LULA NO COMÍCIO REALIZADO NO VALE DO ANHANGABAÚ, NO ÚLTIMO SÁBADO, 20 DE AGOSTO DE 2022.
Desconfio do tal "Movimento pela Democracia" não por eu não ser democrata, mas por isso ser um artifício para Lula retomar o poder se aliando com seus opositores, inclusive os maiores responsáveis pelo golpe político de 2016.
Estou lendo A Privataria Tucana e fico constrangido ao ver que os antigos apóstolos do Estado Mínimo se aliando com Lula sob a desculpa da "democracia" e do "diálogo". E não vai ser para esses privatistas assistirem, sorridentes e passivos, ao petista fortalecer o Estado, mesmo que seja pelo argumento de "reaquecer a economia".
Não deu certo a encenação do comício que lançou oficialmente a chapa presidencial de Lula e Geraldo Alckmin e a campanha de Fernando Haddad para o Governo do Estado de São Paulo, prometendo sepultar o Tucanistão abraçado ao próprio tucanato. E tudo isso com a participação até de Aloísio Nunes, tucano de alto gabarito que atuou, com gosto, no governo de Michel Temer.
O comício soou como uma miniatura do Movimento Diretas Já no mesmo Vale do Anhangabaú - que agora conheço pessoalmente e posso visitar sempre que possível - , evento ocorrido em 1984. Isso porque não há contexto para um movimento dessa envergadura, mesmo levando-se em conta que o governo Jair Bolsonaro é realmente ameaçador.
Esse Movimento pela Democracia me cheira a algo midiático, a um evento produzido pelo empresariado que quer parecer bonzinho na sociedade. E se essa iniciativa já tem um sabor artificial de democracia, imagine o protagonismo artificial das esquerdas através de uma campanha de Lula cheia de erros e contradições?
O comício no Vale do Anhangabaú teve menos gente que o esperado. Aparentemente, foi por causa do frio, mas a verdade é que Lula não está empolgando como o desejado. Ele até fez por onde afastar boatos de que ele está doente - seu envelhecimento está acelerado - ou que ele tenha tido relações estremecidas com Dilma Rousseff e foi acusado de "escondê-la".
No primeiro caso, Lula teve que retomar o discurso de líder popular que o consagrou, com ataques enérgicos a Bolsonaro. Mas a grande mídia divulgou que o próprio PT, nos bastidores, se preocupa com a voz de Lula, que tem dificuldade de articular certas frases. No segundo caso, pintaram rumores de que Dilma ficou magoada em ver Lula se aliando com golpistas e escolhido Geraldo Alckmin como vice de chapa. Aparentemente, Lula e Dilma afastaram esses rumores, trocando elogios entusiasmados.
Alckmin, por sua vez, se manteve como um canastrão político. Em dado momento, mencionando a presença de Aloísio Nunes, o vice da chapa petista, Geraldo usou a "democracia" através de seus clichês discursivos:
"Estávamos há 40 anos do mesmo lado, do lado da democracia, do lado do povo. Hoje, quase 40 anos depois, voltamos aqui porque o Brasil precisa, a democracia está em risco, nós precisamos fortalecer o processo democrático".
Uma coisa chama a atenção. Por que não se fazem grandes manifestações em Brasília? É para evitar enfrentar os bolsonaristas? O movimento Fora Bolsonaro teve como local central São Paulo. O Movimento pela Democracia, idem. A crise do Rio de Janeiro já faz São Paulo, a capital econômica do Brasil, herdar da outra cidade o status de capital cultural. Já o medo de enfrentar bolsonaristas faz com que São Paulo tenha seu papel de capital sociopolítica.
Voltando a Lula, ele defendeu as religiões e disse que elas "não têm partido" e deveriam "cuidar das pessoas e não dos candidatos". Lula criou canais nas redes sociais para atrair apoio de evangélicos. Lula é religioso e no entanto surfa nas pautas do também religioso Jair Bolsonaro, que deve estar rindo da cara dos petistas que pegam carona no seu cardápio temático.
As esquerdas mostram um protagonismo artificial, num contexto em que o golpe de 2016 foi um fato recente, o que, em termos históricos, foi ainda há pouco. E Lula está cometendo muitos erros. E mais uma vez ele esperou que o evento no Anhangabaú fosse um gigantesco evento histórico, mas ele acabou sendo fraco, apenas com uma presença razoável de pessoas. É o preço de um Lula domesticado pela direita moderada, que, fora da bolha de esquerda, ainda continua sendo hostilizado por antipetistas.
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