Não é com lacração que as esquerdas irão combater o bolsonarismo.
Não é com os brinquedos "culturais" da centro-direita que as esquerdas tomaram erroneamente como seus e se ferraram com isso.
Nada da tal da "espiritualidade" que só serve para pessoas que já estão bem de vida ficarem com as mentes nas nuvens, promovendo a "paz sem voz" com os oprimidos ficando calados, para não perturbar a felicidade dos privilegiados.
Nada do "funk" que nunca foi esquerdista, só se passando por tal em nome de verbas estatais, para enriquecer seus empresários já cheios do dinheiro da iniciativa privada e, em certos casos, do crime organizado.
Nada do futebol como suposta resistência esquerdista, porque se trata só de um lazer, embora seja, infelizmente, supervalorizado como entretenimento esportivo.
Nada de surfar com pautas bolsonaristas, porque fica mais parecendo brincadeira de gato e rato de desenhos animados, sem qualquer efeito combativo contra o "sistema" extremo-direitista.
O que se deve fazer é ação, é furar a bolha pelo lado certo, e não pelo lado errado. A ideia não é acolher um retrógrado de braços abertos, supostamente arrependido e entusiasmado além da conta ao falar com as forças esquerdistas.
Também não é acolher oportunistas de toda espécie, de Eduardo Paes a Mário Kertèsz, a usarem as esquerdas como trampolim para seus arrivismos.
Devemos sair da bolha, sim. Dialogar com gente que até foi golpista é possível, desde que vejamos os contextos e as intenções.
Geralmente o melhor apoiador, dos antigos opositores, é aquele que não vem muito efusivo, prometendo pagar uma rodada de cerveja para as esquerdas, ou dramatizar demais para parecer o "sincerão".
O antigo desafeto que deseja ser amigo dos esquerdistas é aquele que vem com simplicidade, conteúdo de ideias, coragem de ação e autocrítica. E devemos ver o contexto para ver se não existem manobras por trás.
Quanto à ação, temos bons exemplos de gente positivamente engajada para combater os danos do bolsonarismo.
Temos o economista Eduardo Moreira, disposto a democratizar os ensinamentos de Economia prática para os cidadãos comuns se prevenirem aos prejuízos causados pelos governos golpistas pós-2016.
Com linguagem acessível e cursos baratos cujo lucro, em boa parte, irá para projetos sociais - incluindo educação gratuita para pessoas carentes - , Eduardo Moreira também destoa daquela Economia feita para favorecer o mercado financeiro, substituindo o interesse privado pelo interesse público.
Temos Luíza Trajano, da rede de lojas Magazine Luíza, que passou a adotar uma outra postura empresarial e criou um programa de trainée apenas para pessoas negras.
É um bom começo, e não deve ser entendido como racismo reverso, mas como uma oportunidade para dar emprego aos negros, que durante séculos tiveram sempre portas e janelas fechadas em sua vida.
A Magazine Luíza contribui para desfazer essa tragédia histórica, ao dar esse espaço para negros se ascenderem no mercado de trabalho.
Temos o padre Júlio Lancelotti, que faz um trabalho de Assistência Social com uma comunidade de sem-teto em São Paulo, uma caridade de verdade, não aquela que blinda um dito "médium espírita" que havia sido dublê de filantropo à maneira de Luciano Huck.
É uma caridade cujo declarado benfeitor não busca protagonismo, porque ajuda, de fato, os necessitados, e isso é que está irritando os burgueses reacionários, geralmente muito calmos diante da "filantropia de fachada" dos que ajudam menos e se promovem mais.
Lancelotti acompanha os mais necessitados e busca ajudá-los de maneiras diversas, seguindo o aprendizado da Teologia da Libertação.
E temos o ex-presidente Lula que criou um Plano de Reconstrução do Brasil, que reverte os malefícios causados pelos governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Não é um programa eleitoral nem rigorosamente um plano de governo, mas um roteiro de propostas e ideias a serem debatidos pela sociedade.
O livro tem 210 páginas e fez Lula se tornar um diferencial, diante de um Jair Bolsonaro mentiroso no vergonhoso discurso da ONU.
Não podemos ainda comemorar com essas ações, porque elas são apenas o começo da luta e precisam ser acompanhadas de exemplos similares. Não é momento para festa, mas de apoio a essas iniciativas com o mesmo espírito de luta no qual elas são feitas.
Elas são apenas quatro ações, e podem ser postas a perder se não houver o apoio necessário e, também, a sua multiplicação em outros exemplos.
O bolsonarismo continua no poder, deixando a Covid-19 matar brasileiros e a Amazônia e o Pantanal serem devorados pelas chamas.
E Paulo Guedes fez o milagre de fazer o banqueiro Joseph Safra estar no topo dos brasileiros ricos da Forbes.
Por isso, nada de ter clima de festa só porque alguns bons samaritanos fazem sua parte. É preciso que os exemplos de Luíza Tranajo, Eduardo Moreira, Júlio Lancelotti e Lula sejam ampliados por mais pessoas e alcancem um número ainda maior de brasileiros.
Seria melhor que as pessoas agissem mais e lacrassem menos, tendo mais prudência, trabalho e ação. Furando a bolha pelo lado certo e jogando fora os brinquedos da centro-direita que nada fez fortalecer as forças progressistas.
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