isso as narrativas oficiais evitam mostrar, mas é o que os fatos demonstram na sua mais dura contundência.
Lula não é um fetiche do qual se permita crer que, mesmo quando erra, ele sempre acerta, como se o petista fosse um mágico que transforma atitudes errôneas em atos acertados. Nada disso. Lula, quando erra, é tão criticável quanto qualquer um.
Eu mesmo, quando eu ainda admirava Lula, há dez anos, admitia que ele era criticável e que poderia ser criticado pelos erros que, de fato, cometesse. Naqueles tempos, os golpistas de 2015-2016 inventavam erros de Lula que mais pareciam caricaturas de tão exagerados, como no rótulo fácil do “Luladrão”.
Lula erra mais hoje como um mau gestor, desaprendendo com o que fez nos dois mandatos anteriores. Nestes, pelo menos houve o trabalho de criar os programas de grife, como o Minha Casa, Minha Vida, diferente de hoje, quando o Lula 3.0 pegou pronto o legado de 2003-2010 que lhe fez dispensar um programa de governo, um erro fatal, pois os desafios de hoje são muito diferentes dos de duas décadas atrás.
Daí que o povo pobre da vida real, longe do estereótipo apressado do “pobre de direita” - este um fenômeno alimentado pelas seitas neopentecostais - , se sente decepcionado e revoltado com Lula. E será difícil recuperar a confiança da antiga base raiz de Lula, que tem que se contentar com o apoio da burguesia ilustrada que hoje lhe exalta.
É um pessoal de vida confortável, com mais de dez mil reais de salário, com mais de meio milhão de reais depositados nos bancos, que finge ser pobre falando português errado e ouvindo músicas ruins, como os sucessos popularescos de hoje e sempre. É a elite do bom atraso, a “gente bem” do vocabulário hi-so do passado, a burguesia repaginada de chinelos, jeans rasgados e camisetas de algodão.
Esse pessoal é que está blindando Lula com o desespero nervoso de quem tenta fabricar um consenso e um esplendor onde tudo isso deixou de existir. A euforia com mais um relatorismo sobre a “queda do desemprego” - feita às custas de muitas ofertas de trabalho precário - fez com que Lula fosse glorificado pela ruidosa torcida que acha que o presidente será reeleito pelo grito.
O que traz a constatação de que Lula substituiu o antigo apoio das classes populares pela burguesia ilustrada são comentários dotados de profunda insensibilidade social. Recentemente, um lulista escreveu que “é melhor ter um trabalho precarizado do que ficar sem emprego”, uma frase de resignação profissional que nenhum operário de chão de fábrica diria.
Em outra ocasião, um lulista sugeriu a um internauta que reclamou do valor do salário mínimo para “pedir para o patrão aumentar o salário”. Puro atestado de desconhecimento da realidade trabalhista, isso vindo de um apoiador de Lula. Um patrão não iria aumentar um salário assim com um simples pedido.
O próprio Lula passou a, mesmo sem querer, ofender o povo pobre quando, em três discursos, disse que as classes populares querem que seus apartamentos tenham varanda para “peidar”. Esquece Lula que o pobre quer varanda para relaxar depois de uma dura jornada de trabalho, ver a paisagem e conversar com amigos e familiares.
Lula se aliou à burguesia “democrática” com o objetivo de obter vantagens políticas, incluindo a facilidade da vitória eleitoral e a garantia da governabilidade. As esquerdas médias também se aliaram à direita moderada visando obter apoio e visibilidade. Por influência dessa aliança, há os “brinquedos culturais” que são os valores dessa direita apreciados por esquerdistas mais “flexíveis” e concessivos.
É doloroso, para muitos, dizer certas verdades que derrubaram as zonas de conforto das crenças há muito estabelecidas. Lula tornou-se um pelego, traiu as classes populares e estas são as últimas a tentarem apostar numa derradeira esperança de apoio ao presidente.
Lula tem que se esforçar muito para reverter a baixa popularidade, o que será difícil. A tendência é ele ter que obter o apoio da burguesia e buscar os bolsonaristas arrependidos para, ao menos, garantir um placar apertadíssimo que possa fazer o petista ter um novo ingresso ao Palácio do Planalto. O consolo é que a nossa burguesia gosta de fingir que é “mais povo que o povo”. Assim o jogo das aparências está garantido.
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