UMA COISA É O SONHO, OUTRA É A REALIDADE.
Não é segredo meu a minha profunda decepção com Lula, que cheguei a apoiar com prazer. Ver ele em clima de festa diante de uma realidade distópica e, em seguida, se aliando com forças divergentes, eu comparo isso com a realidade e vejo o quanto Lula se perdeu no caminho, de 2021 para cá.
Tenho 51 anos de idade, embora eu seja muito jovial. Meu realismo, no entanto, não é questão de idade. Se eu tivesse trinta anos a menos, eu teria a mesma percepção crítica, apesar dos 20 e tantos anos serem fase de muitas utopias e muitas precipitações.
O fenômeno Lula está se confirmando na pior campanha presidencial deste período. A campanha é cheia de contradições, de recuos, de precipitações, de muito salto alto, de muito clima de "já ganhou". Por sorte, Lula prevalece na vantagem eleitoral porque consegue exercer um apelo emotivo nos seus seguidores e a memória afetiva dos petistas mais à esquerda também acredita, de maneira vã, de que o Lulão dos sindicatos irá renascer forte e ruidoso em algum momento de seu governo.
Não acredito em "voto útil", "apoio crítico" ou "voto plebiscitário" no Lula. Não acredito na vitória de Lula na marra, na falácia de "ou Lula ou nada". Com Lula assim, reduzido a um ursinho de pelúcia do empresariado neoliberal, não tenho a menor vontade em votar nele e nem em Haddad, já que eu mudei meu domicílio eleitoral de Niterói para São Paulo. Mas também não votaria em Marcelo Freixo.
Eu junto as peças do quebra-cabeça e vejo o quanto é estranho confrontar o Lula idealizado pelo imaginário sentimentalista dos seus seguidores, o "Lula gigante", "o Lula, esperança do Brasil", com o Lula agarrado ao empresariado da Faria Lima, garantindo que vai aproveitar alguma coisa da reforma trabalhista e que vai estabelecer um limite para os gastos públicos.
Não. Lula não vai transformar o Brasil. Ele está cheio de promessas atraentes enquanto está em campanha. Mas as circunstâncias que ele deixou se desenvolverem farão com que ele abra mão de boa parte das promessas, fazendo um governo medíocre e muito abaixo dos dois governos anteriores do petista.
E por que eu constato isso? Porque eu sou perverso, ressentido, virei "coxinha" e sou "cinquentão ranzinza"? Não.
Constato isso porque junto as peças do quebra-cabeça. Analiso fatos aqui e ali. Não sou ingênuo de acreditar que o mesmo empresariado que ajudou Michel Temer a implantar retrocessos trabalhistas e a desmontar o Estado agora aceite, sorrindo, que Lula acabe com tudo isso. Nem se evocar Jesus Cristo Lula irá convencer as elites a aceitar medidas como o fortalecimento do Estado.
Da mesma forma, como as elites vão aplaudir uma medida como a taxação de impostos para os mais ricos? Lula vai cobrar dinheiro dos novos amiguinhos? As elites não gostariam de pagar a conta do apoio a Lula. Alguém imagina que as elites que, até pouco tempo atrás, defenderam o golpismo de Temer, passaram a se solidarizar com os oprimidos?
Não, meus caros. Lula não vai transformar o Brasil. Ele está se aliando demais a quem diverge do seu projeto político. Isso tem um preço. Lula quer voar alto demais, mas se alia com quem quer e vai lhe cortar as asas. Os apóstolos do Estado Mínimo não engolirão a ideia do "Estado forte" mesmo que seja para promover o crescimento econômico.
Uma coisa é a fantasia do Lula bonachão, festivo, afetuoso, que causa paixão e euforia para a plateia de lulistas entusiasmados e sonhadores, guiados pela frase do próprio petista que ilustra esta postagem. Outra coisa é Lula atrelado aos neoliberais, aos banqueiros, aos grandes empresários rentistas, que fizeram o que restava do antigo líder sindical desaparecer para sempre, dando lugar ao do grande pelego político.
O que Lula vai fazer é apenas um governo neoliberal com algumas concessões assistenciais. As vantagens sociais serão muito poucas. Quando muito, será apenas um governo de Fernando Henrique Cardoso com relativa preocupação social. Pode até ser melhor do que Bolsonaro, mas é preciso desistir da ideia de que Lula vai fazer um governo transformador que fará os brasileiros felizes de novo.
O contexto, infelizmente, não é para isso. É necessário que os brasileiros sejam mais realistas e muito menos sonhadores, pois caso contrário cairão da cama, levando um doloroso tombo no chão da realidade que não está aí para ver os neoliberais golpistas de 2016 transformados, como num passe de mágica, em progressistas generosos.
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