Você lê os portais de rádio e as colunas de influentes jornalistas musicais acredita que a 89 FM de São Paulo é uma rádio de rock séria e que, aos 30 anos de existência (a serem celebrados no dia do aniversário de 34 anos de Britney Spears, em 02 de dezembro próximo), a emissora paulista, junto com sua cúmplice carioca Rádio Cidade, irá decolar de vez.
É aquele papo: as duas rádios ressurgiram e, de repente, o rock começa a recuperar seu lugar no rádio, o mercado se reaqueceu, vamos ter Foo Fighters e Pearl Jam vindo ao Brasil de dois em dois anos, vamos ter Monsters Of Rock, Lollapalooza, Rock In Rio, novas bandas de Rock Brasil etc etc.
De repente tudo virou um mar de rosas e as colunas de rádio e de crítica musical "estranham" que a Ipanema FM, última das rádios original e autenticamente rock do país (descontamos, no caso, a aprendiz Kiss FM, que, apesar de boa, precisa comer mais feijão e cortar a farofa para se equiparar às grandes dos anos 1980), tenha saído do ar ontem nesse momento "tão positivo".
Infelizmente, o mercado quer que o radialismo rock adote uma postura esquizofrênica, priorizando rádios comerciais que ora prometem ser mais pop, ora prometem ser mais rock. Quando se pensa que a "rádio rock" tal vai finalmente tocar um clássico das antigas, ela vem com um programa de piadas de brinde. Mas quando a "rádio rock" carrega no programa de piadas, decide também patrocinar a vinda de uma banda alternativa.
É sempre assim. Uma irritante oscilação, que faz cansar qualquer adolescente que queira ouvir rock de verdade no rádio e tem que aguentar locutores engraçadinhos, programas de piadas e outras bobagens.
Há pouco mais de 25 anos isso virou regra no radialismo rock e, como havia escrito, os roqueiros perderam o direito de usarem o microfone, a não ser no final da noite, com os tais programas específicos que nem todo mundo tem a disponibilidade para ouvir. Os adolescentes, então, precisam dormir para encarar a escola na manhã seguinte.
Aí os roqueiros não aceitaram esse papel humilhante de ver rádios ditas de rock serem pop em todo o período diurno, de segunda a sexta das 07 às 20 horas, sábados e domingos das 08 às 17 horas, e adotarem um papel subalterno em programas específicos que em nada refletem na programação diária.
Isso porque, se rola um Syd Barrett, um Damned ou um Hüsker Dü, nesses programas, eles dificilmente irão para a programação diária, que só vai tocar aquilo que, sob o rótulo de "rock", aparece nas paradas de sucesso, podendo até ser bobagens como Virguloides e Bloodhound Gang.
Por isso a debandada foi geral. Com o tempo, fãs de rock progressivo, psicodélico, punk, alternativo dos anos 1980 e outros romperam com essas rádios, que com o tempo fincaram mesmo no perfil pop que, em tese, só usavam como "forma provisória" de "viabilizar a audiência".
O público ouvinte não tem paciência. O adolescente de 16 anos que queria ouvir rock no rádio se tornará um pai de um jovem de 16 anos no momento em que a FM comercial "de rock" se aproximará do perfil de uma rádio de rock autêntica, e isso depois de tantos equívocos que, mesmo assim, não é garantia de serem totalmente eliminados mesmo nessa condição.
E aí o que vemos na "maravilhosa" 89 FM, "a rádio rock de verdade" como festejaram alguns deslumbrados? Ela colocou a "prata da casa" para fazer programas nada roqueiros na Rede TV!, com o claro objetivo de seguir os colegas da Jovem Pan FM.
Dois programas seguem essa tendência: um é o Morning Show, de fofocas da TV, apresentado pelo mesmo Zé Luís do programa Do Balacobaco e ex-garoto propaganda das Casas Bahia. O programa é homônimo ao da Jovem Pan FM. Outro é o Encrenca, humorístico comandado pelo autoproclamado "punk rocker" Tatola Godas que é escancaradamente moldado no Pânico da Pan.
Até o reino mineral sabe que o Encrenca é cópia descarada do Pânico, hoje dividido entre Pânico no Rádio (Jovem Pan FM) e Pânico na Band, até nos cenários e piadas. E só recentemente o produtor do CD As Sete Melhores da Pan, Alexandre Hovoruski, deixou de ser "profissional do rock" a serviço da dupla 89 / Cidade, largando o comando da FM carioca após a acusação de ter esnobado os Titãs.
Aí alguém vai para o Facebook dizer que a 89 e a Cidade são parecidíssimas com a Jovem Pan FM e leva uma saraivada de gozações de internautas. Isso até em comunidades sobre rádio em que, só porque alguns privilegiados conhecem diferentes tipos de antenas, acham que podem entender também de guitarras.
Só que esse pessoal é o mesmo que havia defendido apaixonadamente nomes como Zezé di Camargo & Luciano e o grupo de sambrega Raça Negra há uns cinco anos atrás e hoje, defendendo a Rádio Cidade, se sentem ofendidos quando esta emissora é classificada como "pop rock" e acham "absurdo" dizer que ela está competindo com o mesmo nicho de público da Mix FM.
Fazer o quê? As mídias sociais são o paraíso astral do surrealismo da estupidez que quer prevalecer sobre a coerência. Recentemente houve até ataques racistas, feitos sempre em bloco. Se o pessoal é capaz de agir assim (mesmo ignorando que o racismo é crime inafiançável, condenável à prisão em regime fechado), imagine então na deturpação do radialismo rock.
E os ouvintes da Cidade "roqueira" já têm um histórico de grosserias nas mídias sociais. Eles são uma espécie de versões roqueiras de Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi e companhia. Até Lobão parece o mais tenro carneirinho diante desses "coxinhas" torrados de raiva, como muitos dos chamados haters.
A 89 e a Cidade tentam nos fazer crer que não concorrem com a Mix e Jovem Pan, que odeiam roqueiros coloridos, mas na prática fazem o contrário. Suas programações diárias não passam de matinês infantis da pior qualidade. E isso fica escancarado no caso dos programas da Rede TV!.
Será que vão usar como desculpa a alegação de que os programas só servem para dar visibilidade e audiência para a 89 e depois vão substituir esses programas por algo mais "roqueiro"? Até quando isso se dará? Ou talvez até que ponto isso não passará de uma vã promessa? A realidade dói e não são as letras R-O-C-K que irão cicatrizar essas dores.
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