É triste ver esse país medíocre como o Brasil mergulhar numa obsessão cega em não só permanecer nessa mediocridade, como ter o atrevimento de arriscar a impô-la como "um exemplo e um modelo de civilização para o resto do mundo".
Mais triste ainda é que, para muitos se darem bem na vida, é necessário ter algum "arrivista de estimação", apoiar algum calhorda, algum canalha, algum canastrão que possa usar a pessoa necessitada como um trampolim e, em troca, dar alguma vantagem para essa pessoa em busca de algum lugar ao Sol.
Dias atrás escrevi um artigo sobre minha decisão de abrir mão da fama e do prestígio fáceis como jornalista da Rádio Metrópole de Salvador, emissora cujas origens remetem a um esquema de corrupção vergonhoso, um desvio de verbas públicas que o "astro-rei" da rádio, o empresário baiano Mário Kertèsz, montou para formar sua fortuna pessoal e seu patrimônio midiático.
Envergonhado com a corrupção e em respeito ao povo baiano, eu recusei duas sugestões para trabalhar na rádio. Elas estão detalhadas no meu novo livro JORNALISMO EM CRISE, recém-lançado. Eram pretensas oportunidades que nem merecem ser chamadas por este nome, porque não são oportunidades, são apenas facilitações, pois oportunas é o que elas não são.
Recentemente eu pensei como eu iria me ascender, como astro da grande mídia, como repórter poderoso, depois editor-chefe. Quantas mansões eu compraria, quantos carros, quantas ações em empresas! Quantas namoradas, quanto cartaz! Abri mão de tudo isso, porque eu sou um dos poucos a manter princípios.
Não confio no pragmatismo de primeiro aderir, apoiando ou participando diretamente, a um arrivista de ocasião, um sujeito que sempre investe numa atitude desonesta ou inconveniente, para depois bancar o certinho. O arrivista banca o certinho não porque se arrependeu do erro primário que o fez "chegar lá". Pelo contrário, o arrivista finge que se ascendeu de forma honesta e sempre afirma ter orgulho de ter conquistado os benefícios que alcançou.
Infelizmente temos uma cultura de que, para podermos nos dar bem na vida, precisamos ter algum arrivista de estimação. Isso é passar pano na desonestidade, na falta de caráter, e é muito mais animalesco do que humanista, se bem que há espécies animais mais humanistas que os próprios humanos.
Fico muito triste em ver que isso prevalece e que abrir mão dessa atitude inconveniente traz desvantagens na vida, porque o "legal" é aproveitar a mão aberta de um arrivista que busca uma pessoa especial para servir de trampolim. Porque o arrivista é um medíocre que obtém um privilégio de maneira desonesta, mas para se sustentar precisa estar associado a alguém de personalidade mais diferenciada a trazer vantagens pessoais ao desonesto que "chegou lá".
Este é um dos inúmeros legados da ditadura militar e da longa linhagem da elite do bom atraso e seu viralatismo cultural enrustido (que em termos oficiais só é atribuído ao lavajatismo e ao bolsonarismo, mas o viralatismo envolve também muitas "coisas boas da vida").
Claro que eu quero ter dinheiro, trabalhar para pagar minhas contas, ou ganhar de vez em quando a sorte grande para reforçar minhas finanças e pagar contas e outras pendências. Mas não quero estar à mercê de depender de alguém desonesto para obter benefícios e vantagens e nem eu sou aquele que "quer demais" na vida, como as outras pessoas que ganham a sorte grande e não têm ideia de como gastar o opulento dinheiro a não ser por coisas supérfluas.
O nosso Brasil continua desigual e, creio, está mais desigual do que nos tempos do bolsonarismo. Não é que o bolsonarismo prestasse, mas hoje a "sociedade do amor" está mais atrevidamente egoísta, querendo demais para si, consumindo cervejas, cigarros, viagens supérfluas, colecionando televisores e automóveis e transformando seus apartamentos em canis particulares. Gastando dinheiro alto comprando muita comida cujos 75% a 80% dos pratos adquiridos vão para o lixo, com a "boa" sociedade estufando o peito achando que "não é obrigada a comer toda a comida".
Este cenário é muito vergonhoso. Estou triste e desesperado. Mas tenho princípios de dignidade suficientes para recusar a depender de um arrivista para me dar bem na vida. Um dia a situação se reverte e eu obtenho uma oportunidade autêntica para subir na vida. Enquanto isso, aqueles que querem demais e ganham fácil demais sem necessidade vão ver o dinheiro gasto à toa descer pelo ralo e serão estas pessoas a chorar no ombro de um arrivista para ver se não entram em falência. A não ser que gananciosos e arrivistas estejam naufragando num abraço de afogados.
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