CHICO BUARQUE (NO ALTO, COM DILMA ROUSSEFF), WADIH DAMOUS (NAS DUAS FOTOS) E PAULO PIMENTA (COM WADIH E LULA, ACIMA), ATACADOS POR SUPOSTOS ESQUERDISTAS EM BUSCA DE PROTAGONISMO.
Vendo os vídeos do Leonardo Stoppa sobre o Duplo Expresso, posso inferir que o Farofafá é uma espécie de "Duplo Expresso" da crítica musical.
Ou seja, a atuação de Pedro Alexandre Sanches e Eduardo Nunomura no Farofafá não havia sido muito diferente das de Wellington Calazans e Romulus Maia no Duplo Expresso.
O Duplo Expresso produz matérias sensacionalistas, prometendo apresentar farta documentação sobre determinados escândalos políticos, mas não consegue apresentar material convincente.
O Farofafá foi a trincheira usada pela intelectualidade "bacana", pela elite dos "intelectuais mais legais do Brasil" para vender a bregalização cultural como o "novo folclore brasileiro".
A ideia, não declarada verbalmente, mas explícita nos atos, era de tentar fazer do jabaculê musical popularesco dos últimos 55 anos o "folclore etnográfico de amanhã".
Assim como o sensacionalismo denuncista dos "duploexpressivos", a "provocatividade" dos "farofafeiros" buscava forjar um pretenso apoio a Lula e Dilma Rousseff, enquanto desmoralizava importantes apoiadores dos dois ex-presidentes.
Duplo Expresso desqualificava Paulo Pimenta e Wadih Damous, segundo Stoppa resultante de um provável ciúme de Calazans com o primeiro, só porque não compareceu a uma entrevista para o Duplo Expresso numa circunstância muito importante.
O Farofafá teve como alvo Chico Buarque, chamado por Sanches de "coronel da Fazenda Modelo", numa irônica alusão ao primeiro romance escrito pelo compositor.
Chico Buarque era esculhambado por ser um ícone da MPB "dos festivais", de herança cepecista-bossanovista, que conquistou o mainstream.
Sanches e outros "sacerdotes" da intelligentzia brasileira, como Paulo César de Araújo, Hermano Vianna e até "véio da Havan" pós-tropicalista Eugênio Raggi, não suportavam a liderança de uma música brasileira de boa qualidade em detrimento da bregalização que dominava a mídia.
Usando um discurso que, sem discernir o joio do trigo, comparava a bregalização de hoje à discriminação (realmente injusta) que os ritmos populares do passado sofreram, esses intelectuais "bacanas" são descritos no meu livro Esses Intelectuais Pertinentes... com maiores detalhes.
A retórica do "combate ao preconceito", analisada neste livro, era só uma desculpa para ampliar reservas de mercado para os fenômenos popularescos e desmobilizar o povo pobre, forçando a opinião pública a crer que um mero e inofensivo entretenimento popularesco já era "ativismo".
Hoje o Duplo Expresso segue sua rotina de pautas, sem produzir muito impacto, e o Farofafá opera no "modo Jotabê Medeiros" pois, apesar de Sanches ser o líder da empreitada, percebe-se que Jotabê, mais profissional e menos panfletário, está tomando a parada.
Ou seja, Jotabê Medeiros virou o "cérebro" do Farofafá, atuando no portal como Roberto Pompeu de Toledo atuava nos tempos cavernosos da revista Veja.
Atualmente, o Farofafá virou mais um mausoléu dos descolados que veem a MPB de vanguarda perder seus mestres nas últimas décadas: Miriam Batucada, Itamar Assumpção, Zé Rodrix, Belchior, Walter Franco, Moraes Moreira, Sérgio Ricardo, entre outros.
O Farofafá virou, assim, o porta-voz do que os Galãs Feios (excelente canal dos jornalistas Marco Bezzi e Helder Maldonado) chamam de santaceciliers e eu traduzo como "santacecilieiros", que são os descolados que frequentam os espaços culturais da Rua Santa Cecília, na capital paulista.
Embora com suas diferenças e especialidades, Duplo Expresso e Farofafá queriam obter protagonismo nos setores hoje viciados das esquerdas brasileiras.
Setores voltados para o entretenimento ou para o sensacionalismo, seja explorando factoides em escândalos da direita neoliberal, seja atuando com "brinquedos culturais" da centro-direita, no âmbito da religião, da música, do comportamento, dos esportes.
Ultimamente, estamos vivendo a supremacia do que o ideário marxista chama de "pequena burguesia" nas esquerdas brasileiras.
Pautas de entretenimento, como os casos que envolveram animais, como emas e cobras naja, bem ao gosto do fait divers (factoides, principal ingrediente da "sociedade do espetáculo"), viraram a prioridade das esquerdas espetacularizadas.
E aí vimos que o Duplo Expresso e o Farofafá adotaram a mesma estratégia: a do driving out, algo como "condução para fora", supostamente apoiando as lideranças de esquerda, mas desqualificando adeptos que atuam contra os golpes políticos contra as forças progressistas.
No âmbito da bregalização cultural, abre-se uns parênteses pelo fato de que Valesca Popozuda ter enviado uma mensagem para Romulus Maia elogiando uma pauta identitária. O Duplo Expresso chegou ao conhecimento de uma funqueira de que forma?
A atuação de Pedro Alexandre Sanches, que chegava ao ponto de exaltar ídolos musicais promovidos pela Rede Globo (neoliberal) e SBT (hoje bolsonarista), contribuiu para o golpe político de 2016.
Isso é tão certo que seu discurso pró-brega, se trouxe alguma novidade, só serviu para isso: abrir o microfone para as réplicas de gente neoconservadora como Rodrigo Constantino e Diogo Mainardi.
Isso se deu por um motivo: forçava-se a associação da bregalização (a "cultura popular" financiada pelo coronelismo midiático) e seu mito da "periferia legal" à agenda das esquerdas.
Aí elas cairiam no ridículo, porque intelectuais de baixa expressão que apenas odiavam o PT e estavam sem ter o que dizer, receberam a verdadeira pauta por trás de todas as pregações "sagradas" da "santíssima trindade" de Sanches-Araújo-Vianna e seu clero de intelectuais.
Aí veio um Rodrigo Constantino da vida, elitista até a medula, mas que montou um discurso em prol da "verdadeira cultura popular", reprovando a idiotização cultural da bregalização, que havia sido artificialmente associada ao esquerdismo.
Bingo. Vieram então os ideólogos que, de maneira contraditória, pediram a privatização das estatais, a derrubada de Dilma Rousseff e a prisão de Lula, mas se empenhavam em dizer que "o povo mereceria ser respeitado culturalmente".
E isso criava um estranho maniqueísmo: a intelectualidade pró-brega, supostamente esquerdista, e a intelectualidade neocon anti-brega, faziam a sua maneira de se passarem por "amigas do povo", a primeira associada a um "petismo viciado", a outra, a um "coxismo convencido".
No fundo foram dois lados de uma mesma moeda de confundir a opinião pública, permitir que a "indústria cultural" ludibriasse as classes populares e, aí, criar as condições para o golpe político de 2016.
E isso com o driving out que fez o Duplo Expresso atrair um público bolsonarista através da ênfase nos ataques a gente como Paulo Pimenta e Wadih Damous, dois dos maiores combatentes contra o golpe de 2016.
No caso do Farofafá, o driving out significava destruir um elo das forças progressistas, o Chico Buarque que não só era um artista ligado a Lula e Dilma Rousseff, como era um apoiador dos sambas dos morros e das manifestações populares.
O "coronel da Fazenda Modelo" esteve presente em importantes abaixo-assinados das forças progressistas. Pedro Sanches, o "bom esquerdista", em nenhum deles ousou assinar uma vírgula.
Chico Buarque também era o elo de um Brasil grandioso que as elites intelectuais não queriam ver de volta: o desenvolvimento cultural, a melhoria da Educação, a música brasileira de qualidade, o fortalecimento das classes pobres através de uma cultura musical robusta e atuante.
Por isso é que a campanha da intelectualidade pró-brega foi para evitar o que aconteceu nos primórdios da ditadura militar: a resposta da MPB contra as ameaças de golpe ou de endurecimento da repressão. No caso de 2002-2014, era a ameaça de consolidação do petismo.
Daí que intelectuais pró-brega vieram como lobos vestidos em pele de ovelha negra anti-liberalismo. Criaram um canto de sereia que iludiu as esquerdas e abriu caminho para a derrubada de Dilma Rousseff.
Tudo isso temperado pelo "baile funk" da Quinta Coluna de Rômulo Costa, que nunca foi esquerdista, é um dos homens mais ricos do Rio de Janeiro e é vinculado ao baixo clero da direita política fluminense.
O dono da Furacão 2000 atuou como um Cabo Anselmo da ocasião (17 de abril de 2016, dia da votação que inaugurou o impeachment de Dilma), como um diversionista que iludiu as esquerdas num momento de grave crise política.
Dois textos comprovam que o "esquerdismo sincero" de Rômulo Costa não passou de cascata: um sobre seu envolvimento com políticos golpistas, outro pelo fato de que ele era sogro de golpista na época do "baile funk (supostamente) contra o impeachment".
Rômulo Costa, que apadrinhou Luciano Huck como "maior divulgador do funk do Brasil", também foi prestigiar o lançamento de um livro de um ex-jornalista da Rede Globo ligado ao governo Michel Temer.
Até agora reina um silêncio das esquerdas a respeito desses fatos. Será necessário que outras gerações de esquerdistas tenham a coragem que as atuais não têm, porque a fábrica de "Cabos Anselmos" continua produzindo, e mais do que em 1963-1964.
Duplo Expresso e Farofafá não conseguiram o desejado protagonismo nas esquerdas. Mas deixaram como legado um grande estrago nas mentes esquerdistas, incapazes de derrubar Bolsonaro e de reverter todo o espólio do golpe político de quatro anos atrás.
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