Tendo completado 90 anos de idade no último dia 12, o apresentador Sílvio Santos, com todo seu conservadorismo, presenteou as esquerdas dando-lhes boa parte dos "brinquedos culturais".
Outros "brinquedos" foram dadoas pela Rede Globo, Folha de São Paulo, revista Caras e por aí vai.
Mas não foi diretamente.
Foi por intermédio de uma geração de intelectuais "provocativos" que, de alguma forma ligados à mídia hegemônica, "invadiram" as esquerdas para fazer seu proselitismo pró-brega.
Ao lado deles, havia também "espiritualistas" de plantão e boêmios amigos de uma rodada de cerveja.
E aí, tivemos os tais brinquedos.
Funqueiros, "médiuns espíritas", mulheres-objetos, ídolos cafonas do passado, jogadores de futebol milionários, todo esse elenco da centro-direita, que parece ter surgido na novela das nove da Rede Globo.
Todos também eram de alguma forma blindados pelo SBT. O "médium" foi eleito numa votação do público do SBT, em 2012, como "o maior brasileiro de todos os tempos".
Nesse mesmo ano, deixei o tal "espiritismo kardecista" (que, na prática, trai Allan Kardec milhões de vezes mais do que Judas traiu Jesus), me livrando de um terrível fardo, de um pesadelo religioso.
As promessas dos "brinquedos culturais" eram as mais diversas.
Promessas de "paz mundial" do "médium" das obras psicografake, promessas de empoderamento feminista da mulher-objeto, promessas de que o "funk" é o folclore etnográfico pós-tropicalista do futuro, e os ricos jogadores de futebol ainda vinham com bola no gol.
Promessas em muitos casos abstratas, em outros falsas.
Nada que representasse a verdadeira justiça social. Mesmo o "kardecismo" exaltado e paparicado pelas esquerdas é, na verdade, o velho e reacionário Catolicismo medieval de botox, que promete apenas a "paz sem voz" de sofredores resignados e algozes abusivos.
E ainda há os ídolos cafonas do passado, como um Odair José que descobri fazer bubblegum de fazer os Archies parecerem o Steppenwolf, prometendo "revolução socialista" com canções de amor.
Assim como o "funk", que sempre escondeu um pano de fundo conservador - sempre viveu de rigor estético nivelado por baixo, com a precarização da concepção e expressão musicais - , mas forjou um discurso pretensamente libertário, que enganou muita gente boa.
E vemos as esquerdas caindo na armadilha. Antes de Luciano Huck, outro apoiador entusiasmado desses "brinquedos culturais", os próprios "brinquedos" já simbolizavam uma direita "limpinha", que muitos acreditavam ser "centro" e até mesmo "centro-esquerda".
E ao adotar esses "brinquedos", as esquerdas deram poder à mídia hegemônica. A Globo, a Folha, o SBT, gente que vai de Rodrigo Constantino a Sílvio Santos.
E aí vemos o quanto Sílvio Santos, nos anos 1970, popularizou o brega, do contrário da "subversão" que Paulo César de Araújo, na sua obra de fake news, Eu Não Sou Cachorro Não, inventou, com uma "revolta popular" surgida do "nada" através do sucesso dos ídolos cafonas.
Não era bem assim. As rádios que tocavam música brega nos anos 1970 eram as que apoiaram a ditadura militar, não o contrário.
Não colou essa ideia de que, automaticamente, assim que veio o AI-5 o brega surgiu para combatê-lo. Isso não existe, a tese soa simplória e maniqueísta. Pura teoria conspiratória, com cheiro de fake news.
A verdade é que a bregalização musical cresceu por causa do coronelismo midiático regional e pelos veículos da mídia hegemônica apoiadores da ditadura, mesmo a falida TV Tupi.
E boa parte da responsabilidade vem do apresentador e empresário Señor Abravanel, o Sílvio Santos que um dia foi locutor do serviço de rádio das barcas da Baía da Guanabara (Rio de Janeiro, Niterói e Paquetá).
Foi ele que ajudou a propagar, com maior intensidade, o "popular demais" do qual as esquerdas foram passar pano durante anos, sob influência de intelectuais infiltrados nas forças progressistas durante os governos Lula e Dilma Rousseff.
E as esquerdas insistiram em tomar como seus os "brinquedos culturais", só porque eles supostamente seguem princípios identitários considerados agradáveis para as forças progressistas.
Mordendo a isca, as esquerdas deixaram o golpe acontecer, porque os "brinquedos" expressam o poder da mídia conservadora que é dona desses valores supostamente universais.
E as esquerdas ainda não largaram esses "brinquedos". Apenas deixaram guardados no armário, até que se permita uma nova brincadeira que deixe as esquerdas felizes, enquanto um direitista moderado passa a perna e toma o poder no Planalto Central.
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