
Aparentemente, o governo Lula vive uma estabilidade política na qual consegue contornar crises eventuais. No entanto, o presidente, que parece ser o senhor absoluto do seu destino, vive a ilusão de que ele pode tudo, daí confiar demais na sua sustentabilidade política.
Lula, sabemos, abriu mão da essência de seu projeto político progressista, reduzido a um mínimo denominador comum dentro do neoliberalismo assistencialista. As alianças políticas fizeram Lula ceder em quase tudo, daí o eufemismo da “democracia” para mascarar tantas concessões à direita moderada.
A recente viagem ao Japão e ao Vietnã repete os clichês da grandiloquência do presidente Lula no começo do atual mandato, quando ele, sem levar a sério a necessidade de reconstruir o Brasil, preferiu enfatizar a política externa, num grosseiro erro estratégico que fez adiar até o combate à fome, sua maior promessa eleitoral.
O que decepcionou em Lula foi, além das alianças que escapam a seus princípios originais, é o recuo a muitas pautas progressistas, o que nos faz refletir algo que desagrada muito aos ortodoxos de centro-esquerda.
Afinal, não teria sido melhor ter sido eleito um candidato de Terceira Via, aparentemente mediano ou menos ambicioso, um Ciro Gomes ou mesmo um Tarcísio de Freitas, que desse uns dois passos para a frente, do que um glorioso Lula que, prometendo transformar o Brasil na sucursal do Paraíso na Terra, deu uns trinta passos para trás?
Lula está governando para as elites, com as quais o presidente finge entrar em conflito, como na velha rivalidade forjada entre Marlene e Emilinha Borba, nos tempos áureos do rádio brasileiro. Nota-se o presidente Lula viajando mais para promover sua consagração pessoal, enquanto a produção de relatórios anuncia resultados pretensamente fantásticos da economia nacional, através do tal "efeito Lula".
Só que esses resultados são fáceis, fabulosos e rápidos demais para se tornarem realidade e a lógica diz que, se algum desses resultados tivesse mesmo ocorrido, o presidente Lula precisaria estar presente para comandar e organizar os trabalhos, em vez de fazer turismo no exterior sob a desculpa de trazer investimentos e acordos multilaterais que não refletem no cotidiano dos pobres da vida real.
Lula se comporta como se fosse um menino mimado da História, conforme não cansamos de repetir neste blogue. Ele quer que o destino lhe faça sempre os favores, e age como se já estivesse virtualmente reeleito presidente da República em relação ao pleito de 2026.
Isso é uma grande ilusão, uma "democracia" nas mãos de um único homem, que sabotou a campanha presidencial de 2022 renegando justamente o compromisso democrático de encarar a diversidade competitiva de candidatos.
Lula pode até articular para que tudo saia como ele deseja, mas o problema é que o presidente, pelas alianças com a direita moderada e com medidas que, na realidade, estão aquém das narrativas fantásticas dos "recordes históricos" do "efeito Lula", estão desagradando o povo da vida real, que não vê esses resultados ocorrerem na prática.
Não dá para resolver a crise de popularidade com mais propaganda. Até porque a realidade e a democracia não podem ser escravas de um homem, e não é porque esse homem é Lula que ele tem que ser o centro de tudo e o dono da verdade.
Precisamos de um país com os pés no chão. Lula quer ver o Brasil flutuando nas nuvens, no mundo encantado da fantasia mais dourada. Não é para isso que queremos a reconstrução do Brasil. Talvez tivesse sido melhor haver um presidente que, sendo menos fabuloso e prometendo menos, pudesse ao menos dar uns passos para a frente.
Queremos realidade e não sonhos dourados. Depois do pesadelo bolsonarista ter se encerrado, esperemos que acabe também o mundo de cor e fantasia do "Papai Noel da Faria Lima".
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