A guerra híbrida, que é uma nova modalidade de combate que envolve mecanismos de dominação política, econômica e cultural, tem um episódio pouco falado pelas esquerdas.
Foi a campanha que a intelectualidade orgânica do poder midiático, que eu chamo de "intelectualidade 'bacana'" pelo apelo festivo que ela se apresentava, teve pela bregalização do país.
A campanha, que durou entre a crise do segundo governo Fernando Henrique Cardoso e os primeiros momentos do governo Michel Temer, algo em torno de 2000 e 2016, usava a falácia do "combate ao preconceito".
As alegações eram conhecidas: "cultura das periferias", "expressão do povo pobre", "popular demais" e outros jargões trazidos sobretudo por críticos culturais, acadêmicos e cineastas documentaristas.
Sabemos que é um IPES-IBAD pós-tropicalista, ou melhor, um Instituto Millenium com chapéu de fruteira, embora esses intelectuais tenham atuado na trincheira oposta, a das esquerdas, como inimigos internos se fazendo de aliados.
Coincidiu demais que toda essa campanha tenha sido feita no momento de desgaste do sociólogo-presidente, padrinho dessa intelligentzia festiva, e se encerrou praticamente quando o governo Temer já esnobava a fraca campanha do "Fora Temer".
Usou-se o "brega de raiz" no qual criou-se até uma teoria conspiratória: a de que, mesmo despolitizados, os ídolos cafonas (que, na verdade, eram pessoas bem conservadoras) representavam uma "ameaça" à ditadura militar.
Virou uma narrativa binária, trazida por Paulo César de Araújo em Eu Não Sou Cachorro Não: assim que foi decretado o AI-5, os ídolos bregas fizeram uma "rebelião" na cultura brasileira.
Seria muito fácil se isso fosse verdade. Mas não era. E, além disso, as rádios que mais tocavam música brega eram as que pertenciam a oligarquias regionais e apoiaram, com gosto, a ditadura militar.
As rádios popularescas, controladas por aliados do coronelismo de suas regiões, "desapareciam" do discurso da intelectualidade "bacana" que falava apenas em "corajosos programadores de rádio" que "desafiavam o bom gosto elitista".
Tudo muito falso. O que se viu foi o processo de ampliação da imbecilização cultural, crucial para enfraquecer as forças progressistas e permitir o golpe político que derrubou o PT.
E o "funk", com seus "cabos anselmos" pós-modernos, bajulando as esquerdas fingindo um "sincero apoio", em troca de ampliação de mercados. Depois de conseguirem o desejado, apunhalavam as esquerdas pelas costas e festejavam suas conquistas junto com os barões da grande mídia.
A gente viu os efeitos virem depois.
A mídia impressa de esquerda sofreu baixas: Caros Amigos e Fórum, a primeira se extinguindo e a segunda, se limitando à Internet.
As classes populares, diante da propaganda intelectual do "popular demais", fugiu do ativismo social porque o entretenimento brega era definido, por esse discurso "contra o preconceito", como "já sendo um ativismo".
E aí as esquerdas ficaram esvaziadas, enquanto se formava uma base de intelectuais reacionários.
E, aí, desmontou-se, aos poucos, o Ministério da Cultura e a Lei Rouanet.
Já se escreveu a respeito disso, só faltando às esquerdas apresentarem uma visão autocrítica a respeito dessas armadilhas intelectualoides nas quais caíram.
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