Cínico como sempre, Jair Bolsonaro permitiu a venda, às escondidas, da estatal de energia elétrica Eletrobras, na noite de anteontem. Com uma negociação que contou com a participação de representantes dos bancos BTG Pactual, XP Investimentos, Itaú, Safra e outros, ocorrida na Bolsa de Valores de São Paulo, a Eletrobras foi vendida num valor de R$ 33,7 milhões e um valor fixo de ação de R$ 42.
Por ironia, o valor da venda total é quase o mesmo da quantidade de miseráveis famintos no Brasil, 33 milhões, segundo dados da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), divulgados num seminário sobre insegurança alimentar.
A Eletrobras é a primeira das três estatais que tiveram a proposta de privatização divulgada por Bolsonaro. As próximas são a Petrobras e os Correios. E a venda da estatal elétrica pode trazer problemas como a restrição do fornecimento de energia elétrica para lugares considerados rentáveis e o aumento das tarifas de consumo de energia.
Nas regiões mais distantes do país, o povo que se vire com o lampião a gás. Os chamados "espíritas", por sua vez, nem precisam se preocupar, uma vez que eles já se consideram "portadores de luz" e sua religião é abençoada por Jair Bolsonaro - que circula na Internet com foto (não é montagem) com o tal livro da "Pátria do Evangelho", que o "médium de peruca" lançou usando falsamente o nome de Humberto de Campos - , que instituiu o "dia do espiritismo" para 18 de abril, data em que, em 1857, foi lançado O Livro dos Espíritos de Allan Kardec, muito bajulado e quase nunca estudado por aqui.
Portanto, os "kardecistas" sem Kardec, contaminados com os fios da peruca de seu "médium" querido, não precisam de energia elétrica, até porque, nas trevas, eles têm mais é que ficar em silêncio na prece, como recomenda esta religião medieval, esse Catolicismo medieval de botox. E muitos falam que o tal "médium" reuniu, numa só pessoa, o reacionarismo de Jair Bolsonaro, a esperteza de Aécio Neves e o pseudo-altruísmo para turista ver de Luciano Huck, que nunca conseguiu fazer o Triângulo Mineiro a tão sonhada Escandinávia brasileira.
E falando em Triângulo Mineiro, Lula estará nessa região de Minas Gerais que é reduto estadual do bolsonarismo - lá existe o poder coronelista dos fazendeiros de gado zebu e do agronegócio, cujo parlamentar associado, Franco Cartafina, jogou o "médium de peruca" na lista de Heróis da Pátria, emporcalhando o "livro de aço" que já é uma "casa da Mãe Joana" do heroísmo pátrio.
No próximo dia 15, Lula participará de um ato público, às 17 horas em Uberlândia, ao lado do pré-candidato ao governo de Minas Gerais, Alexandre Kalil, do PSD. Será um evento rápido, já que, embora não haja uma divulgação oficial a respeito, o Triângulo Mineiro é uma das regiões de Minas Gerais onde o apoio a Jair Bolsonaro continua firme e forte.
E quanto à Eletrobras? Lula promete que irá desprivatizar a Eletrobras. Garante que fará isso, de fato. Só que o problema é que Lula tem ao seu lado aliados que divergem de seu projeto político e não vão aceitar passivos as ousadias do petista. Eles apoiam Lula mediante certas condições, mais afinados pelo desejo de derrubar Jair Bolsonaro do que de promover o desenvolvimento socioeconômico no país.
Lula dificilmente irá desprivatizar a Eletrobras. O que ele diz pode ser uma posição pessoal, mas tem o efeito de uma mera promessa de campanha que não será cumprida. Afinal, Lula também não vai poder comprar ações da empresa privatizada, porque o preço a ser imposto para a aquisição será muito caro. E é provável que Lula tenha que manter o teto de gastos, apenas reformulando para torná-lo "flexível" e "menos rígido" aos olhos do mercado.
O presidenciável até ensaiou uma aparente autocrítica, ao falar para uma rádio de Minas Gerais, a respeito de seu pedido de desculpas pelos eventuais erros cometidos em seus dois governos, entre 2003 e 2010:
"Nós temos que pedir desculpas ao povo por ter errado. Nós temos que tentar corrigir aquilo que nós não fizemos de correto. Isso não é vergonhoso. A palavra 'desculpa' só é feita por gente grande, com dignidade, moral e caráter. Pessoas pequenas, gente medíocre não têm coragem de utilizar a palavra 'desculpa'".
Ele acrescentou:
"Como eu sei que o PT fez muita coisa boa na cidade que ele governou, o PT precisa voltar a ser grande. E, para ser grande, a gente precisa conversar com o povo. A gente precisa voltar à porta de fábrica, voltar à porta de comércio, porta de loja. A gente tem que voltar na rua, na periferia. Para conversar com o povo. É assim que se faz um partido, se constrói uma vitória, se governa. E, quando ganhar, não se distanciar do povo. Quando ganhar, voltar para governar junto ao povo".
Embora bem intencionado em tais declarações, será que Lula, na maneira que conduz sua campanha e sua pré-campanha, se aliando com forças divergentes ao mesmo tempo em que desqualifica a Terceira Via, atropelando a competitividade eleitoral, passará a acertar mais?
A resposta é não. Lula se amarra nas alianças neoliberais e certamente terá dificuldades de implantar projetos progressistas. Ele promete mil coisas, mas com as forças divergentes ao seu lado, ele renunciará a boa parte de suas propostas, permanecendo apenas nos limites sociais de seus projetos de grife: Bolsa Família, Mais Médicos, Minha Casa, Minha Vida, Fome Zero e outros de sua marca.
Lula não vai reestatizar o que foi privatizado, porque vários especialistas afirmam que isso é complicado e poderá trazer o caos jurídico e político-econômico. Também não vai taxar os ricos, porque eles são em parte aliados do petista. E tende também a não revogar a reforma trabalhista nem o teto de gastos, apenas retomando direitos trabalhistas e investimentos públicos nos limites que seus aliados de "centro" permitirão.
O que restará a Lula, numa perspectiva de que a parte técnica de seu governo ficará nas mãos de Geraldo Alckmin, é negociar com as empresas privadas a implantação de projetos de cunho social - como algum equivalente ao antigo Luz Para Todos - , mediante garantias de abatimento fiscal ou convencendo as companhias de que projetos sociais favorecem a imagem publicitária dessas instituições.
O que se sabe é que Lula encontrará mais obstáculos para seu projeto progressista do que ele mesmo pode imaginar. E terá que renunciar a boa parte desse projeto, como preço estabelecido pelos seus aliados de "centro". Lula terá que se contentar em combater a fome e o desemprego, entre outros problemas sociais crônicos, nos limites permitidos pelo neoliberalismo.
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