Pular para o conteúdo principal

"FUNK" QUER OFUSCAR O DEBATE DOS MOVIMENTOS SOCIAIS

O "FUNK" DEU UMA GRANDE PEGADINHA AO PEGAR CARONA NO PROTESTO ANTI-IMPEACHMENT DE 17 DE ABRIL DE 2016.

No texto passado, comparamos o "funk" ao Cabo Anselmo, líder da Revolta dos Sargentos que ocorreu em 1963-1964.

Vale detalhar aqui como os dois episódios serviram para desviar o foco dos debates públicos dos movimentos sociais.

São ambos eventos de pura espetacularização e de criação de polêmicas que desnorteiam as discussões.

Naquele biênio de 1963-1964, João Goulart propunha a reforma agrária, a reforma universitária, o limite da remessa de lucros ao exterior e outras medidas em prol das classes populares.

Eram tempos em que as reformas iam em favor do povo e não contra ele.

Aí veio a tal revolta liderada por Cabo Anselmo que superestimou e tratou, de maneira espetacularizada, direitos específicos de militares de baixa patente.

Isso desviou o foco.

De repente, a intenção passou a ser, primeiro, discutir se sargentos poderiam ser candidatos a cargos políticos antes de debater o limite das remessas de lucros das empresas para o exterior.

Sabe-se que, sem esse limite, haveria continuidade na evasão de divisas, ou seja, na "fuga" de dinheiro brasileiro para o exterior, problema que continua até hoje e prejudica a economia nacional.

O desvio de foco custou sensacionalismo, insubordinação militar e a reação da direita com o golpe civil-militar que resultou numa ditadura de 21 anos.

Hoje o contexto muda um pouco.

Quem governa a República é um peemedebista retrógrado, Michel Temer, um híbrido político entre José Sarney, Castelo Branco e Ernesto Geisel.

O fato comparável à esperança janguista está nos esforços diversos do ex-presidente Lula para voltar a governar o país.

O que chama a atenção é que, quando a crise do governo Temer se torna aguda e há uma chance de Lula ser eleito presidente em 2018, soa o alarme e o "funk" vai de carona nas esquerdas.

Tudo parece ser feito de propósito. Não há como não lembrar de Cabo Anselmo.

Discute-se a questão do desmonte do Estado e dos direitos sociais e trabalhistas e, de repente, supostos ativistas sociais superestimam mais uma questão comportamental.

Evidentemente, sou contra a chibata aos militares de baixa patente, como sou contra a criminalização do "funk".

Mas vejo muitas estranhezas nesse pretenso ativismo do "funk".

Tão associado oficialmente as esquerdas, esse discurso, no entanto, foi originalmente veiculado pela Folha de São Paulo e pelas Organizações Globo.

Entre 2003 e 2005, a corporação dos Marinho empurrava "funk" em tudo quanto era veículo ou atração das Organizações Globo.

As esquerdas parecem que se esqueceram disso e dos conselhos de Leonel Brizola, aliás uma pessoa muito diretamente ligada a Jango, por razões óbvias.

Brizola dizia que bastava observar o que a Globo transmitia para interpretar a coisa pelo lado oposto.

O "funk" vendia a sua imagem de "movimento social" graças à "ajudinha" da Globo, que inventou até personagens do Casseta & Planeta como "escada" para promover funqueiros.

O "funk" nada tem dessa imagem supostamente progressista que se vende até mesmo por meio do discurso acadêmico.

Sua proposta é retroceder o povo pobre aos padrões anteriores a 1904.

Daí o ufanismo das favelas, o "orgulho de ser pobre", o mito de que "como é legal ser pobre".

E o discurso hipócrita de que "é só investir mais grana no funk que o funk melhora".

Esse papo já tem uns quinze anos, já se investiu zilhões de verbas no "funk", e o "funk" não melhorou em coisa alguma.

Seu discurso é confuso, as teses intelectuais que defendem o "funk" são "muito cabeça" e as intenções são muito tendenciosas.

E aí vem mais um desvio de foco dos debates públicos nos movimentos sociais.

As discussões da reforma trabalhista ficam em segundo plano, por causa de discussões tão distorcidas envolvendo problemas como machismo, feminismo, pobreza e até pedofilia.

É engano dizer que o "funk" expressa a realidade, embora essa falácia seja vista como um quase consenso na sociedade brasileira.

O que ocorre é a abordagem espetacularizada da pobreza, num contexto de hipermidiatização e hipermercantilização da cultura brasileira.

Como as pessoas vivem na bolha de plástico do poder midiático, ninguém percebe o que é poder midiático ou mercadológico, só se atentando quando as mensagens são ataques explícitos aos movimentos sociais.

É como numa cidade poluída, em que a pessoa pensa estar respirando um ar puro.

Além disso, o discurso "libertário" associado ao "funk" é muito falso.

Nos bastidores, os funqueiros vivem a precarização do trabalho que hoje é a bandeira do governo Temer.

A diferença é que eles podem faturar muito, mas eles deixam de ter encargos sociais (só mantém auxílio-saúde e licença-maternidade), fatiam as férias, são subservientes ao mercado e pode haver até mesmo pejotização no "funk".

Vemos até que o "funk" se intromete nas esquerdas para que nenhum jornalismo investigativo possa verificar os "podres" dos bastidores do mercado funqueiro.

O grande risco é que a intromissão do "funk" nos movimentos de esquerda podem botar estes a perder.

A "histórica" participação da Furacão 2000 no protesto contra a abertura do processo de impeachment que iniciou o fim gradual do governo Dilma Rousseff mais fez contra ela do que a favor.

A "alegria da dança" atenuou para níveis inócuos a manifestação, por mais que se falasse na tendenciosa aliança entre Furacão 2000 e Frente Brasil Popular.

Mas o pessoal também se esqueceu que a Furacão 2000 nomeou ninguém menos que Luciano Huck, amigo de Aécio Neves, como "embaixador do funk".

Já é estranho o "funk", um ritmo calcado no miami bass, ritmo lançado na Flórida, reduto de cubanos de direita, se vender como um pretenso movimento de esquerda.

As pessoas cairiam da cadeira se souberem quem é que realmente ajudou no crescimento do "funk".

Fernando Collor, Roberto Marinho e seus três filhos, Otávio Frias Filho, Fernando Henrique Cardoso, e até George Soros.

Periga dessa atenção toda ao "funk" abra caminho para a plutocracia dominar o país de vez.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

SIMBOLOGIA IRÔNICA

  ACIMA, A REVOLTA DE OITO DE JANEIRO EM 2023, E, ABAIXO, O MOVIMENTO DIRETAS JÁ EM 1984. Nos últimos tempos, o Brasil vive um período surreal. Uma democracia nas mãos de um único homem, o futuro de nosso país nas mãos de um idoso de 80 anos. Uma reconstrução em que se festeja antes de trabalhar. Muita gente dormindo tranquila com isso tudo e os negacionistas factuais pedindo boicote ao pensamento crítico. Duas simbologias irônicas vêm à tona para ilustraresse país surrealista onde a pobreza deixou de ser vista como um problema para ser vista como identidade sociocultural. Uma dessas simbologias está no governo Lula, que representa o ideal do “milagre brasileiro” de 1969-1974, mas em um contexto formalmente democrático, no sentido de ninguém ser punido por discordar do governo, em que pese a pressão dos negacionistas factuais nas redes sociais. Outra é a simbologia do vandalismo do Oito de Janeiro, em 2023, em que a presença de uma multidão nos edifícios da Praça dos Três Poderes, ...

"ANIMAIS CONSUMISTAS"AJUDAM A ENCARECER PRODUTOS

O consumismo voraz dos "bem de vida" mostra o quanto o impulso de comprar, sem ver o preço, ajuda a tornar os produtos ainda mais caros. Mesmo no Brasil de Lula, que promete melhorias no poder aquisitivo da população, a carestia é um perigo constante e ameaçador. A "boa" sociedade dos que se acham "melhores do que todo mundo", que sonha com um protagonismo mundial quase totalitário, entrou no auge no período do declínio da pandemia e do bolsonarismo, agora como uma elite pretensamente esclarecida pronta a realizar seu desejo de "substituir" o povo brasileiro traçado desde o golpe de 1964. Vemos também que a “boa” sociedade brasileira tem um apetite voraz pelo consumo. São animais consumistas porque sua primeira razão é ter dinheiro e consumir, atendendo ao que seus instintos e impulsos, que estão no lugar de emoções e razões, ordenam.  Para eles, ter vale mais do que ser. Eles só “são” quando têm. Preferem acumular dinheiro sem motivo e fazer de ...

A SOCIEDADE HIPERMERCANTIL E HIPERMIDIÁTICA

CONSUMISMO, DIVERSÃO E HEDONISMO OBSESSIVOS SÃO AS NORMAS NO BRASIL ATUAL. As pessoas mais jovens, em especial a geração Z mas incluindo também a gente mais velha nascida a partir de 1978, não percebe que vive numa sociedade hipermercantilizada e hipermidiatizada. Pensa que o atual cenário sociocultural é tão fluente como as leis da natureza e sua rotina supostamente livre esconde uma realidade nada livre que muitos ignoram ou renegam. Difícil explicar para gente desinformada, sobretudo na flor da juventude, que vivemos numa sociedade marcada pelas imposições do mercado e da mídia. Tudo para essa geração parece novo e espontâneo, como se uma gíria fabricada como “balada” e a supervalorização de um ídolo mediano como Michael Jackson fossem fenômenos surgidos como um sopro da Mãe Natureza. Não são. Os comportamentos “espontâneos” e as gírias “naturais” são condicionados por um processo de estímulos psicológicos planejados pela mídia sob encomenda do mercado, visando criar uma legião de c...

COVID-19 TERIA MATADO 3 MIL FEMINICIDAS NO BRASIL

Nos dez anos da Lei do Feminicídio, o machismo sanguinário dos feminicidas continua ocorrendo com base na crença surreal de que o feminicida é o único tipo de pessoa que, no Brasil, está "proibida de morrer". Temos dois feminicidas famosos em idade de óbito, Pimenta Neves e Lindomar Castilho (87 e 84 anos, respectivamente), e muitos vão para a cama tranquilos achando que os dois são "garotões sarados com um futuro todo pela frente". O que as pessoas não entendem é que o feminicida já possui uma personalidade tóxica que o faz perder, pelo menos, 20 anos de vida. Mesmo um feminicida que chega aos 90 anos de idade é porque, na verdade, chegaria aos 110 anos. Estima-se que um feminicida considerado "saudável" e de boa posição social tem uma expectativa de vida correspondente a 80% de um homem inofensivo sob as mesmas condições. O feminicida tende a viver menos porque o ato do feminicídio não é um simples desabafo. No processo que se dá antes, durante e depois ...

ESTÁ BARATO PARA QUEM, CARA PÁLIDA?

A BURGUESIA DE CHINELOS ACHA BARATO ALUGUEL DE CASA POR R$ 2 MIL. Vivemos a supremacia de uma elite enrustida que, no Brasil, monopoliza as formas de ver e interpretar a realidade. A ilusão de que, tendo muito dinheiro e milhares de seguidores nas redes sociais dos quais umas centenas concordam com quase tudo, além de uma habilidade de criar uma narrativa organizada que faz qualquer besteira surreal soar uma pretensa verdade, faz da burguesia brasileira uma classe que impõe suas visões de mundo por se achar a "mais legal do planeta". Com isso, grandes distorções na interpretação da realidade acabam prevalecendo, mais pelo efeito manada do que por qualquer sentido lógico. "Lógica " é apenas uma aparência, ou melhor, um simulacro permitido pela organização das narrativas que, por sorte, fabricam sentido e ganham um aspecto de falsa coerência realista. Por isso, até quando se fala em salários e preços, a burguesia ilustrada brasileira, que se fantasia de "gente si...

ED MOTTA ERROU AO CRITICAR MARIA BETHÂNIA

  Ser um iconoclasta requer escolher os alvos certos das críticas severas. Requer escolher quem deveria ser desmascarado como mito, quem merece ser retirado do seu pedestal em primeiro lugar. Na empolgação, porém, um iconoclasta acaba atacando os alvos errados, mesmo quando estes estão associados a certos equivocos. Acaba criando polêmicas à toa e cometendo injustiças por conta da crítica impulsiva. Na religião, por exemplo, é notório que a chamada opinião (que se torna) pública pegue pesado demais nos pastores e bispos neopentecostais, sem se atentar de figuras mais traiçoeiras que são os chamados “médiuns”, que mexem em coisa mais grave, que é a produção de mensagens fake atribuídas a personalidades mortas, em deplorável demonstração de falsidade ideológica a serviço do obscurantismo religioso de dimensões medievais. Infelizmente tais figuras, mesmo com evidente charlatanismo, são blindadas e poupadas de críticas e repúdios até contra os piores erros. É certo que a MPB autêntica ...

COMO A BURGUESIA DE CHINELOS DISSIMULA SUA CONDIÇÃO SOCIAL?

A BURGUESIA ENRUSTIDA BRASILEIRA SE ACHA "POBRE" PORQUE, ENTRE OUTRAS COISAS, PAGA IPVA E COMPRA MUITO COMBUSTÍVEL PARA SEUS CARRÕES SUV. A velha Casa Grande ainda está aqui. Os golpistas de 1964 ainda estão aqui. Mas agora essa burguesia bronzeada se fantasia de “gente simples” e se espalha entre o povo, enquanto faz seus interesses e valores prevalecerem nas redes sociais. Essa burguesia impõe seus valores ou projetos como se fossem causas universais ou de interesse público. A gíria farialimer “balada”, o culto aos reality shows , o yuppismo pop-rock da 89 FM, Rádio Cidade e congêneres, a exaltação da música brega-popularesca (como a axé-music, o trap e o piseiro), a pseudo-sofisticação dos popularescos mais antigos (tipo Michael Sullivan e Chitãozinho & Xororó) e a sensação que a vida humana é um grande parque de diversões. Tudo isso são valores que a burguesia concede aos brasileiros sob a ilusão de que, através deles, o Brasil celebrará a liberdade humana, a paz soc...

A EXPLOSÃO DO SENSO CRÍTICO QUE ENVERGONHA A "BOA" SOCIEDADE

Depois de termos, em 2023, o "eterno" verão da conformidade com tudo, em que o pensamento crítico era discriminado e a regra era todos ficarem de acordo com um cenário de liberdade consumista e hedonista, cuja única coisa proibida era a contestação, o jogo virou de vez. As críticas duras ao governo Lula e as crises sociais do cenário sociocultural em que temos - como a queda da máscara do "funk" como suposta expressão do povo pobre, quando funqueiros demonstraram que acumularam fortunas através dessa lorota - mostram que o pensamento crítico não é "mera frescura" de intelectuais distópico-existencialistas europeus. Não convencem os boicotes organizados por pretensos formadores de opinião informais, que comandam as narrativas nas redes sociais. Aquele papo furado de pedir para o público não ler "certos blogues que falam mal de tudo" não fez sentido, e hoje vemos que a "interminável" festa de 2023, da "democracia do sim e nunca do nã...

THE ECONOMIST E A MEGALOMANIA DA BURGUESIA DE CHINELOS ATRAVÉS DO "FUNK"

A CANTORA ANITTA APENAS LEVA O "FUNK" PARA UM NICHO ULTRACOMERCIAL DE UM RESTRITO PÚBLICO DE ORIGEM LATINA NOS EUA. Matéria do jornal britânico The Economist alegou que o "funk" vai virar uma "febre global". O periódico descreve que "(os brasileiros modernos) preferem o sertanejo, um gênero country vibrante, e o funk, um estilo que surgiu nas favelas do Rio. O funk em particular pode se tornar global e mudar a marca do Brasil no processo". Analisando o mercado musical brasileiro, o texto faz essa menção em comparação com a excelente trilha sonora do filme Eu Ainda Estou Aqui , marcada por canções emepebistas, a julgar pela primeiro sucesso póstumo de Erasmo Carlos, "É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo", uma antiga canção resgatada de um LP de 1971. "A trilha sonora suave do filme alimenta a imaginação dos estrangeiros sobre o Brasil como um país onde bandas de samba e bossa nova cantam canções jazzísticas em calçadões de areia. Mas ...

LULA QUER QUE A REALIDADE SEJA SUBJUGADA A ELE

LULA E O MINISTRO DA SECRETARIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, SIDÔNIO PALMEIRA. A queda de popularidade do presidente Lula cria uma situação inusitada. Uma verdadeira "torre de Babel" se monta dentro do governo, com Lula cobrando ações dos ministros e o governo cobrando dos assessores de comunicação "maior empenho" para divulgar as chamadas "realizações do presidente Lula". Um rol de desentendimentos ocorrem, e acusações como "falta de transparência" e "incapacidade de se chegar à população" vêm à tona, e isso foi o tom da reunião que o ministro da Secretaria de Comunicação Social, Sidônio Palmeira, publicitário responsável pela campanha de Lula em 2022, fez com 500 profissionais de assessorias de diversos órgãos do Governo Federal, na última sexta-feira. Sidônio criticou a falta de dedicação dos ministros para darem entrevistas para falar das "realizações do governo", assim como a dificuldade do governo em apresentar esses dados ao ...