É assustador o modo como as elites reacionárias atuam para se empoderarem.
E, entre tantos absurdos, agora temos um "Movimento Anti-População de Rua".
Sim, é isso mesmo que você está lendo. Um movimento pedindo para que as autoridades expulsem os sem-teto das ruas das cidades, como neste caso a de São Paulo.
É um movimento higienista, feito por pessoas de classe média (segundo critérios de classificação de Jessé Souza) e que contou com o apoio de parlamentares do PSL e Republicanos.
A ideia é fazer o recolhimento compulsório, imposto, sem diálogo com os sem-teto que crescem nas ruas das cidades.
Nos últimos tempos, eu via sem-teto aumentarem tanto em Niterói e Rio de Janeiro quanto aqui em São Paulo.
Via sem-tetos alojados na Rua Américo Oberlaender, em Icaraí, onde morei e onde fiz os primeiros anos deste blogue, além de todo o Mingau de Aço e parte de O Kylocyclo.
Via sem-tetos andando pela hoje Rua Ator Paulo Gustavo, em Icaraí. Na Av. Ernâni do Amaral Peixoto, acumulam-se pessoas nessa dramática condição não só nos fins de semana e feriados, mas em dias de semana, mesmo, e durante o dia!
No entorno da Igreja da Candelária, no Centro do Rio de Janeiro, um monte de sem-teto se alojou na calçada da esquina da Rua Primeiro de Março.
E em São Paulo? O Centro Velho está cheio deles, e pude ver indo pela Av. São João e o entorno da Praça da República. E sob as pontes em vários locais da capital paulista. E tem uma família vivendo ao lado de uma banca de jornais na Praça Delegado Amoroso, na Casa Verde.
E aí se vê a hipocrisia dos "cidadãos de bem" que, de maneira surreal, reclamam do "direito à cidade".
Os sem-teto não estão nas ruas porque gostam. Eles estão ali porque não têm onde morar.
Além disso, é necessário um diálogo e uma assistência permanente a eles.
A assistência psicológica é necessária não porque os moradores de rua são loucos, mas porque eles são traumatizados.
Imagine viver em locais inseguros, sob medo constante - de vez em quando pistoleiros matam sem-tetos a esmo - , e, no inverno intenso de hoje em dia, ainda morrer de frio, depois de tanta tremedeira e agonia.
A pobreza não é linda. E se as favelas viraram "paisagens de consumo" por conta dessa hipocrisia "bondosamente" elitista da "favela-nação" do "funk", esse estranho ritmo que sempre reaparece, feito cortina de fumaça, em momentos de crise na política golpista, a coisa é bem pior.
Hoje já não se pode sequer viver nas construções precárias das favelas, porque várias delas agora se tornaram caras, porque, antes problemas habitacionais, as favelas viraram "paisagens de consumo", "lugares turísticos" e, por isso, se instituiu o "safári humano".
Agora as "novas favelas" são as pontes, as calçadas, os becos e o que tiver de canto vazio para algum miserável se instalar.
Isso é triste. As favelas não melhoraram, mas a questão da moradia piorou.
E vemos gente trabalhadora, desempregada ou desalentada - quando está desanimada para obter um emprego - morando nas ruas, sendo várias pessoas com seus dramas pessoais, seus traumas.
É claro que os sem-teto deveriam deixar de viver nas ruas. O que os sem-teto mais querem é ter moradia, e isso é indiscutível. Mas isso não deve ser feito nesta forma policialesca que o "Movimento Anti-População de Rua" deseja.
Deveria haver um amplo projeto social, no qual possa não apenas amparar os sem-teto, mas fortalecer sua autoconfiança e dar a eles educação, emprego, assistência psicológica (repito, para resolver os traumas da miséria extrema) e todo tipo de apoio.
É necessário que isso seja feito imediatamente, antes que surjam intelectuais porraloucas dizendo que é "ótimo o povo pobre morar nas ruas", em mais um surto de retórica da "pobreza linda" que hoje se embala ao som do "funk".
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