De vez em quando, rola um papo, nos círculos esquerdistas, de que o jornalismo de papel acabou, que agora só haverá jornalismo digital, uma tese que leva ao exagero a valorização das mídias digitais e que sabemos adota uma retórica que agrada muito ao magnata George Soros, que se acha "o dono do mundo".
Nos seminários e nos próprios blogues, os progressistas, muitos deles bem intencionados e de ideias interessantes e coerentes, no entanto, caminham para uma atitude perigosa que é a de confundir a decadência das corporações midiáticas com a decadência da imprensa escrita, em si.
Alguns deles chegaram mesmo a criar uma contadição, em relação à crise midiática, acreditando que apenas TV e jornalismo impresso estariam decaindo, enquanto o rádio FM, como se observa nas mídias sociais, está passando por uma decadência ainda pior, embora muitos tentem acreditar justamente o contrário.
O que existe de crise é a das grandes corporações nacionais ou das oligarquias regionais. Só que a blogosfera progressista, tentando confundir as coisas, de forma bastante festiva comemora a morte do jornalismo de papel, como se rasgando jornais e revistas representasse o fim de um domínio oligárquico de décadas.
Isso é um engano gigantesco, e revela que, eventualmente, a blogosfera progressista comete erros constrangedores. Foi uma experiência traumatizante, por exemplo, a adesão das esquerdas a "alienígenas" como Paulo César Araújo (que mais parece ter saído dos almoxarifados de Veja) e Pedro Alexandre Sanches (o "filho da Folha" e discípulo de Francis Fukuyama) quando o assunto era cultura brasileira.
Essa adesão custou muito caro aos esquerdistas e abriu caminho para a réplica bem-sucedida de Rachel Sheherazade, Rodrigo Constantino e Lobão, já que, graças a Araújo e Sanches, as esquerdas cometeram gafes como ver conteúdo marxista em letra de axé-music ou em endeusar Waldick Soriano, que era tão reacionário quanto Lobão, e até mais retrógrado do que o roqueiro carioca.
Isso corrompeu de certa forma os debates sobre cultura brasileira que hoje até a MPB autêntica está estéril, perdida em tributos a si mesma. Mas, também, a opinião pública reagiu, Sanches e Araújo deixaram de ser "divindades intelectuais" e não são mais "santificados" na busca do Google, pois já existem textos que contextam seus pontos de vista em prol da bregalização do país.
E o que restou da intelectualidade "bacana"? Depois de tentar uma delirante etnografia sobre Mr. Catra, restou a ela encher a cara e fazer "deitaço" com a Bebícia... quer dizer, Letícia Sabatella. Sem forçar a barra para ser "de esquerda", o discurso dos "bacaninhas" ficou sendo "não ser de esquerda nem de direita", mas o engraçado que é a mesma desculpa citada por Rodrigo Constantino e seus afins.
Mas eles se consolam deixando seu vírus na mídia esquerdista, que acha que, morrendo o papel, morrem as oligarquias midiáticas. Nem em sonhos. A "pena de morte" para o papel não incrimina os barões da grande mídia, mas sim a invenção do coitado do Johannes Gutenberg, o verdadeiro sentenciado da festejada ameaça.
Tá, mas vão dizer que há as impressoras dos computadores pessoais. Só que, infelizmente, do jeito que estão os modismos tecnocráticos, nem a Internet anda muito substancial, porque as pessoas já nem usam muito computador quanto há dez anos atrás, e agora brincam de caminhar com os dedos em tabletes e celulares e só se dispõem a ler mensagens curtas nas mídias digitais.
Enquanto isso, os barões da grande mídia caem na gargalhada quando as esquerdas falam na "morte do papel". "Então a culpa não é totalmente nossa, rá rá rá!", dirão. A "profecia" da "morte do papel" deve fazer Reinaldo Azevedo cair da cadeira de tanto rir, porque, em parte, ele é inocentado do crime de despotismo midiático. A culpa acaba sendo a do papel. Vamos matar o papel.
Se os barões da grande mídia vão encontrar no caminho uma blogosfera oposicionista forte, nem por isso deve ser motivo para festa. Isso se explica porque muitos dos blogues progressistas são feitos de graça, e outros sob apoio do Governo Federal e suas autarquias. Mas a mídia dominante é sustentada pelas grandes indústrias e até por empresas estrangeiras.
Entre os cachorros, há uma espécie de tamanho pequeno e aparência dócil chamada chiuaua, que no entanto é temperamental e ladra e morde. No entanto, não há como comparar com a espécie rottweiler, sem falar do pitbull. Os chiuauas da blogosfera de esquerda andam confiantes demais na sua mordida, subestimando a agressividade dos pitbulls da grande mídia.
Os esquerdistas ficam comemorando a "morte do papel", como se o coronelismo midiático morresse definitivamente com isso. Não. A mídia reacionária tem todo o arsenal de Internet, seus blogueiros específicos, sua sofisticada estrutura digital, seus portais etc. Não há como escapar disso.
Talvez a mídia esquerdista tenha que pensar duas vezes antes de achar que, morrendo a imprensa escrita, morrerá o coronelismo midiático. É preciso reconhecer que os barões da mídia continuam ricos, e eles têm todos os recursos e os meios de adquirir outros para reciclar seus métodos e meios de dominação. A mídia direitista já mostrou que pode trocar os anéis para preservar seus dedos.
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