Preocupante ver a persistência da gíria "balada" no vocabulário brasileiro. Uma gíria que se recusa a ter a efemeridade e o caráter grupal das gírias, uma "gíria do Terceiro Reich", a única expressão coloquial que parece ter seu próprio departamento de marketing, seu próprio esquema de mídia e seu lobby empresarial mais específico.
"Balada" é o símbolo da novilíngua brasileira (sobre a "novilíngua", ver 1984, de George Orwell). Gíria originária da juventude riquinha da Faria Lima nos anos 1990, ela se baseava no consumo de alucinógenos, como o ecstasy, definido pelo eufemismo de "bala". Neste sentido, "balada" seria um rodízio de alucinógenos, e é extremamente surreal que esse termo tenha se propagado de forma tão obsessiva.
Isso rendeu até truculência de internautas sociopatas, nos tempos do Orkut, que não era o paraíso de gente descolada, progressista e radiante como muitos falam. No Orkut havia fascistas mirins, defensores de rearmamento da população e patetas sádicos que defendiam a gíria "balada" que era a única coisa que eles tinham como pretensamente moderno, já que estes reaças juvenis são tão retrógrados quanto o Comando de Caça aos Comunistas nos anos 1960.
A gíria "balada" foi patenteada por Tutinha, da Jovem Pan. Isso não é invenção. O primeiro produto da propagação dessa gíria é a coletânea de pop dançante Na Balada, nome de um programa homônimo da rede radiofônica.
Luciano Huck, que fazia o programa Torpedo da Pan, difundiu a gíria "balada", o que indica que ele e Tutinha são os "donos" dessa gíria que insiste em ser "acima dos tempos e das tribos". A Rede Globo, que contratou Huck, tornou-se parceira da Jovem Pan na popularização da gíria "balada", que depois foi ampliada pela mídia concorrente mais popularesca: SBT, Record, Rede TV!, Band.
Até telejornais sérios navegavam na onda e difundiam a gíria "balada" no esquema da novilíngua, tentando empobrecer nosso vocabulário colocando esta expressão para uma série de significados: festa noturna, apresentação de DJ, jantar entre amigos, ou simplesmente vadiar durante a madrugada.
E agora vemos escolas de ensino fundamental e médio falando até em "baladinha", festinha de crianças! Chegou-se a esse ponto, embora também, por outro lado, marmanjões tenham aderido a essa precarização do vocabulário - persistentemente difundido por portais como G1 e UOL - falando "balada" em vez de "festa". Até antigas expressões como "gandaia" e "noitada" soam mais simpáticas. "Fuzarca", gíria do passado e em desuso, soa mais atraente.
É lamentável essa persistência surreal de uma gíria estúpida e patética como "balada". Para mim, BALADA mesmo é música lenta, enredo triste, aventura arriscada. Nada de festinha dançante que mais parece uma versão cafona das raves britânicas. E dói muito a arrogância extrema dos defensores da gíria "balada", cuja arrogância faz os irmãos Gallagher do Oasis parecerem exemplos perfeitos e impecáveis de humildade.
E ver que tudo isso veio de um jargão da juventude da Faria Lima, dos jovens riquinhos que frequentavam a noitada paulista dos anos 1990 e que chamavam alucinógeno de "bala". Sinal de que o Brasil está culturalmente uma droga, entregue à novilíngua de fazer a fictícia Oceânica de 1984 parecer brincadeira de criança. Robert Fisk deve se agitar no túmulo ao ver que o vocabulário de poder, no Brasil, está a serviço do entretenimento e da cultura.
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