Quando falamos que existe "sociedade do espetáculo" no Brasil, o pessoal não acredita.
Aqui no Brasil, o cenário é muito "bonzinho".
Oficialmente, não temos overdose de informação, como se o blablablá das FMs "informativas" não representasse uma sobrecarga pesada de informações, notícias e opiniões.
Neste sentido, também não temos "bombardeio de amor", como se os religiosos daqui, incluindo os tais "médiuns espíritas", não manipulassem os incautos com seu traiçoeiro e constrangedor culto à personalidade.
Também não temos, com base nesta hipótese, "comercialismo cultural", como se até mesmo os mercantilistas Michael Sullivan, Chitãozinho & Xororó e É O Tchan fossem o suprassumo do "vanguardismo alternativo", mesmo sendo comerciais até a medula.
Até o termo bullying não encontrou tradução oficial em português (apesar de eu propor "valentonismo", mas não tenho o poder de Luciano Huck de popularizar gírias como "balada" - ©Jovem Pan).
Embora seja uma prática antiga no Brasil, o termo inglês para a humilhação contra os oprimidos faz muita gente crer que o fenômeno foi inventado em Colorado, nos EUA.
Afinal, o Brasil é visto como um "paraíso", no qual equivalentes a Umberto Eco, Jean Baudrillard e Pierre Bourdieu não têm a menor chance de serem aprovados para fazer pós-graduação, que aqui é um reduto de acadêmicos passadores de pano, verdadeiros flanelinhas intelectuais.
Dito isso, vemos um "mundo de sonho e felicidade" nas redes sociais brasileiras, bem além da conta.
A situação está confusa e arriscada, temos uma ameaça séria de golpe, a necropolítica extermina indígenas, negros, mulheres (pelo feminicídio), camponeses e sem-teto e o que vemos é gente fazendo pose de meditação diante do brilho do Sol numa praia, em fotos do Instagram.
Temos gente brincando de tudo. Atores brincando de serem jornalistas fazendo lives como dublês de entrevistadores de convidados da moda. Gente brincando de "intelectual" com frasezinha moral ou motivacional, mesmo que seja a positividade tóxica da Teologia do Sofrimento.
Temos pessoas felizes demais para o momento trágico de hoje, sob um culturalismo desastroso que na prática desmente toda a baboseira de jornalistas culturais isentões, sempre passando pano na mediocridade reinante.
A cultura no Brasil virou um gigantesco mercadão megastore, com ofertas de tudo de todas as coisas, mas mesmo assim o cenário cultural de hoje não pode ser considerado próspero.
A "prosperidade" solipsista de algumas "bolhas culturais" que consomem MPB autêntica, rock, jazz e blues não reflete a boa fase cultural, porque são apenas pequenos feudos curtindo algo que só eles conhecem.
E não dá para passar pano em funqueiros, piseiros, sofrentes e outros popularescos de hoje e de ontem - sobretudo o brega-vintage de Gretchens, Sullivans, Chitões, Molejos e Tchans - , porque a mediocridade deles é de saltar nos olhos e machucar os ouvidos.
Dito isso, vemos que não há situação favorável para as esquerdas hoje.
E elas, iludidas por esse "astral maravilhoso" que toma conta das redes sociais, acham que Lula está dominando tudo e todos.
As esquerdas acham que o sorriso vai combater o bolsonarismo e intimidar os bolsonaristas armados.
Há um clima de "já ganhou" nas esquerdas e elas chegam mesmo a ficarem arrogantes, confusas e de certa maneira desinformadas.
Querem um "primeiro turno" com cara de "segundo", achando que só terá Lula e Bolsonaro na primeira fase da campanha presidencial, enquanto os demais candidatos não passam de vaquinhas de enfeite em presépios natalinos.
As esquerdas se esquecem que o primeiro turno terá vários candidatos e Bolsonaro tende a fugir do debate, como em 2018, e paralelamente virar atração de algum canal bolsonarista lançado à margem do debate presidencial.
Além disso, Lula não está "governando paralelamente" nem fazendo um "processo de transião democrática". Lamentavelmente, já estão acreditando que Lula está arrumando as malas para viver, com sua Janja, no Palácio da Alvorada, e a corrida presidencial nem começou.
E o pior disso tudo é que são as esquerdas, que preferem ficar em casa produzindo memes e tuítes ou tricotando entre si do que se manifestar todo dia em protestos de rua, que querem "segurar" Bolsonaro até 2022.
Isso é um vergonhoso erro estratégico. De fazer qualquer pessoa com um pingo de lucidez ficar constrangida a ponto de deslizar sua mão pelo rosto.
Em vez de protestarem de verdade, derrubarem Bolsonaro e conviver com o governo insosso do general Mourão ou, talvez, do hoje presidente da Câmara Arthur Lira, o que seria menos arriscado para o país, preferem se isolar na memecracia, achando que isso vai derrubar Bolsonaro.
Crentes no triunfalismo cego, as esquerdas pensam que Bolsonaro se enfraquece e creem que irão pegá-lo cambaleante para a surra final da campanha presidencial do próximo ano.
Há, entre as esquerdas deslumbradas, quem acredite que o próprio Bolsonaro é que vai ser derrubado por si mesmo.
Grande engano.
Bolsonaro se fortalece, seus seguidores estão sendo estimulados a andar armados, e até um risco de atentado contra Lula é uma hipótese plausível, podendo ser um ato mais ostensivo do que aquele que matou John Kennedy, em 1963.
"Segurar" Bolsonaro para 2022 não é uma boa estratégia, porque o presidente está ganhando tempo, se articula com impressionante rapidez e não se limita às ações digitais nas redes sociais.
Apesar da fama de presidente-tuiteiro, Bolsonaro está agindo mais fora das "bolhas digitais" do que as esquerdas, que ficaram ensimesmadas.
Sim, Bolsonaro está sendo mais estratégico do que Lula, que se deixou levar por aquele factoide do "saradão", das coxas exibidas vestindo-se de sunga.
As esquerdas ainda por cima surfam nas pautas de Bolsonaro, que certa vez chamou de idiota o cidadão que se preocupa com o fejião em vez do fuzil.
O grande problema é que as esquerdas em geral se acham todas humoristas, nesse contexto em que, nas redes sociais, todos se acham filósofos, jornalistas, intelectuais. Mas ativismo, que é bom, só o do sofá.
De que adianta vídeos de protestos indígenas recentes viralizarem no Instagram, com suposta solidariedade de famosos, se ninguém faz o mesmo que eles, indo para a rua, mesmo sob o risco de repressão policial?
Jair Bolsonaro cresce, o antipetismo renasceu com força, e as esquerdas com seu triunfalismo de contos de fadas, transformadas em esquerdas "chapeuzinho vermelho".
O Brasil está piorando e quem deveria lutar nas ruas por um país melhor fica na zona de conforto de sua casa produzindo tuítes e memes. E ainda acham que os sorrisos das esquerdas identitárias irão desarmar os fuzis, revólveres e metralhadoras da horda bolsonarista.
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