As pessoas não entendem como e por que a cultura brasileira está em crise. A imprensa cultural e a intelectualidade "bacana", então, se revoltam com isso. "Especialistas" desmentem com veemência, alegando que nunca se investiu tanto em cultura quanto nos últimos 25 anos.
Claro, existem aqueles críticos musicais que ficam dizendo que existe "um cenário rico" de cultura e ainda arriscam a dar exemplos para dar a falsa impressão de que estamos melhores até do que há 55 anos atrás.
E, quando os exemplos vêm: "artistas" que prometem uma síntese de tudo: rap, rock, reggae, funk autêntico, "funk carioca", "grupos teatrais" mais preocupados com besteirol, péssimos pintores que pintam paisagens que eles nem entendem, escritores que falam de frivolidades em livros que não são mais do que dicionários de gírias e por aí vai.
É claro que o crítico de plantão vai dizer que tudo é "genial". Não que ele realmente goste disso tudo, mas seu compromisso é elogiar o empresário de tal "artista", que é amigo do redator-chefe do crítico, que não iria decepcionar fazendo uma resenha reprovativa.
Pelo elogio dado, o crítico receberá passaporte para viajar de graça país adentro ou mundo afora, que entrará sem pagar naquele evento de gala promovido pela socialite amiga da antropóloga amiga do produtor do "artista" sustentado pelo empresário que tem boas relações com o veículo de grande imprensa.
Aí, no caso da música, é claro que ele vai dizer que a "revolução musical" está naquele músico confuso que faz sempre aquele som que mistura James Brown, hip hop, samba-enredo, um breque nervoso e corrido e uma guitarra virtuose no meio e vem aquele papo na imprensa: "artista visionário", que "tomará o cenário musical do futuro", sempre "à frente de seu tempo".
Foram zilhões e zilhões de "artistas" assim, sempre com a mesma linha de montagem, sempre com o mesmo lero-lero jornalístico. E, no rock, também tem essa coisa: banda que faz um misto de punk, reggae, hip hop, skate, senso de humor etc e o mesmo papo de sempre. "Banda visionária", "salvação do rock da década", "antecipadora de tendências" etc etc.
Mas tudo isso se dá quando se fala em "artistas" medianos que podem até não serem necessariamente ruins - com boa vontade, dá para ouvir CDs deles sem fazer cara feia - , mas são longe de ser a "descoberta da pólvora" ou a "salvação do planeta" que o crítico musical influente escreve para agradar produtores, socialites, empresários, executivos de gravadora e rádio etc.
E quando se fala em gente pior, como no brega-popularesco? Aí a coisa pega feio. Se o crítico fica elogiando o "funk", dando a crer que é "a grande revolução artística do milênio", é um jabaculê tremendo, assim como aquele "dirigismo cultural" que nos empurra ídolos esquecidos do brega como se fossem "grandes gênios injustiçados".
Que não faltam artistas genuínos no país, não faltam. Mas o fato deles não arrumarem espaço na mídia, e pelo fato de que o antigo patrimônio musical das classes populares hoje é praticamente um privilégio de classes mais abastadas, revela uma grande crise em nossa cultura.
O grande problema é que as classes acadêmicas e as elites abastadas que se acham "julgadoras" da cultura popular são dotadas de todos os preconceitos tidos como "sem preconceitos" porque apresentam um paternalismo aparentemente benevolente. Mas também muitos "bacanas", evitando ter problemas trabalhistas com empregados domésticos, vão logo exaltando seu entretenimento.
E aí vejo visões de pessoas que acham que basta a Lei Rouanet para transformar a breguice reinante em coisa genial. Como se os medíocres que nos azucrinam nos últimos 25 anos (outros até bem mais), com alguma injeção de dinheiro (e de vestuário, tecnologia e assessoria), pudessem se tornar "artistas melhores".
A geração neo-brega de 1990 foi um desastre, porque tudo que os "pagodeiros" e "sertanejos" da Era Collor puderam fazer "em prol da MPB" foi gravar covers com arranjos piorados, parecendo calouros de reality show. Chuva de dinheiro não é escola de música e o talento não melhora porque existe mais grana no bolso.
Pelo contrário, o dinheiro só acaba melhorando a aparência. E aí vemos que há muitos ídolos medíocres que apenas continuam suas carreiras com melhor suporte financeiro. Tornaram-se até profissionais habilidosos, mas não artistas melhores. Continuam tão medíocres quanto antes, só que até a classe média alta passou a se acostumar a eles que pensa que eles se tornaram "geniais".
Talvez fosse melhor que as pessoas se informassem mais sobre a crise da cultura antes de supor que o Brasil vive um "mar de rosas" cultural.
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