Se nós temos, no Brasil, um estranho mercado de trabalho alternando entre os excessos meritocráticos - que faz, na esfera pública, os concursos públicos, ao bolar provas complicadas, não conseguirem contratar os servidores certos - e excessos de flexibilização - quando a esfera privada passa a priorizar profissionais mais divertidos do que talentosos - , isso significa que nosso sistema de valores está bastante deteriorado.
Nem em sonhos o Brasil tem condições para virar potência de Primeiro Mundo, pois o nosso país vive um sistema de valores viciado e degradante, que já causa problema ao se impor para todo o povo brasileiro, quanto mais para o resto do mundo.
Nossa elite do bom atraso e do desperdício, que não tem grana para ajudar o próximo nem para comprar livros independentes, mas tem grana para comprar um cigarro e passar mais de vinte horas de um fim de semana para tomar cerveja num bar.
Quando compra um livro, essa "boa" sociedade, alérgica ao Conhecimento e Saber, com maiúsculas, prefere coisas como aqueles best sellers que são, na verdade, sagas de vários volumes, em que cada livro que tem umas 250 páginas tem texto para metade do livro, mas as páginas "aumentam" pelo "milagre" dos aumentos de fontes e espaçamento de linhas, das páginas em branco e muitas, muitas ilustrações. A pessoa leva gato por lebre, pagando uns R$ 35 que parece barato, mas é na verdade uma prestação de uma coleção caríssima publicada ao poucos.
Dessa forma, o sujeito que não tem dinheiro para gastar R$ 51,82 de livro físico ou R$ 27,01 de livro digital da minha obra Devagar Quase Correndo - obra que procura provar que cultura vintage não se faz com É O Tchan e outras tolices - , mas acha que compra barato gastando R$ 30 para adquirir aquela saga da menina do lago perdida na floresta gótica, quando compra caro demais, com livro que tem mais página que texto e que faz parte de uma saga de uns dez episódios, no mínimo.
A pessoa que não quer gastar quase R$ 52 por um livro meu acaba gastando mais de R$ 300 pela saga de sucesso, e em vez de me ajudar a pagar as contas do mês, o cidadão ou cidadã que se acham "cheios da razão" acabam ajudando o autor do best seller, já de origem rica, a comprar uma grande propriedade, um castelo na Europa ou uma mansão em Los Angeles. E os cheios da razão perguntando "e a gente com isso?", na maior arrogância.
Essas pessoas não querem saber de combater a desigualdade, afinal é esse quadro social desigual que permite que eles se achem "diferenciados", embora não dá para considerar diferenciados quem acha que clássicos vintage são "Um Dia de Domingo", "Ilariê" e "Dança da Cordinha".
Não tem dinheiro para gastar coisas importantes nem ajudar quem está na pindaíba, mas tem dinheiro para torrar até em tatuagem. Tanta gente necessitada querendo passear de trem dentro da Grande São Paulo e a turma do desperdício viajando para a Europa só porque está na moda, praticamente pedindo para os monumentos europeus se ajoelharem (?!) diante dos turistas brasileiros que se acham "as pessoas mais importantes do planeta".
Não dá para ignorar o triste caso de um "médium espírita" baiano, o mesmo que chocou o Brasil por ser um "pacifista" elogiando os truculentos atos bolsonaristas de Oito de Janeiro, ter feito carreira fazendo turismo pelo exterior, desviando parte do dinheiro da caridade, além de receber o dinheiro sujo do empresariado ganancioso, para viajar na classe A dos bons aviões, enquanto os pobres alojados na tal "mansão" de Pau da Lima, coitados, mal têm direito a poucos passeios dentro de Salvador.
É lamentável que tenhamos uma elite assim, que se camufla para parecer invisível como classe. Pessoas com péssimos gostos culturais, péssimos hábitos, que seguem uma linhagem social dominante nos tempos do "milagre brasileiro", se achando, no entanto, "a humanidade", querendo impor seus retrocessos ao resto do mundo. Triste o Brasil estar sujeito a se submeter a esse pequeno grupo que decide o que nós temos que acreditar, gostar, consumir e, acima de tudo, aceitar qualquer porcaria.
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