Meu ceticismo em relação a Lula pode fazer parecer, aos olhos dos desavisados, que eu virei um reacionário, um conservador ou um ressentido. Grande engano. Me considero de esquerda, mais do que muito lulista de carteirinha, mais do que muito petista de fraldas que fica esnobando opositores nas redes sociais. Só que sou mais realista e cético.
Diante da realidade distópica e complexa em que vivemos, o Brasil não está pronto para um governo de esquerda. Loucura minha? Não. É porque o golpe político de 2016 ainda está fresquinho e seus protagonistas agora tentam virar a casaca, posando de "amigos do peito" de Lula, botando a culpa do golpismo apenas a um bando de coadjuvantes ou protagonistas de menor expressão (tipo Sérgio Moro, Deltan Dallagnol e Eduardo Cunha).
Lula está caindo em muitas armadilhas e se entregou a elas a ponto de seu esquerdismo tão festejado e até hoje alardeado não passar mais, hoje, de uma pálida lembrança de um passado que não volta mais. O petista hoje virou um serviçal dos neoliberais, e graças a isso ele transformou sua pré-campanha e agora campanha numa infinita coleção de contradições e erros preocupantes.
Só que, por outro lado, Lula está gostando do jogo. Ele se divide em distribuir discursos diferentes para o público mais popular e outro mais elitista. E ele se perde em contradições, pois, enquanto, diante das elites, ele procura parecer um candidato "moderado", para o povo ele vira um arremedo do antigo líder sindical que não existe mais. Discursos "radicais" e "moderados" se alternam, e Lula causou várias controvérsias e incômodos, que não raro geraram reprimendas até do PT.
Recentemente, em reunião com representantes de todos os partidos de sua chapa, Lula, ao propor a taxação das grandes fortunas - ponto delicado e difícil, se considerarmos os aliados neoliberais do petista - , errou ao dizer que "vai reformular o teto de gastos". Isso tem o sentido condescendente igual ao de "rever" a reforma trabalhista.
Ou seja, não haverá ruptura. Segundo a nota da Folha de São Paulo, há setores dentro do lulismo que defendem a manutenção de teto de gastos para determinadas áreas. E Lula está propondo alternativas de obter recursos públicos e privados, que, ao lado de outros temas, dependerão de aprovação das instâncias partidárias. Por trás disso, infere-se o uso das tais "parcerias público-privadas" que irão relativizar a atuação do Estado, que Lula promete "fortalecer".
O problema é a taxação das grandes fortunas num país marcado pela isenção abusiva de impostos para as elites. Será que realmente esses impostos serão cobrados? Muito do que Lula promete, e ele promete demais para um contexto distópico como o Brasil de hoje, soa mais estratégia de campanha e é certo que nem tudo será cumprido, até pelas pressões de aliados do "centro". Lula não vai frustrar estes aliados cobrando dinheiro das elites. O risco delas romperem com o petista é grande, e daí para um golpe é um pulo.
Fico observando as contradições de Lula, fazendo clima de festa para "reconstruir" o Brasil, se aliando com forças divergentes e se perdendo entre manter ou não manter suas propostas progressistas. Será que Lula está enganando o povo brasileiro? Seu vice Geraldo Alckmin irá aceitar calado e benevolente a implantação de agendas das quais ele não aprova, como o fortalecimento do Estado, o cancelamento das privatizações e a cobrança de impostos aos mais ricos?
Tudo parece bom, tudo parece um sonho. Para o petista de fraldas que usa muito as redes sociais, tudo parece natural, afinal, para quem é desinformado, contradição é sinônimo de equilíbrio. Esse público engole fácil um Lula que se alia com neoliberais e, ao mesmo tempo, promete manter as pautas de esquerda. Só que a realidade é mais complexa e difícil, e Lula irá pagar muito caro pela frente ampla demais que construiu, sem se preocupar com a afinidade de ideias.
É muito fácil falar em "democracia" para juntar forças divergentes e, na teoria, dialogar é muito fácil. Lula acha que basta falar a palavra mágica "tem que pensar no povo brasileiro, que sofre fome e está sem emprego" para os neoliberais cederem de suas exigências e demandas, mas eles não estão aí para altruísmo. Por isso o meu ceticismo em relação a Lula, porque as pressões contra ele, vindas de dentro dos novos aliados, poderá ser bastante intensa e danosa para o país.
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