Pular para o conteúdo principal

JORNALISMO CULTURAL HOJE VIVE ATRELADO AO ESQUEMÃO


Você consulta blogues de críticos musicais, colunas sobre cultura na Internet e revistas musicais e há uma aparente unanimidade dos críticos sobre a suposta genialidade do rock brasileiro pós-1995 que passou a pipocar por aí e que promete voltar a ser modismo através do programa Superstar.

De repente, a cada semana um crítico anuncia a próxima salvação do planeta, e são os mesmos comentários sobre a banda em questão: numa semana é o Malta, noutra é o Suricato, noutra é o Scalene, noutra é o Supercombo, mas num meio caminho até a banda do funqueiro Mr. Catra vira a "maior banda de todos os tempos da última semana". Ou um Tianastácia de uns 15 anos atrás.

Você lê maravilhas sobre as bandas, e as referências que elas citam tem de tudo: krautrock (progressivo alemão), King Crimson, Stiff Little Fingers, Superchunk, Smiths, Velvet Underground, Jesus and Mary Chain e até as "saudades eternas" da Legião Urbana.

No entanto, o que se ouve no som é algo aquém. É o mesmo roquinho indigente dos tempos "primitivos" dos anos 1990, quando as bandas eram menos criativas não só no som como também nas referências, nunca indo além da trinca grunge / poser / funk metal ou o que vier na moda (mais tarde vieram o poppy punk e o nu metal), vide a escolha nada criativa de covers radiofônicos.

Mas hoje até o "sertanejo universitário" tenta se passar por "alternativo" e as últimas gerações do brega-popularesco estão supervitaminadas de "informações". todo mundo vendo MTV, VH-1, YouTube, tem funqueiro visitando galeria de arte, breganejo indo para a Galeria do Rock, axézeiro tentando viagens psicodélicas com LSD etc etc etc.

Só que o resultado, meus amigos, é medíocre. E, no caso do "novo" Rock Brasil, pode-se até admitir algum esforço de fazer uma sonoridade convincente, que funcione no palco e faça a plateia pular e cantar junto. Só que a criatividade é fraca, o que se nota é apenas uma fórmula, uma linha de montagem estética e sonora que dá a impressão de que um preocupante déjà-vu.

O exemplo é o Scalene, que visualmente parece o Weezer e sonoramente é um Foo Fighters subnutrido e apático. Ou o Malta, que é um Nickelback tentando copiar o visual do Sepultura. Gente que, além disso, é tão submissa ao mercado que aceita até participar de concursos de calouros diversos.

E os críticos musicais são incompetentes por acharem que esses grupos são "a salvação da lavoura"? Não necessariamente. Pelo contrário, os jornalistas culturais, em boa parte, são altamente competentes e bastante informados das coisas, mas eles estão ligados a um esquemão do qual dependem para não ficarem de fora nas suas façanhas profissionais.

Fazer o quê? Eles trabalham em empresas de Comunicação, que já estabelecem uma parceria publicitária com rádios, anunciantes diversos, empresas organizadoras de eventos de música internacional, assessorias de imprensa diversas, e tudo o que os jornalistas têm que fazer é aceitar as "rádios rock" que estão aí e o roquinho associado, sem questionar.

É claro que, nos bastidores, esses jornalistas sabem do que está por trás. Rádios "de rock" cujos radialistas entendem tanto de rock quanto David Brazil entende de engenharia nuclear. Bandas que só sabem copiar o som do momento, seja ele Nirvana, Red Hot Chili Peppers ou Coldplay, ou algum Matchbox 20 e Nickelback passando no acostamento.

Eles sabem que as rádios nem de longe se comparam à Fluminense FM, e as bandas estão muito aquém da visceralidade que era a Legião Urbana. Sabe que essa "cultura rock" que está aí é fraca, sem sinceridade e tão verdadeira quanto político corrupto fazendo campanha eleitoral. Mas eles, por razões óbvias, não podem questionar e fingem que estão gostando do esquema.

Ora, se o crítico musical tal falar mal da banda X, dizendo que ela não vai além da imitação costurada de Coldplay com Metallica ou de Muse com Red Hot Chili Peppers ou de soar como um Oasis dopado de remédio para dormir, é porque ele sabe que elogiar garante algumas regalias. No fundo, ele é o refém desse esquemão e tem que partir para o faz de conta, mesmo.

Mais do que ninguém, eles sabem que essas bandas são medíocres. Eles são os primeiros que, no Brasil, conhecem o som das bandas matrizes, e não dá para comparar uma imitação brasileira com a fonte original.

Em certos casos, a imitação é misturada: a banda mistura Muse com Metallica, ou Coldplay com Faith No More, Foo Fighters com Pearl Jam, até O Rappa com Los Hermanos ou Raimundos com Charlie Brown Jr., pois a essas alturas até bandas brasileiras passaram a ser fontes para as xerox misturadas das bandas atuais.

O jornalista sabe que a mediocridade existe, mas ele tem que forjar um "entusiasmo", e inventa coisas como "a banda A tem aquela levada psicodélica com letras introspectivas de cortar o coração" ou "o som da banda B é como um soco nos estômagos dos acomodados".

Se não for assim, ele será boicotado na hora de cobrir o futuro concerto da banda gringa. Imagine o jornalista cultural falar mal da banda tal que apareceu no circo de marionetes dos reality shows musicais? Ele será proibido principalmente de visitar o camarim dos Foo Fighters na sua próxima vinda ao Brasil e não poderá tirar uma "exclusiva" com Dave Grohl.

Esses críticos musicais, até certo ponto, se tornaram "vendidos", mas não por culpa deles. Eles mantém o seu profissionalismo, sua competência e seus bons textos, mas são obrigados a seguir o esquema de jabaculê, compadrios e clientelismo do show business.

Os críticos apenas se servem de um esquema em que os "peixes grandes" mandam em tudo, até na forma como se deve dar o radialismo rock - com essas rádios de happy rock, a 89 FM e a Rádio Cidade, cheias de laquê, purpurina, pompom e outras maquiagens - e como deve ser uma "nova" banda de rock, de preferência aceitando o circo amestrado de Superstar e derivados.

É a regra do negócio.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

FUNQUEIROS, POBRES?

As notícias recentes mostram o quanto vale o ditado "Quem nunca comeu doce, quando come se lambuza". Dois funqueiros, MC Daniel e MC Ryan, viraram notícias por conta de seus patrimônios de riqueza, contrariando a imagem de pobreza associada ao gênero brega-popularesco, tão alardeada pela intelectualidade "bacana". Mc Daniel recuperou um carrão Land Rover avaliado em nada menos que R$ 700 mil. É o terceiro assalto que o intérprete, conhecido como o Falcão do Funk, sofreu. O último assalto foi na Zona Sul do Rio de Janeiro. Antes de recuperar o carro, a recompensa prometida pelo funqueiro foi oferecida. Já em Mogi das Cruzes, interior de São Paulo, outro funqueiro, MC Ryan, teve seu condomínio de luxo observado por uma quadrilha de ladrões que queriam assaltar o famoso. Com isso, Ryan decidiu contratar seguranças armados para escoltá-lo. Não bastasse o fato de, na prática, o DJ Marlboro e o Rômulo Costa - que armou a festa "quinta coluna" que anestesiou e en

FIQUEMOS ESPERTOS!!!!

PESSOAS RICAS FANTASIADAS DE "GENTE SIMPLES". O momento atual é de muita cautela. Passamos pelo confuso cenário das "jornadas de junho", pela farsa punitivista da Operação Lava Jato, pelo golpe contra Dilma Rousseff, pelos retrocessos de Temer, pelo fascismo circense de Bolsonaro. Não vai ser agora que iremos atingir o paraíso com Lula nem iremos atingir o Primeiro Mundo em breve. Vamos combinar que o tempo atual nem é tão humanitário assim. Quem obteve o protagonismo é uma elite fantasiada de gente simples, mas é descendente das velhas elites da Casa Grande, dos velhos bandeirantes, dos velhos senhores de engenhos e das velhas oligarquias latifundiárias e empresariais. Só porque os tataranetos dos velhos exterminadores de índios e exploradores do trabalho escravo aceitam tomar pinga em birosca da Zona Norte não significa que nossas elites se despiram do seu elitismo e passaram a ser "povo" se misturando à multidão. Tudo isso é uma camuflagem para esconder

DEMOCRACIA OU LULOCRACIA?

  TUDO É FESTA - ANIMAÇÃO DE LULA ESTÁ EM DESACORDO COM A SOBRIEDADE COM QUE SE DEVE TER NA VERDADEIRA RECONSTRUÇÃO DO BRASIL. AQUI, O PRESIDENTE DURANTE EVENTO DA VOLKSWAGEN DO BRASIL. O que poucos conseguem entender é que, para reconstruir o Brasil, não há clima de festa. Mesmo quando, na Blumenau devastada pela trágica enchente de 1983, se realizou a primeira Oktoberfest, a festa era um meio de atrair recursos para a reconstrução da cidade catarinense. Imagine uma cirurgia cujo paciente é um doente em estado terminal. A equipe de cirurgiões não iria fazer clima de festa, ainda mais antes de realizar a operação. Mas o que se vê no Brasil é uma situação muito bizarra, que não dá para ser entendida na forma fácil e simplória das narrativas dominantes nas redes sociais. Tudo é festa neste lulismo espetaculoso que vemos. Durante evento ocorrido ontem, na sede da Volkswagen do Brasil, em São Bernardo do Campo, Lula, já longe do antigo líder sindical de outros tempos, mais parecia um showm

FOMOS TAPEADOS!!!!

Durante cerca de duas décadas, fomos bombardeados pelo discurso do tal "combate ao preconceito", cujo repertório intelectual já foi separado no volume Essa Elite Sem Preconceitos (Mas Muito Preconceituosa)... , para o pessoal conhecer pagando menos pelo livro. Essa retórica chorosa, que alternava entre o vitimismo e a arrogância de uma elite de intelectuais "bacanas", criou uma narrativa em que os fenômenos popularescos, em boa parte montados pela ditadura militar, eram a "verdadeira cultura popular". Vieram declarações de profunda falsidade, mas com um apelo de convencimento perigosamente eficaz: termos como "MPB com P maiúsculo", "cultura das periferias", "expressão cultural do povo pobre", "expressão da dor e dos desejos da população pobre", "a cultura popular sem corantes ou aromatizantes" vieram para convencer a opinião pública de que o caminho da cultura popular era através da bregalização, partindo d

VIRALATISMO MUSICAL BRASILEIRO

  "DIZ QUE É VERDADE, QUE TEM SAUDADE .." O viralatismo cultural brasileiro não se limita ao bolsonarismo e ao lavajatismo. As guerras culturais não se limitam às propagandas ditatoriais ou de movimentos fascistas. Pensar o viralatismo cultural, ou culturalismo vira-lata, dessa maneira é ver a realidade de maneira limitada, simplista e com antolhos. O que não foi a campanha do suposto "combate ao preconceito", da "santíssima trindade" pró-brega Paulo César de Araújo, Pedro Alexandre Sanches e Hermano Vianna senão a guerra cultural contra a emancipação real do povo pobre? Sanches, o homem da Folha de São Paulo, invadindo a imprensa de esquerda para dizer que a pobreza é "linda" e que a precarização cultural é o máximo". Viralatismo cultural não é só Bolsonaro, Moro, Trump. É"médium de peruca", é Michael Sullivan, é o É O Tchan, é achar que "Evidências" com Chitãozinho e Xororó é um clássico, é subcelebridade se pavoneando

ESQUERDAS CORTEJANDO UMA CANTORA IDENTITARISTA... MAS CAPITALISTA

CARTAZ DA BOITEMPO JUNTANDO KARL MARX E MADONNA NO MESMO BALAIO. O Brasil está tendo uma aula gratuita do que é peleguismo, com Lula fazendo duplo jogo político enganando o povo pobre e se aliando com os ricos, e do que é pequena burguesia, com uma elite de classe média abastada que aoosta num esquerdismo infantilizado, identitarista e indiferente aos verdadeiros problemas das classes trabalhadoras. As esquerdas mainstream do Brasil, as esquerdas médias, são a tradução local da pequena burguesia falada pela teoria marxista. Uma esquerda que quer soar pop e que, através dos “brinquedos culturais” que fazem do Brasil a versão vida real da novela das 21 horas da Rede Globo, quer o mundo da direita moderada convertido num pretenso patrimônio esquerdista. Isso faz as esquerdas soarem patéticas em muitos momentos. Como se observa tanto na complacência do jornalista Julinho Bittencourt, da Revista Fórum, com o fato da apresentação de Madonna em Copacabana, no Rio de Janeiro, não ter músicos e

ALEGRIA TÓXICA DO É O TCHAN É CONSTRANGEDORA

O saudoso Arnaldo Jabor, cineasta, jornalista e um dos fundadores do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC - UNE), era um dos críticos da deterioração da cultura popular nos últimos tempos. Ele acompanhava a lucidez de tanta gente, como Ruy Castro e o também saudoso Mauro Dias que falava do "massacre cultural" da música popularesca. Grandes tempos e últimos em que se destacava um pensamento crítico que, infelizmente, foi deixado para trás por uma geração de intelectuais tucanos que, usando a desculpa do "combate ao preconceito" para defender a deterioração da cultura popular.  O pretenso motivo era promover um "reconhecimento de grande valor" dos sucessos popularescos, com todo aquele papo furado de representar o "espírito de uma época" e "expressar desejos, hábitos e crenças de um povo". Para defender a música popularesca, no fundo visando interesses empresariais e políticos em jogo, vale até apelar para a fal

O PESADELO GAÚCHO QUE DESAFIA O "SONHO BRASILEIRO"

O CENTRO DE PORTO ALEGRE COM ÁGUA QUE ATINGIU CINCO METROS DE ALAGAMENTO. Não há como sonhar grande. O risco de cair da cama é total. A terrível tragédia do temporal no Rio Grande do Sul é algo que nos faz parar para pensar. Isso é normal para um país próspero? Falta alguma consciência ambiental no nosso país? Até o fechamento deste texto, 56 pessoas morreram e vários estão entre feridos, desabrigados e desaparecidos. Porto Alegre, Caxias do Sul e Gramado estão entre as inúmeras cidades atingidas por chuvas intensas, vendavais, trovoadas e transborda de rios, entre eles o Guaíba. E nós manifestamos pesar sobre essa traumatizante ocorrência e solidariedade às vítimas. A situação é muito triste, mas não deixa de ser lamentável o oportunismo das subcelebridades, aspirantes a super-ricos, de oferecer doações milionárias para as vítimas das enchentes. Uma sociedade que, em condições naturais, quer demais para si e, egoísta, não quer abrir mão do supérfluo para ajudar o próximo a ter o neces

BRASIL NO APOGEU DO EGOÍSMO HUMANO

A "SOCIEDADE DO AMOR" E SEU APETITE VORAZ DE CONSUMIR O DINHEIRO EM EXCESSO QUE TEM. Nunca o egoísmo esteve tão em moda no Brasil. Pessoas com mão-de-vaca consumindo que nem loucos mas se recusando a ajudar o próximo. Poucos ajudam os miseráveis, poucos dão dinheiro para quem precisa. Muitos, porém, dizem não ter dinheiro para ajudar o próximo, e declaram isso com falsa gentileza, mal escondendo sua irritação. Mas são essas mesmas pessoas que têm muito dinheiro para comprar cigarros e cervejas, esses dois venenos cancerígenos que a "boa" sociedade consome em dimensões bíblicas, achando que vão viver até os 100 anos com essa verdadeira dieta do mal à base de muita nicotina e muito álcool. A dita "sociedade do amor", sem medo e sem amor, que é a elite do bom atraso, a burguesia de chinelos invisível a olho nu, está consumindo feito animais vorazes o que seus instintos veem como algo prazeroso. Pessoas transformadas em bichos, dominadas apenas por seus instin

FLUMINENSE FM E O RADIALISMO ROCK QUE QUASE NÃO EXISTE MAIS

É vergonhoso ver como a cultura rock e seu mercado radiofônico se reduziram hoje em dia, num verdadeiro lixo que só serve para alimentar fortunas do empresariado do entretenimento, de promotoras de eventos, de anunciantes, da mídia associada, às custas de produtos caros que vendem para jovens desavisados em eventos musicais.  São os novos super-ricos a arrancar cada vez mais o dinheiro, o couro e até os rins de quem consome música em geral, e o rock, hoje reduzido a um teatro de marionetes e um picadeiro da Faria Lima, se tornou uma grande piada, mergulhada na mesmice do hit-parade . Ninguém mais garimpa grandes canções, conformada com os mesmos sucessos de sempre, esperando que Stranger Things e Velozes e Furiosos façam alguma canção obscura se popularizar. Nos anos 1980, houve uma rádio muito brilhante, que até hoje não deixou sucessora à altura, seja pelos critérios de programação, pelo leque amplo de músicas tocadas e pela linguagem própria de seus locutores, seja pelo alcance do s