GUSTTAVO LIMA EM APRESENTAÇÃO AO VIVO.
Tinha que haver um vínculo com o bolsonarismo, combinado com o esquema de verbas para espetáculos que desvia recursos da Educação e Saúde públicas para os ídolos "sertanejos", para que uma parcela da música popularesca caísse em descrédito.
O episódio de Gusttavo Lima, que recebeu verbas de diversas prefeituras para suas apresentações ao vivo, é apenas a ponta do aicebergue que ainda vai pegar outras tendências brega-popularescas. Os escândalos, que atingem praticamente todo o chamado "sertanejo universitário" (que de universitário só tem o nome), apontam para aquilo que eu já descrevia em 2009: que os "sertanejos universitários" eram patrocinados pelas elites do agronegócio.
Naquela época, considerar assim era visto como piada. Visto como "novidade", o "sertanejo universitário" tinha defensores ferrenhos. Não se podia criticar um Victor & Leo. Ou mesmo um João Bosco & Vinícius, nome artístico tendenciosamente usado para confundir com ícones da MPB, de forma que eu fazia piada, dizendo que, daqui a pouco, teríamos "Renato Russo & Cazuza", "Raul Seixas & Marceleza", "Ivan Lins & Gonzaguinha", "Gilberto Gil & Caetano" e outros neste gênero de "caubóis de parque de diversões", todos sósias de Caio Castro, Malvino Salvador e similares.
Nem mesmo Zezé di Camargo & Luciano, que já foram blindados pelas esquerdas médias - esperta, a dupla botou seus votos para Ronaldo Caiado debaixo do tapete, enquanto se passavam por pretensos apoiadores de Lula - , são hoje poupados e os esquerdistas mainstream, que chegaram a exaltar o filme Os Dois Filhos de Francisco, do já falecido Breno Silveira, como um primor de humanismo, hoje classificam a trama como um suprassumo da meritocracia.
De certa forma, o breganejo, a grande categoria que engloba esse "agropop" que só fala de bebedeira, noitadas e traições amorosas, tornou-se um mercado tão fechado que a MPB e o Rock Brasil eram proibidos de se apresentarem no interior do país, a não ser que negociassem um dueto com algum ídolo "sertanejo".
Negócios assim serviram de propaganda enganosa, na qual o ídolo "sertanejo", com seu coitadismo, fosse tratado como "vítima de preconceito", supostamente "conquistando um lugar nobre na música brasileira" ao realizar um dueto com um nome emepebista ou um roqueiro brasileiro.
Só que esse mercado foi longe demais. Enquanto os "sertanejos" fechavam as porteiras de seus latifúndios culturais no interior do país, as portas das capitais litorâneas se escancaravam para eles. O Baixo Gávea, a Barra da Tijuca e o Recreio dos Bandeirantes se renderam à invasão dos caubóis de carrão utilitário.
Chegou-se ao ponto de Niterói ter um cantor de "sertanejo universitário", João Gabriel. Também, a outrora cosmopolita Niterói, que hoje não investe em construir avenida própria ligando Várzea das Moças (a RJ-106 continua na função humilhante de "avenida de bairro") e Rio do Ouro e mantém parquiletes horrendos nas ruas, sucumbiu ao provincianismo mais rasteiro.
E isso faz com que até os outros estilos popularescos, como a axé-music, o "pagode romântico" e o "funk", considerados "urbanos", se sintam prejudicados pelo "sertanejo" e "forró eletrônico" que dominam regiões mais interioranas. Subprodutos do mercado da axé-music, o "arrocha" e a "pisadinha" tiveram que se projetar nacionalmente como franquias, respectivamente, do "sertanejo universitário" e do "forró eletrônico".
O bolsonarismo dos "sertanejos", dos "sofrentes" e dos "piseiros" - num contexto que apenas exclui da vidraça breganeja nomes como a falecida Marília Mendonça e os tucanos Chitãozinho & Xororó - fez com que as esquerdas médias se aproveitassem e reagissem tanto para afastar a concorrência num mercado de música popularesca que cresce sem parar - é o preço do "combate ao preconceito" (ver Esses Intelectuais Pertinentes...) - , como uma espécie de câncer cultural.
No entanto, isso é apenas a ponta do aicebergue. A axé-music, o "pagode romântico" e o "funk", que agora simbolizam um estado de espírito destoado quase sempre do bolsonarismo e similares - descontando o apoiador do atual presidente, Netinho, e "coxinhas" como Cláudia Leitte, Durval Lélis e Bell Marques - , querem obter o protagonismo musical, tirando o "sertanejo" que hoje simboliza a farra das motociatas, dos passeios de jet-ski, das festas da Havan e das vaquejadas e dos rodeios.
Só que, com o tempo, se verá o quanto a mediocridade musical popularesca revelará mais escândalos, mesmo fora da sombra de Bolsonaro, transformando o antigo "combate ao preconceito" que expandiu os fenômenos popularescos para novas e maiores reservas de mercado, num exemplo de apoio vergonhoso por parte daqueles que se julgavam "esclarecidos", como intelectuais, jornalistas, cineastas e outros setores da chamada opinião pública.
É o mesmo mercado jabazeiro, pouco importando o jogo-de-cena que faz os funqueiros se passarem por "esquerdistas" para obter generosas fatias das verbas de incentivo à cultura. E se eu já alertava, em 2009, que o "sertanejo universitário" era vinculado ao agronegócio, com exclusividade também noticiei o envolvimento oculto do DJ Rômulo Costa e do presidente da Liga do Funk, Bruno Ramos, como colaboradores "quinta-colunistas" do golpe político de 2016. Acho bom o pessoal correr para adquirir Esses Intelectuais Pertinentes....
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