Pular para o conteúdo principal

GOVERNO LULA DEMONSTROU SER MAIS MODERADO QUE FASE PARLAMENTARISTA DE JANGO


É um grande exagero afirmar que o plano de atentado contra Lula é pior do que o golpe de 1964. O plano não foi pior nem menos grave, apenas foi um plano bastante violento. Esquecem aqueles que fizeram essa comparação que o golpe de 1964 escondia um plano bastante sangrento.

A Operação Brother Sam foi bolada como um plano mais violento do que o que se tornou o golpe que derrubou João Goulart. Na verdade, havia três circunstâncias: o debate dos generais sobre como tirar Jango do poder, o projeto do Departamento de Estado dos EUA na guerra das forças militares estadunidenses contra a resistência brizolista, e a "improvisada" operação militar que, de um quartel de Juiz de Fora, se dirigiu para o Rio de Janeiro para declarar o golpe que a História registrou.

No caso da Operação Brother Sam, tramada pelas autoridades estadunidenses, também havia um plano de extermínio, pois os militares dos EUA estavam preparados para exterminar, se for preciso, João Goulart, Juscelino Kubitschek e Leonel Brizola, se as circunstâncias lhes permitirem tamanha atrocidade.

A operação iria causar destruições em vários prédios no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Brasília e em Porto Alegre, e causaria um massacre das forças de resistência brizolista. Por pouco, nem mesmo um ensaio dessa operação chegou a ser feito, pois Jango e Brizola foram para o exílio e o "dispositivo militar" do então ministro da Guerra (antigo nome do ministro da Defesa), Argemiro Assis Brasil, passou para o lado das tropas de Olímpio Mourão Filho e realizaram o golpe.

Dizemos isso porque devemos submeter a História aos fatos e não aos caprichos dos juízos de valor dos "intelectuais de Facebook", que dominam as narrativas subordinados ao mainstream midiático. Achar que o atentado contra Lula é "pior do que o golpe de 1964" é ignorar a Operação Brother Sam, depois denunciada como uma perigosa trama que destruiria o Brasil.

Há um esforço sutil de "reinventar" as narrativas que minimizam o golpe de 1964 - não da forma dos delírios bolsonaristas, que afirmam que o golpe "nunca existiu" - e o recente golpe de 2016, contra Dilma Rousseff. Tudo para inocentar uma classe que participou ativamente desses dois episódios, mas que hoje tenta se livrar da responsabilidade, agora pretensamente convertida numa "elite democrática".

E aí vemos que, comparando com os fatos do passado, podemos, todavia, comparar o governo Lula neste terceiro mandato a uma versão mais moderada do que a moderadíssima fase parlamentarista de João Goulart, sobretudo o período que o governo esteve nas mãos de Tancredo Neves, o então primeiro-ministro, o mesmo Tancredo reabilitado pelo movimento Diretas Já de 1984.

Tancredo governou o Brasil entre 1961 e 1962, e nessa época o projeto político e econômico era levemente conservador, e João Goulart tinha uma função quase decorativa, quase não podendo decidir politicamente pelo país. A gestão de Tancredo enfatizava o mesmo caráter "disciplinar" de resolver a crise econômica através da restrição das políticas salariais e a resolução de dívidas públicas.

Hoje, o governo Lula, se for comparado com o passado, pode ser um crossover entre a fase parlamentarista de Jango sob a batuta de Tancredo - na prática, "avô" político de Geraldo Alckmin, vice de Lula, por estarem ligados ao político Mário Covas, apadrinhado pelo mineiro e padrinho do paulista de Pindamonhangaba - e os discursos de Jango na Central do Brasil.

Só que Jango discursando na Central do Brasil era diferente das palavras fáceis de Lula, pois o antigo presidente do primeiro trimestre de 1964 não queria produzir frases de efeito, mas lançar propostas e assinar ações. 

Consta-se que o golpe de 1964 se deu por duas coisas: desapropriação de fazendas improdutivas à beira das rodovias brasileiras e a Lei de Remessa de Lucros, que impedia as empresas estrangeiras instaladas no Brasil de levar "dinheiro demais" para seus países de origem, promovendo a "fuga de capitais".

Hoje os discursos de Lula são apenas um meio de confundir desabafos com "tentativas de ações". Ou seja, se Lula não está autorizado a fazer por conta das alianças feitas com a burguesia através da "frente ampla", está autorizado a comentar. Daí que muitos comentários, como os feitos contra a gestão abusiva de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, e a privatização da Eletrobras, feitos por Lula, nunca passaram de palavras enérgicas que nunca resultaram em ações.

O governo Lula, no atual mandato, chega ao paroxismo de se distanciar até mesmo dos já moderadíssimos mandatos anteriores, sepultando o que restava de progressista no projeto político do presidente. Hoje Lula tenta realizar o "mínimo denominador comum" entre o neoliberalismo tucano e algumas medidas assistencialistas, criando um débil arremedo do que haviam sido as realizações dos outros mandatos, nada revolucionárias, mas esforçadas e de certo modo expressivas.

Note-se que, na cultura musical, a situação de hoje tornou-se pior. Se em 1961 os ídolos popularescos, como Waldick Soriano e Orlando Dias (não confundir com o grande Orlando Silva, o "cantor das multidões" e, por sinal, homônimo a um ex-ministro de Lula), tinham sucesso restrito a um público mais interiorano e suburbano e eram apadrinhados pela mídia empresarial (Dias era apadrinhado por Abraão Medina, pai de Roberto Medina, do Rock In Rio), hoje o brega-popularesco vive uma supremacia totalitária, sufocando os espaços de expressão da MPB e do Rock Brasil.

Portanto, temos um cenário muito conservador no Brasil, marcado pelas convulsões sociais que soam como uma continuidade do pesadelo temeroso-bolsonarista. E Lula passando pano no legado de Michel Temer, para não desagradar seus atuais "amigos de infância", mostra o quanto o projeto progressista do presidente brasileiro não passa de uma pálida máscara.

Quem está adorando o Lula no atual mandato é a burguesia enrustida que controla as narrativas e manipula o senso comum nas redes sociais, a ponto de promover o negacionismo factual, boicotando o senso crítico e as narrativas verídicas que destoam da agenda dominante da mídia empresarial.

Enquanto os riquinhos fantasiados de "gente simples" para obter lacração nas redes sociais e beber cerveja misturados com o povo estão adorando o atual mandato de Lula, o povo pobre da vida real se sente decepcionado e traído pelo presidente, pela falta de políticas sociais mais relevantes.

E imaginar que o plano de atentado tido como "pior do que o golpe de 1964" foi feito para impedir a posse de um governo mais moderado do que a primeira gestão parlamentarista do governo João Goulart, comandada por Tancredo Neves, por sinal o avô de Aécio Neves, um artifice do golpe de 2016.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

BRASIL TÓXICO

O Brasil vive um momento tóxico, em que uma elite relativamente flexível, a elite do bom atraso - na verdade, a mesma elite do atraso ressignificada para o contexto "democrático" atual - , se acha dona de tudo, seja do mundo, da verdade, do povo pobre, do bom senso, do futuro, da espécie humana e até do dinheiro público para financiar seus trabalhos e liberar suas granas pessoais para a diversão. Controlando as narrativas que têm que ser aceitas como a "verdade indiscutível", pouco importando os fatos e a realidade, essa elite brasileira que se acha "a espécie humana por excelência", a "classe social mais legal do planeta", se diz "defensora da liberdade e do humanismo" mas age como se fosse radicalmente contra isso. Embora essa elite, hoje, se acha "tão democrática" que pretende reeleger Lula, de preferência, por dez vezes seguidas, pouco importando as restrições previstas pela Constituição Federal, sob o pretexto de que some

A GAFE MUNDIAL DE GUILHERME FIÚZA

Há praticamente dez anos morreu Bussunda, um dos mais talentosos humoristas do país. Mas seu biógrafo, Guilherme Fiúza, passou a atrair as gargalhadas que antes eram dadas ao falecido membro do Casseta & Planeta. Fiúza é membro-fundador do Instituto Millenium, junto com Pedro Bial, Rodrigo Constantino, Gustavo Franco e companhia. Gustavo Franco, com sua pinta de falso nerd (a turma do "cervejão-ão-ão" iria adorar), é uma espécie de "padrinho" de Guilherme Fiúza. O valente Fiúza foi namorado da socialite Narcisa Tamborindeguy, que foi mulher de um empresário do grupo Gerdau, Caco Gerdau Johannpeter. Não por acaso, o grupo Gerdau patrocina o Instituto Millenium. Guilherme Fiúza escreveu um texto na sua coluna da revista Época em que lançou uma tese debiloide. A de que o New York Times é um jornal patrocinado pelo PT. Nossa, que imaginação possuem os reaças da nossa mídia, que põem seus cérebros a serviço de seus umbigos! Imagine, um jornal bas

POR QUE A GERAÇÃO NASCIDA NOS ANOS 1950 NO BRASIL É CONSIDERADA "PERDIDA"?

CRIANÇA NASCIDA NOS ANOS 1950 SE INTROMETENDO NA CONVERSA DOS PAIS. Lendo as notícias acerca do casal Bianca Rinaldi e Eduardo Menga, este com 70 anos, ou seja, nascido em 1954, e observando também os setentões com quem telefono no meu trabalho de telemarketing , meu atual emprego, fico refletindo sobre quem nasceu nos anos 1950 no Brasil. Da parte dos bem de vida, o empresário Eduardo Menga havia sido, há 20 anos, um daqueles "coroas" que apareciam na revista Caras junto a esposas lindas e mais jovens, a exemplo de outros como Almir Ghiaroni, Malcolm Montgomery, Walter Mundell e Roberto Justus. Eles eram os antigos "mauricinhos" dos anos 1970 que simbolizavam a "nata" dos que nasceram nos anos 1950 e que, nos tempos do "milagre brasileiro", eram instruídos a apenas correr atrás do "bom dinheiro", como a própria ditadura militar recomendava aos jovens da época: usar os estudos superiores apenas como meio de buscar um status profissional

ADORAÇÃO AO FUTEBOL É UM FENÔMENO CUJO MENOS BENEFICIADO É O TORCEDOR

Sabe-se que soa divertido, em muitos ambientes de trabalho, conversar sobre futebol, interagir até com o patrão, combinando um encontro em algum restaurante de rua ou algum bar bastante badalado para assistir a um dito "clássico" do futebol brasileiro durante a tarde de domingo. Sabe-se que isso agrega socialmente, distrai a população e o futebol se torna um assunto para se falar para quem vive de falta de assunto. Mas vamos combinar que o futebol, apesar desse clima de alegria, é um dos símbolos de paixões tóxicas que contaminam o Brasil, e cujo fanatismo supera até mesmo o fanatismo que já existe e se torna violento em países como Argentina, Inglaterra, França e Itália. Mesmo o Uruguai, que não costuma ter essa fama, contou com a "contribuição" violenta dos torcedores do Peñarol, que no Rio de Janeiro causaram confusão, vandalismo e saques, assustando os moradores. A toxicidade do futebol é tamanha que o esporte é uma verdadeira usina de super-ricos, com dirigente

A LUTA CONTRA A ESCALA 6X1

Devemos admitir que uma parcela das esquerdas identitárias, pelo menos da parte da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), se preocupa com as pautas trabalhistas, num contexto em que grande parte das chamadas "esquerdas médias" (nome que eu defino como esquerdismo mainstream ) passam pano no legado da "Ponte para o Futuro" de Michel Temer, restringindo a oposição ao golpe de 2016 a um derivado, o circo do "fascismo-pastelão" de Jair Bolsonaro. Os protestos contra a escala 6x1, que determina uma jornada de trabalho de seis dias por semana e um de descanso, ocorreram em várias capitais brasileiras, como Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador e Porto Alegre, e tiveram uma repercussão dividida, mesmo dentro das esquerdas e da direita moderada. Os protestos foram realizados pelo Movimento Vida Além do Trabalho (VAT). A escala 6x1, junto ao salário 100% comissionado de profissões como corretor de imóveis - que transformam a remuneração em algo tão

"BALADA": UMA GÍRIA CAFONA QUE NÃO ACEITA SUA TRANSITORIEDADE

A gíria "balada" é, de longe, a pior de todas que foram criadas na língua portuguesa e que tem a aberrante condição de ter seu próprio esquema de marketing . É a gíria da Faria Lima, da Jovem Pan, de Luciano Huck, mas se impõe como a gíria do Terceiro Reich. É uma gíria arrogante, que não aceita o caráter transitório e grupal das gírias. Uma gíria voltada à dance music , a jovens riquinhos da Zona Sul paulistana e confinada nos anos 1990. Uma gíria cafona, portanto, que já deveria ter caído em desuso há mais de 20 anos e que é falada quase que cuspindo na cara de outrem. Para piorar, é uma gíria ligada ao consumo de drogas, pois "balada" se refere a um rodízio de ecstasy, a droga alucinógena da virada dos anos 1980 para os 1990. Ecstasy é uma pílula, ou seja, é a tal "bala" na linguagem coloquial da "gente bonita" de Pinheiros e Jardins que frequentava as festas noturnas da Zona Sul de São Paulo.  A gíria "balada", originalmente, era o

DERROTA DAS ESQUERDAS É O GRITO DOS EXCLUÍDOS ABANDONADOS POR LULA

POPULAÇÃO DE RUA MOSTRA O LADO OBSCURO DO BRASIL QUE NÃO APARECE NA FESTA IDENTITÁRIA DO LULISMO. A derrota das esquerdas nas recentes eleições para prefeitos em todo o Brasil está sendo abastada pelas esquerdas médias, que agora tentam investir nos mesmos apelos de sempre, os "relatórios" que mostram supostos "recordes históricos" do governo Lula e, também, supostas pesquisas de opinião alegando 60% de aprovação do atual presidente da República. Por sorte, a burguesia de chinelos que apoia Lula tenta convencer, através de sua canastrice ideológica expressa nas redes sociais, de que, só porque tem dinheiro e conseguem lacrar na Internet, está sempre com a razão, e tudo que não corresponder à sua atrofiada visão de mundo não tem sentido. A realidade não importa, os fatos não têm valor, e a visão realista do cotidiano nas ruas vale muito menos do que as narrativas distorcidas compartilhadas nas redes sociais. Por isso, não faz sentido Lula ter 60% de aprovação conform

SAI O FALSO PROFETA, ENTRA O FALSO DRAMATURGO

Enquanto muitos se preocupam com pastores com camisas de colarinho e gravatas pedindo, aos berros, para que os fiéis ofereçam até seus eletrodomésticos para as igrejas neopentecostais, o perigo maior simplesmente não é sentido por conta do gosto de mel e do aparato de falsa humildade e suposta simplicidade. Nosso Brasil está atrasado, apesar de uma elite de abastados, tomada de profundo complexo de superioridade em níveis psicologicamente preocupantes, jurar de pés juntos que o país irá se tornar uma nação desenvolvida no final de 2026. Nem em sonhos e muito menos em nenhum esforço de transformar os mais dourados sonhos lulistas em realidade. Uma prova do atraso brasileiro é que há uma dificuldade em níveis preocupantes de compreender que o pior do obscurantismo religioso não se limita a extorsões da fé manipuladora nos meios de comunicação. E vamos combinar que, embora sejam verídicas das denúncias, o obscurantismo neopentecostal anda sendo superestimado como se nele encerrassem as ma

SOCIEDADE COMEÇA A SE PREOCUPAR COM A "SERVIDÃO DIGITAL" DOS ALUNOS

No último fim de semana, a professora e filósofa Marilena Chauí comparou o telefone celular a um objeto de servidão, fazendo um contundente comentário a respeito do vício das pessoas verem as redes sociais. Ela comparou a hiperconectividade a um mecanismo de controle, dentro de um processo perigoso de formação da subjetividade na era digital, marcada pela necessidade de "ser visto" pelos outros internautas, o que constantemente leva a frustrações que geram narcisismos, depressão e suicídios. A dependência do reconhecimento externo faz com que as redes sociais encontrem no Brasil um ambiente propício dessa servidão digital, que já ocorria desde os tempos do Orkut, em 2005, onde havia até mesmo os "tribunais de Internet", processos de humilhação de quem discorda do que "está na moda". Noto essa obsessão das pessoas em brincarem de serem famosas. Há uma paranoia de publicar coisas no Instagram. Eu tenho um perfil "clandestino" no Instagram, no qual

JOO TODDYNHO NOS LEMBRA QUE O "FUNK CARIOCA" É "IRMÃO" DE JAIR BOLSONARO

A postura direitista que a funqueira Jojo Toddynho assumiu, apoiando Jair Bolsonaro, esbanjando reacionarismo e tudo, pode causar grande surpresa e até decepção por parte daqueles que acreditam na ingênua, equivocada porém dominante ideia de que o "funk" é um movimento culturalmente progressista. Vendo que Jojo Toddynho, a one-hit wonder  brasileira do sucesso "Que Tiro é Esse?" - que, nos últimos momentos da "campanha contra o preconceito" da intelligentzia  do nosso país, chegou a ser comparada, tendenciosamente, com "Gaúcho (Corta-Jaca)", de Chiquinha Gonzaga - , tornou-se garota-propaganda da pavorosa rede de lojas Havan, as pessoas dormem tranquilas achando que a funqueira é uma "estranha no ninho", ao lado de nomes como Nego do Borel, Pepê e Nenem e o "divertido" Buchecha. E aí o pessoal vai acreditando na narrativa, carregada de muito coitadismo, de que o "funk" é ideologicamente "de esquerda", que o