Pular para o conteúdo principal

MINHA DECEPÇÃO COM O PARTIDO DA CAUSA OPERÁRIA


A realidade sempre oferece algum tipo de decepção. E eu enfrentei muitas, nos últimos anos.

Roqueiros reacionários, atrizes exaltando "médiuns" farsantes, intelectuais hidrófobos etc. De repente a galeria de antigos heróis e musas se desmorona mediante uma opção e outra.

No caso do esquerdismo, a decepção fortíssima com Lula, agora abraçado aos neoliberais, já fez com que eu decidisse em esquecer o número 13 quando eu me dirigir à urna eletrônica.

Mas ao mesmo tempo vieram denúncias sobre possíveis esquemas de enriquecimento ilícito do Partido da Causa Operária, o PCO, que até pouco tempo atrás via como um oásis, ainda que imperfeito, de preocupação esquerdista com as causas trabalhistas.

Eu já militei no PCO. Foi entre 1991 e 1992. Conheci um colega na matéria Introdução à Sociologia, na Universidade Federal da Bahia, que cursei num semestre em 1991.

Não vou dizer nomes dos membros, mas me envolvi com eles por conta da amizade de um dos membros, que era muito simpático.

Eu morava em Salvador nessa época e, através do PCO, cheguei a voltar para Niterói, cidade onde morei por três etapas (na ocasião, havia encerrado a segunda etapa, de 1981 a início de 1990), para participar do Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE).

Nessa época, junho de 1992, eu tinha 21 anos e, num incidente, tive que brigar com um membro do PCO de Feira de Santana que havia furtado um par de chinelos novo que eu levei para usar, e ele teve que me devolver.

Eu deixei a militância do PCO quando vi que isso dependeria de largar a família, a vida pessoal e até os estudos universitários, em nome da luta política.

Decidi cair fora, quando nos reunimos no pátio de um edifício onde morava uma integrante, nos Barris, junto ao Terminal da Lapa.

Fui chamado de "pequeno burguês" por um dirigente e frustrei o pessoal quando decidi romper com a militância. Foi duro, mas eles tiveram que aceitar.

Apesar disso, respeitei o PCO durante muito tempo, apesar da estranheza de algumas pautas, trazidas pelas palestras do presidente da entidade, Rui Costa Pimenta, cuja aparência é uma espécie de cosplay de Renato Russo mais gordo.

Pautas como a defesa do porte de armas e o fanatismo pelo futebol são defendidas pelo PCO, apesar de serem posturas muito estranhas para o esquerdismo naturalmente democrático. 

O porte de armas, pretexto para guerrilhas revolucionárias, foi apenas uma ideia própria do contexto da Rússia de 1917, sendo inadequado para o contexto das esquerdas de hoje.

Mas até aí, nada demais. Eram posturas criticáveis, que no debate esquerdista se "aceitava" discordando, mas sem deslegitimar os setores esquerdistas, dentro do jogo democrático, ainda que cambaleante, em que vivemos.


Segundo o DCM, o PCO tem empresas de propriedade de Rui Costa Pimenta e seus filhos e um escritório de advogacia de um sócio do presidente do partido "trotskista". Algo bem pequeno-burguês para alguém que pretende ser o porta-voz do marxismo-leninismo-trotskismo de raiz no Brasil.

Conforme a matéria do DCM, o PCO captou R$ 2,2 milhões entre 2018 e 20210 e destes investiu R$ 1,65 milhão em duas empresas de gente relacionada à família Pimenta: um escritório de advocacia que recebeu cerca de R$ 789 mil e uma gráfica, que recebeu cerca de R$ 886 mil.

Há outras empresas, tendo parlamentares do PCO como sócios, que servem para captar dinheiro público. 

O PCO não recebe Fundo Partidário, por causa da baixa quantidade de membros no Congresso Nacional, e se limitava a receber o Fundo Eleitoral, cujas cotas chegaram a ser suspensas em 2019 por decisão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, devido à falta de prestação de contas de 2017.

Pelo menos dois dirigentes, Henrique Árias, um dos secretários do PCO, e Rafael Dantas, genro de Rui Costa Pimenta (o rapaz é marido de Natália Pimenta, filha do presidente do partido), são acusados de assediar dissidentes do PCO, fazendo ameaças ou tentando abafar as denúncias.

E aí o PCO, sem fazer autocrítica, disparou acusações contra Guilherme Boulos, político do PSOL apoiado pelo portal comandado por Kiko Nogueira.

Segundo o PCO, Boulos estaria ligado a uma empresa, o Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa (IREE), presidido pelo empresário Walfrido Warde, que, segundo o Diário da Causa Operária, teria sido "apoiador" das campanhas de Boulos.

O IREE tem como membros, segundo a matéria, dois ex-ministros de Michel Temer, Raul Jungmann - também ex-ministro de Fernando Henrique Cardoso - e Sérgio Etchegoyen.

Etchegoyen é sobrinho de Cyro Etchegoyen, que atuou na repressão durante a ditadura militar, e foi neto de Alcides Etchegoyen, um dos líderes do Clube Militar que atuou no Estado Novo e depois na oposição a Getúlio Vargas.

O PCO também tem um repertório de matérias contra o DCM, para quem quer conferir.

Outras posturas do PCO foram o apoio à volta da milícia Talibã no Afeganistão e a defesa da postura do hoje decadente Monark, que apoia a legalização de um Partido Nazista, medida nociva para a democracia por razões obviamente conhecidas (o holocausto, de traumática lembrança).

Segundo Rui Pimenta, a repressão a partidos nazistas daria margem à repressão ao comunismo.

Rui arriscou-se a fazer comentários antissemitas, confundindo o judaísmo com o autoritarismo de Israel (durante anos expresso pelo poder do antigo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu) ao justificar sua opinião, o que causou revolta das entidades representantes do povo judeu.

Pimenta até enviou uma resposta a essas entidades, mas a meu ver as argumentações foram pouco convincentes.

E vemos também Rui Costa Pimenta dar entrevista à bolsonarista Jovem Pan e dar camiseta para Emílio Surita, num ato arriscado de obter visibilidade.

E o escândalo de Robinho, acusado de participar de estupro coletivo de uma jovem e condenado em última instância, recebeu uma bela passagem de pano do presidente do PCO.

E aí fica minha decepção, minha profunda tristeza sobre os rumos que o esquerdismo está tendo no Brasil.

Continuo esquerdista, mas estou muito triste e frustrado com o PT, o PCO e com outras coisas, como o culturalismo brega-popularesco, os "brinquedos culturais" que recebeu de presente da direita etc.

Tristes retrocessos dessas forças que se dizem progressistas. Com elas, o Brasil não vai para a frente.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

SIMBOLOGIA IRÔNICA

  ACIMA, A REVOLTA DE OITO DE JANEIRO EM 2023, E, ABAIXO, O MOVIMENTO DIRETAS JÁ EM 1984. Nos últimos tempos, o Brasil vive um período surreal. Uma democracia nas mãos de um único homem, o futuro de nosso país nas mãos de um idoso de 80 anos. Uma reconstrução em que se festeja antes de trabalhar. Muita gente dormindo tranquila com isso tudo e os negacionistas factuais pedindo boicote ao pensamento crítico. Duas simbologias irônicas vêm à tona para ilustraresse país surrealista onde a pobreza deixou de ser vista como um problema para ser vista como identidade sociocultural. Uma dessas simbologias está no governo Lula, que representa o ideal do “milagre brasileiro” de 1969-1974, mas em um contexto formalmente democrático, no sentido de ninguém ser punido por discordar do governo, em que pese a pressão dos negacionistas factuais nas redes sociais. Outra é a simbologia do vandalismo do Oito de Janeiro, em 2023, em que a presença de uma multidão nos edifícios da Praça dos Três Poderes, ...

"ANIMAIS CONSUMISTAS"AJUDAM A ENCARECER PRODUTOS

O consumismo voraz dos "bem de vida" mostra o quanto o impulso de comprar, sem ver o preço, ajuda a tornar os produtos ainda mais caros. Mesmo no Brasil de Lula, que promete melhorias no poder aquisitivo da população, a carestia é um perigo constante e ameaçador. A "boa" sociedade dos que se acham "melhores do que todo mundo", que sonha com um protagonismo mundial quase totalitário, entrou no auge no período do declínio da pandemia e do bolsonarismo, agora como uma elite pretensamente esclarecida pronta a realizar seu desejo de "substituir" o povo brasileiro traçado desde o golpe de 1964. Vemos também que a “boa” sociedade brasileira tem um apetite voraz pelo consumo. São animais consumistas porque sua primeira razão é ter dinheiro e consumir, atendendo ao que seus instintos e impulsos, que estão no lugar de emoções e razões, ordenam.  Para eles, ter vale mais do que ser. Eles só “são” quando têm. Preferem acumular dinheiro sem motivo e fazer de ...

A SOCIEDADE HIPERMERCANTIL E HIPERMIDIÁTICA

CONSUMISMO, DIVERSÃO E HEDONISMO OBSESSIVOS SÃO AS NORMAS NO BRASIL ATUAL. As pessoas mais jovens, em especial a geração Z mas incluindo também a gente mais velha nascida a partir de 1978, não percebe que vive numa sociedade hipermercantilizada e hipermidiatizada. Pensa que o atual cenário sociocultural é tão fluente como as leis da natureza e sua rotina supostamente livre esconde uma realidade nada livre que muitos ignoram ou renegam. Difícil explicar para gente desinformada, sobretudo na flor da juventude, que vivemos numa sociedade marcada pelas imposições do mercado e da mídia. Tudo para essa geração parece novo e espontâneo, como se uma gíria fabricada como “balada” e a supervalorização de um ídolo mediano como Michael Jackson fossem fenômenos surgidos como um sopro da Mãe Natureza. Não são. Os comportamentos “espontâneos” e as gírias “naturais” são condicionados por um processo de estímulos psicológicos planejados pela mídia sob encomenda do mercado, visando criar uma legião de c...

COVID-19 TERIA MATADO 3 MIL FEMINICIDAS NO BRASIL

Nos dez anos da Lei do Feminicídio, o machismo sanguinário dos feminicidas continua ocorrendo com base na crença surreal de que o feminicida é o único tipo de pessoa que, no Brasil, está "proibida de morrer". Temos dois feminicidas famosos em idade de óbito, Pimenta Neves e Lindomar Castilho (87 e 84 anos, respectivamente), e muitos vão para a cama tranquilos achando que os dois são "garotões sarados com um futuro todo pela frente". O que as pessoas não entendem é que o feminicida já possui uma personalidade tóxica que o faz perder, pelo menos, 20 anos de vida. Mesmo um feminicida que chega aos 90 anos de idade é porque, na verdade, chegaria aos 110 anos. Estima-se que um feminicida considerado "saudável" e de boa posição social tem uma expectativa de vida correspondente a 80% de um homem inofensivo sob as mesmas condições. O feminicida tende a viver menos porque o ato do feminicídio não é um simples desabafo. No processo que se dá antes, durante e depois ...

ESTÁ BARATO PARA QUEM, CARA PÁLIDA?

A BURGUESIA DE CHINELOS ACHA BARATO ALUGUEL DE CASA POR R$ 2 MIL. Vivemos a supremacia de uma elite enrustida que, no Brasil, monopoliza as formas de ver e interpretar a realidade. A ilusão de que, tendo muito dinheiro e milhares de seguidores nas redes sociais dos quais umas centenas concordam com quase tudo, além de uma habilidade de criar uma narrativa organizada que faz qualquer besteira surreal soar uma pretensa verdade, faz da burguesia brasileira uma classe que impõe suas visões de mundo por se achar a "mais legal do planeta". Com isso, grandes distorções na interpretação da realidade acabam prevalecendo, mais pelo efeito manada do que por qualquer sentido lógico. "Lógica " é apenas uma aparência, ou melhor, um simulacro permitido pela organização das narrativas que, por sorte, fabricam sentido e ganham um aspecto de falsa coerência realista. Por isso, até quando se fala em salários e preços, a burguesia ilustrada brasileira, que se fantasia de "gente si...

ED MOTTA ERROU AO CRITICAR MARIA BETHÂNIA

  Ser um iconoclasta requer escolher os alvos certos das críticas severas. Requer escolher quem deveria ser desmascarado como mito, quem merece ser retirado do seu pedestal em primeiro lugar. Na empolgação, porém, um iconoclasta acaba atacando os alvos errados, mesmo quando estes estão associados a certos equivocos. Acaba criando polêmicas à toa e cometendo injustiças por conta da crítica impulsiva. Na religião, por exemplo, é notório que a chamada opinião (que se torna) pública pegue pesado demais nos pastores e bispos neopentecostais, sem se atentar de figuras mais traiçoeiras que são os chamados “médiuns”, que mexem em coisa mais grave, que é a produção de mensagens fake atribuídas a personalidades mortas, em deplorável demonstração de falsidade ideológica a serviço do obscurantismo religioso de dimensões medievais. Infelizmente tais figuras, mesmo com evidente charlatanismo, são blindadas e poupadas de críticas e repúdios até contra os piores erros. É certo que a MPB autêntica ...

COMO A BURGUESIA DE CHINELOS DISSIMULA SUA CONDIÇÃO SOCIAL?

A BURGUESIA ENRUSTIDA BRASILEIRA SE ACHA "POBRE" PORQUE, ENTRE OUTRAS COISAS, PAGA IPVA E COMPRA MUITO COMBUSTÍVEL PARA SEUS CARRÕES SUV. A velha Casa Grande ainda está aqui. Os golpistas de 1964 ainda estão aqui. Mas agora essa burguesia bronzeada se fantasia de “gente simples” e se espalha entre o povo, enquanto faz seus interesses e valores prevalecerem nas redes sociais. Essa burguesia impõe seus valores ou projetos como se fossem causas universais ou de interesse público. A gíria farialimer “balada”, o culto aos reality shows , o yuppismo pop-rock da 89 FM, Rádio Cidade e congêneres, a exaltação da música brega-popularesca (como a axé-music, o trap e o piseiro), a pseudo-sofisticação dos popularescos mais antigos (tipo Michael Sullivan e Chitãozinho & Xororó) e a sensação que a vida humana é um grande parque de diversões. Tudo isso são valores que a burguesia concede aos brasileiros sob a ilusão de que, através deles, o Brasil celebrará a liberdade humana, a paz soc...

A EXPLOSÃO DO SENSO CRÍTICO QUE ENVERGONHA A "BOA" SOCIEDADE

Depois de termos, em 2023, o "eterno" verão da conformidade com tudo, em que o pensamento crítico era discriminado e a regra era todos ficarem de acordo com um cenário de liberdade consumista e hedonista, cuja única coisa proibida era a contestação, o jogo virou de vez. As críticas duras ao governo Lula e as crises sociais do cenário sociocultural em que temos - como a queda da máscara do "funk" como suposta expressão do povo pobre, quando funqueiros demonstraram que acumularam fortunas através dessa lorota - mostram que o pensamento crítico não é "mera frescura" de intelectuais distópico-existencialistas europeus. Não convencem os boicotes organizados por pretensos formadores de opinião informais, que comandam as narrativas nas redes sociais. Aquele papo furado de pedir para o público não ler "certos blogues que falam mal de tudo" não fez sentido, e hoje vemos que a "interminável" festa de 2023, da "democracia do sim e nunca do nã...

THE ECONOMIST E A MEGALOMANIA DA BURGUESIA DE CHINELOS ATRAVÉS DO "FUNK"

A CANTORA ANITTA APENAS LEVA O "FUNK" PARA UM NICHO ULTRACOMERCIAL DE UM RESTRITO PÚBLICO DE ORIGEM LATINA NOS EUA. Matéria do jornal britânico The Economist alegou que o "funk" vai virar uma "febre global". O periódico descreve que "(os brasileiros modernos) preferem o sertanejo, um gênero country vibrante, e o funk, um estilo que surgiu nas favelas do Rio. O funk em particular pode se tornar global e mudar a marca do Brasil no processo". Analisando o mercado musical brasileiro, o texto faz essa menção em comparação com a excelente trilha sonora do filme Eu Ainda Estou Aqui , marcada por canções emepebistas, a julgar pela primeiro sucesso póstumo de Erasmo Carlos, "É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo", uma antiga canção resgatada de um LP de 1971. "A trilha sonora suave do filme alimenta a imaginação dos estrangeiros sobre o Brasil como um país onde bandas de samba e bossa nova cantam canções jazzísticas em calçadões de areia. Mas ...

LULA QUER QUE A REALIDADE SEJA SUBJUGADA A ELE

LULA E O MINISTRO DA SECRETARIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL, SIDÔNIO PALMEIRA. A queda de popularidade do presidente Lula cria uma situação inusitada. Uma verdadeira "torre de Babel" se monta dentro do governo, com Lula cobrando ações dos ministros e o governo cobrando dos assessores de comunicação "maior empenho" para divulgar as chamadas "realizações do presidente Lula". Um rol de desentendimentos ocorrem, e acusações como "falta de transparência" e "incapacidade de se chegar à população" vêm à tona, e isso foi o tom da reunião que o ministro da Secretaria de Comunicação Social, Sidônio Palmeira, publicitário responsável pela campanha de Lula em 2022, fez com 500 profissionais de assessorias de diversos órgãos do Governo Federal, na última sexta-feira. Sidônio criticou a falta de dedicação dos ministros para darem entrevistas para falar das "realizações do governo", assim como a dificuldade do governo em apresentar esses dados ao ...