O que poderia ser a manifestação de grandeza do gigante Lula, o leão valente cujo rugido ecoa em todo o mundo visando salvar a humanidade planetária, tornou-se um grande fiasco. O debate da Band de ontem só demonstrou o quanto o Lula que se construiu nos últimos meses, como o ursinho de pelúcia dos neoliberais, foi um grande erro estratégico e a imagem heroica do petista se dissolveu como pó.
O que se nota é que o grande erro de Lula (PT-SP) foi se recusar a debater com outros candidatos. O que derrubou a reputação e o desempenho do petista no debate da Band foi sua preocupação e seu único preparo em apenas enfrentar Jair Bolsonaro (PL-RJ), seu maior rival na campanha presidencial.
Os erros de Lula em renegar a Terceira Via, em se considerar o "candidato único", só funcionaram quando o ex-presidente, sozinho, foi sabatinado no Jornal Nacional. Mas quando Lula teve que enfrentar não só Bolsonaro como também os outros concorrentes, soube-se que o mito do "leão gigante cujo grito ecoa em todo o mundo" não passou de conversa para boi dormir.
Até mesmo o Datafolha - que as esquerdas médias, a julgar por dados de supostas pesquisas eleitorais, estavam perto de apelidar de "Datalula" - teve que reconhecer que Simone Tebet, a "grande perdedora" da corrida presidencial, se saiu bem no debate da TV Bandeirantes, realizado aqui em São Paulo, por estar mais equilibrada e apresentando ideias.
No debate, Lula, como renegou a Terceira Via, só estava preparado para enfrentar Jair Bolsonaro, e se limitou a trocar acusações com o extremo-direitista. Quando o assunto era corrupção, Lula, que não é de dar satisfações nem de prestar contas com a sociedade quanto aos erros cometidos, se limitou a dizer que criou medidas de combate à corrupção.
No entanto, Lula, que cometeu exageros quanto a certos dados, de acordo com a Agência Lupa - Lula alega ter permitido o ingresso de 8,5 milhões de brasileiros nas universidades e 22 milhões no emprego formal, quando os números, em todo seu mandato, foram de 6,3 milhões e 15,3 milhões, respectivamente - , errou ao dizer que criou a lei contra a lavagem de dinheiro.
Por incrível que pareça, essa lei, contra a lavagem financeira, a Lei 9.613, de março de 1998, foi sancionada por Fernando Henrique Cardoso, dentro daquela máxima "Faça o que eu digo, mas não o que eu faço", pois foi nessa época que o presidente tucano e companhia - inclui-se o hoje "esquerdista" Geraldo Alckmin - abusaram da festa da Privataria Tucana, vendendo empresas com títulos podres e arrecadando dinheiro para alimentar contas em paraísos fiscais no exterior.
Aliás, Lula também repetiu sua ladainha, na conclusão do debate, enfatizando demais sua aparente parceria com Alckmin, sob a desculpa de estar unindo as experiências dos dois políticos. Isso soa muito estranho, principalmente porque Lula tem a imagem de grande líder, mas hoje se comporta mais como se fosse um cabo eleitoral do ex-governador de São Paulo do que do grande líder esquerdista da América Latina.
E isso já faz Lula encolher. O gigante Lula encolheu, virou o Tattoo do Sr. Hoarke Alckmin na Ilha da Fantasia petista. Com a influência de Alckmin, Lula já renunciou a muitos pontos preciosos de seu projeto político, e terá que improvisar, dentro dos limites do neoliberalismo ortodoxo, para trazer alguma prosperidade para o povo brasileiro, sem mexer nos privilégios rentistas dos novos amiguinhos do petista. É a fórmula do "dar aos pobres sem tirar dos ricos".
Por sorte, Lula não se saiu como o pior candidato. Pior mesmo foi Jair Bolsonaro, grosseiro, arrogante e irritado como sempre. Além de disparar, contra Lula, os famigerados clichês do discurso antipetista, Bolsonaro mostrou-se também um machista agressivo, ao reagir a uma pergunta da jornalista Vera Magalhães, da TV Cultura - parceira da Band na transmissão do evento - , sobre o descaso do presidente com a vacina anti-Covid. Sem responder a pergunta, Bolsonaro veio com ironia:
"Vera, eu não podia esperar outra coisa de você... Eu acho que você dorme pensando em mim, você tem alguma paixão por mim... Você não pode tomar partido num debate como esse, fazer acusações mentirosas a meu respeito... Você é uma vergonha para o jornalismo brasileiro!".
Simone Tebet foi manifestar solidariedade a Vera e recebeu de Bolsonaro um comentário ríspido: "Eu não pedi sua opinião". A emedebista se mostrou mais exemplar nas respostas e é injusto que ela, assim como Ciro Gomes (PDT-CE), estejam em baixa nas (supostas) pesquisas eleitorais. Um segundo turno com os dois seria mais equilibrado e saudável para o povo brasileiro, sem o sensacionalismo polarizado dos dois favoritos.
Uma amostra do equilíbrio de Simone está em respostas correspondentes à pandemia, primeiro, respondendo à pergunta da concorrente Soraya Thronicke (da União Brasil do Mato Grosso do Sul) sobre se a emedebista iria fortalecer o Sistema Único de Saúde (SUS) e como esta avalia o desprezo de Bolsonaro com a pandemia:
"Nós acabamos de sair de uma pandemia - se é que saímos dela -, que poderia ter sido muito melhor gerida se nós tivéssemos um presidente da República sensível à dor alheia. Mas, lamentavelmente, no momento em que o Brasil mais precisou do presidente da República, ele virou as costas para as famílias enlutadas brasileiras [...] atraso de 45 dias na compra de vacinas".
Em seguida, Tebet falou:
"Quantas mães perderam os filhos? E quanto filhos perderam os pais? Eu não vi o presidente da República pegar a moto dele e entrar em um hospital para dar um abraço em uma mãe que perdeu um filho. Eu vi mais do que isso, eu vi um escândalo de corrupção na compra de vacinas com se a vida pudesse custar US$ 1. Não foi o 'Fique em casa', se nós tivéssemos um governo federal, a pandemia poderia ter sido muito melhor conduzida".
Soraya Thronicke e Ciro Gomes tiveram atuações regulares, enquanto a atuação de Luiz Felipe d'Ávila do Partido Novo de São Paulo, empresário considerado o presidencial mais rico, com patrimônio declarado de R$ 24,6 milhões, foi mais apagada.
Fora esse debate, o que se viu nos bastidores foi um sério incidente envolvendo o ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro - Ricardo Salles, que chegou a ser secretário particular de Geraldo Alckmin no governo de São Paulo - e André Janones, ex-presidenciável pelo partido Avante por Minas Gerais e agora apoiador de Lula. Seguranças teriam sido chamados antes que a briga resultasse em agressões físicas.
No fim, o que se viu foi Jair Bolsonaro cada vez mais decadente, embora tenhamos muito cuidado porque o presidente é habilidoso em passar por cima de incidentes negativos. O que se vê é um clima de quase luto nas esquerdas médias, que pensaram que Lula iria se engrandecer e o viram ter um desempenho medíocre, pela sua má vontade em enfrentar a Terceira Via e similares.
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