O Brasil está em ebulição. O mundo também. Aliás, com os atentados que mataram 129 pessoas, nos arredores de Paris, incluindo um restaurante, Le Carillon e uma velha casa de espetáculos, Le Bataclan, mostram que o mundo está em crise, nessa pós-modernidade confusa em que valores avançados e retrógrados entram em colisão.
No Brasil, a situação parece "amena", embora os retrocessos que transformaram São Paulo numa cidade decadente e fazem o Estado do Rio de Janeiro, e sua antes imponente capital homônima, um dos mais retrógrados do país (sobretudo pela agressividade de uma parcela de cariocas que fazem trolagem na Internet e até lincham vendedor de praia), provem o contrário.
Num contexto em que os protestos "contra a corrupção" fracassam - Kim Kataguiri vê perder a chance de ser um grande ativista político, por suas posturas risíveis - , logo quando as "boazudas" descobrem tais "manifestações" (como a Mulher Melão e as candidatas do concurso Musas do Brasil demonstram), a situação do nosso país não é tão simplória quanto muitos pensam.
Primeiro, pela funqueira Mulher Melão se somar a tantos "heróis" da intelectualidade "bacana", a intelligentzia festiva que queria a bregalização do país, que migraram para a causa reacionária, como Joelma (ex-Calypso, ou ao menos ex-Chimbinha), Zezé di Camargo & Luciano, Latino, Fábio Jr., MC Guimê, Mr. Catra, Victor & Léo e tantos, tantos outros.
Segundo, porque fica complicado atribuir algum "progressismo" a ícones "populares demais" que agora protestam "contra a corrupção", uma manifestação que, na verdade, é um eufemismo para protesto contra o governo do PT e não contra práticas de desonestidade político-administrativa que merecem serem combatidas.
O sociólogo Jessé de Souza, hoje presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), vai na contramão da intelectualidade festiva que hoje se ocupa a procurar bolivarianismo em "caubóis do asfalto", como quem procura agulha em palheiro, e pretende aquecer o debate com o novo livro, A Tolice da Inteligência Brasileira.
Segundo ele, a classe média brasileira é em maioria conservadora e tola, investindo num discurso de moralidade para compensar o medo de ascensão social dos pobres e o ressentimento pelo sucesso dos ricos. "A classe média explora os mais pobres – e no Brasil essa exploração é uma espoliação absurda – mas finge que é boazinha, afinal de contas, a empregada doméstica é quase da família", disse.
Jessé, um dos críticos da equivocada mania de "economicizar" os problemas sociais, deu a seguinte declaração sobre a relação entre corrupção e desigualdade social:
"Sem dúvida alguma, a desigualdade é mais grave que a corrupção, é de longe a questão mais importante. Obviamente o combate à corrupção, a transparência nos negócios públicos são virtudes republicanas fundamentais a qualquer democracia. O problema é a corrupção ser manipulada politicamente para legitimar interesses que não podem ser expressos de modo direto. A corrupção tem que ser combatida como um fato cotidiano. Quando isso acontece nos outros países, não leva ao drama político, a esse carnaval todo. É o jogo de estar cuidando do interesse da maioria, de limpar o país, enquanto as pessoas continuam sofrendo".
É uma visão muito diferente daquela "admirável" abordagem de intelectuais festivos que acreditam que, transformando o folclore brasileiro numa Disneylândia da cafonice e do mau gosto "popular", se garantia a prosperidade nacional. Anos e anos de bregalização nunca fizeram o povo brasileiro ficar próspero, muito pelo contrário, trouxe o caos nas roças e favelas que integram as "periferias".
A gente até imagina o quanto a intelectualidade festiva, que chegava a invadir os espaços esquerdistas para dizer que o que consideramos a "ditabranda do mau gosto" é uma causa "libertária", tem um grande horror em ver o povo pobre se ascendendo de forma mais rápida e ampla do que os "provocativos" jornalistas, cineastas e cientistas sociais que sonhavam com um Brasil mais brega.
A intelligentzia, que se jurava "sem preconceitos" mas sempre foi muito preconceituosa, mal conseguia esconder seu horror social. Para eles, os pobres só têm sentido quando rebolam até o chão e mostram sorrisos banguelas. Quando eles rompem com esses papéis ridículos, os intelectuais "mais legais do país" reagem e dizem que isso é "higienismo", "eurocentrismo" ou coisa parecida.
Felizmente, vamos aos poucos retomando o debate público, embora haja resistência absurda, sobretudo nas mídias sociais, em que usar o raciocínio questionativo é tão amaldiçoado que muitos questionadores do establishment perdem amigos e ganham inimigos só por causa da capacidade de pensar o país fora da imbecilidade reinante.
Daí ser interessante o trabalho de Jessé de Souza e sua análise a respeito dos problemas sociais do Brasil, olhando o problema de frente, em vez de se submeter aos intelectuais festivos que baixam suas cabeças diante de glúteos rebolativos que, por sinal, andam sintonizados com as causas reacionárias dos "revoltados" que usam o "combate à corrupção" para pedir "Fora PT".
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