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LULA 3.0 JÁ PRIORIZA A CLASSE MÉDIA, ACIMA DE TUDO

LULA EM PRONUNCIAMENTO NATALINO DE 2023.

Quem está bem de vida e possui um prestígio social de tal forma que se acha sempre o possuidor da visão mais coerente da realidade, não percebe o pensamento desejoso que o cega diante das complexas mudanças dos rumos dessa realidade.

Digo isso porque, sendo eu jornalista, tenho que contestar porque prefiro a realidade dolorosa do que a fantasia que conforta. Fantasia que conforta só é "realidade" para quem tem medo de ver sua estabilidade da vida burguesa ser ameaçada, daí a rejeição ao senso crítico, à contestação, ao questionamento.

Dentro da bolha lulista, a classe média anda idealizando demais o Lula. Se não conseguem creditá-lo como o "antigo sindicalista de sempre", procuram ao menos manter sobre seu imaginário a figura do antigo líder progressista, que fez um governo promissor, embora moderadíssimo, nos dois mandatos de 2003 a 2010.

O atual mandato mostrou um Lula muito estranho. Desde a campanha presidencial, Lula cometeu erros diversos que cobraram a conta de uma vitória apertada, pois Lula se encana eventualmente de abrir mão de seus princípios para obter vantagens políticas. Os lulistas chamam isso de "estratégia", a realidade chama isso de "erros bastante arriscados".

Lula preferiu, na campanha, ouvir mais os seus divergentes do que os convergentes, como um galo de briga se aliando com as raposas acreditando que vai garantir a democracia do galinheiro. A direita moderada, seja ela com que nome, "frente ampla" ou Centrão, fizeram Lula morder a isca da governabilidade e, por sorte, o presidente brasileiro consegue contornar impasses.

Os adeptos de Lula estão entre boa parte dos que usam constantemente as redes sociais da Internet. Claro, é a pequena burguesia que consome as redes digitais, e, por isso, visões mais críticas ao lulismo, mas que não percorrem o perímetro bolsonarista ou coisa parecida, têm dificuldade para repercutirem. 

Para os lulistas, o Brasil tem que ser o reino da fantasia, pois, como Lula anunciou no discurso do Natal de ontem, o nosso país tem que viver 2024 "no tamanho dos nossos sonhos". A realidade dos miseráveis extremos que não seguem o protótipo da "família pobre feliz" das campanhas de Lula, não muito diferentes dos "pobres" de Vai Que Cola, Ó Paí Ó e similares, não tem importância.

Lula quer unir os brasileiros como se fossem "um só povo", mas na prática a festa lulista exclui os personagens que não pertencem ao espetáculo festivo-hedonista da elite do bom atraso. Os excluídos da festa lulista que não vivem de consumismo pleno, não curtem a música popularesca e não veem a pobreza como "coisa linda de se ver" (mas não de viver na própria carne, é claro), estão fora.

Tudo em torno de Lula tem que ser no reino da fantasia pois, como dito acima, se não for para preservar totalmente a imagem do líder sindical que mal sobrevive em retratos impressos nas camisetas do PT, se contentando em conservar a do "experiente líder progressista" das últimas duas décadas.

Isso inclui teses como a de que Lula "prioriza os pobres" em seu governo. Infelizmente, não vemos isso. Em 2003, projetos como Bolsa Família, cotas universitárias, Minha Casa, Minha Vida e outros eram pontos de partida para medidas futuras e diferentes. Hoje essas propostas não fazem sentido, tendo que ser substituídas por medidas mais audaciosas e desafiadoras. O padrão de salário mínimo dos mandatos anteriores é insuficiente para a emancipação real do povo pobre.

Lulistas imaginam que o presidente brasileiro "precisa olhar para a classe média". Se esquecem os adeptos do petista que ele já governa para a classe média. Aliás, Lula, na prática, somente governa para a classe média, dentro dos critérios de Jessé Souza, definida por este como a "elite do atraso" e que eu, tomando emprestado o termo, adapto para a "elite do bom atraso", a antiga elite golpista que, repaginada, agora representa "tudo de bom".

Na verdade, a classe média não se enxerga como tal. Só porque ouve "funk" e toma cerveja em birosca, a "boa" sociedade, descendente de escravocratas e golpistas, a classe média se acha "pobre". E os lulistas vivem com suas zonas de conforto conceituais, que acham que o que já foi permanece sendo, mesmo quando deixou de ser, e, por isso, acham que Lula continua fiel ao esquerdismo. Mas não está.

Lula governa, na verdade, para uma "frente ampla social" que envolve um padrão de velha ordem social que vem desde o "milagre brasileiro" dos tempos do general Ernesto Geisel. Vai do pobre obediente e domesticado até o ricaço mais festivo. É uma sociedade padronizada que cultua de "médiuns" a funqueiros, que vê o pobre autêntico (ausente no "funk", nas comédias de cinema e TV e da propaganda lulista) como um animal a ser domesticado. Um "gado" supostamente democrático, mas culturalmente precarizado.

Vejo nas ruas das diversas cidades a pobreza crescente, enquanto os mais prósperos experimentam uma ascensão social vertiginosa que faz com que até os relativamente pobres de outrora virem super-ricos com apetite igual ou até maior do que muitos magnatas. 

A única conquista real do governo Lula é a normalidade institucional, ver que as instituições podem prestar serviços com alguma dignidade e transparência. Mas, fora isso, o que se vê em Lula 3.0 é um governo neoliberal com toques assistencialistas, apenas um pálido arremedo do que foram os mandatos anteriores, o que faz de Lula um anão, diante de uma figura de grandeza que foi Getúlio Vargas.

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