Há um certo tempo, quem tem mais de 50 anos e tem até 70 mostrou o quanto a velhice nada tem de glamourosa e que maturidade não passa de criancice para ocupar o vazio da idade avançada, que envolve a perda do vigor físico e o ócio da aposentadoria.
É um quadro muito diferente do que há 20 anos, quando se via gente com 50 anos tentando tirar onda de "amadurecida" e forçando a barra inventando uma vivência maior do que suas idades e dos limites de suas compreensões durante a infância.
Era época de médicos, empresários, economistas e advogados que, nascidos na primeira metade dos anos 1950, tinham que compensar seus pesos de consciência por se casarem com mulheres cerca de 20 anos mais jovens - ex-modelos, atrizes e tinha até ex-paquita na parada - para esbanjar um pedantismo vivencial constrangedor.
Alguns deles nasceram em 1952, 1954, mas se encanavam em fazer de conta que viveram a Nova York dos anos 1940. Tratavam Glenn Miller, o maestro de jazz, como se fosse tio deles que juravam ter "conhecido" o músico, mesmo tendo ele falecido em 1944, antes dos cinquentões de 20 anos atrás nascerem. E eles tratavam nomes como Winston Churchill, Thomas Mann e até Norman Mailer como se fossem seus tios-avôs.
Esses "coroas" dos anos 2000 tinham um preconceito enorme em relação aos anos 1980 e preferiram enturmar com pessoas mais velhas. Daí o pedantismo etário. Aceitavam que suas jovens esposas lhes chamassem de "gatões", mas exigiam que os rapazes das idades delas lhes dirigissem pelo vocativo de "senhor". Havia um desprezo a esses rapazes, que simbolizavam aquela "década horrível" de "surfistas e roqueiros de bermudas". Ingratos, esses profissionais liberais e empresários deveriam ao menos agradecer aos anos 1980 pela possibilidade de ganharem muito dinheiro.
Mas os "coroas" tinham também a companhia geracional de mulheres também nascidas nos anos 1950 que, curtindo o desbunde no começo dos anos 1970, na época da puberdade e do florescer dos impulsos sexuais, eram magricelas de físicos largos, anda com coxas volumosas. Mas, nos anos 2000, elas chegaram aos 50 anos fora de forma, celibatárias após uns três casamentos, e tornando-se beatas religiosas, trocando Janis Joplin por Padre Zezinho.
Tempos depois, essa geração tentou esbanjar amadurecimento político com besteira. No fundo, queriam endossar as causas de seus pais. Eram filhinhos de papai e filhinhas da mamãe que, alcançando a casa dos 50 nos anos 2000 e 60 nos anos 2010, surtaram apostando num reacionarismo que tentasse fazer o Brasil voltar aos padrões sociais dos anos 1940. Forçaram demais a barra com um reacionarismo que se pretendia ser clássico, mas tornou-se burro e, em conduta, bastante "aborrecente". Uma rebeldia pelo avesso, pois não aceitava as mudanças naturais das relações humanas dps últimos tempos.
Era a retomada conservadora de 2016, com surtos reacionários de gente de cerca de 60, 65 anos de idade que, contraditoriamente, se expressava como uma birra adolescente, escrevendo o que não se deve e apagando a mensagem em seguida. Nos EUA, Brasil e Reino Unido, essa onda reacionária gerou Donald Trump, Jair Bolsonaro e o Brexit (campanha pela saída da Grã-Bretanha da União Europeia), respectivamente.
E aí as coisas mudaram e vemos que, depois dos 50, era possível fazer besteiras ou coisas até mais graves. Em certos casos, era chocante ver que pessoas agiam direitinho aos 25, 30 ou 40 anos e passassem a cometer crimes depois dos 50.
Com a pandemia da Covid-19, um subproduto dessa retomada conservadora e reacionária, caíram-se as máscaras e, com a ascensão de plataformas digitais como o Instagram e o WhatsApp, ter cabelos grisalhos ou brancos não isenta as pessoas de se comportarem de forma infanto-juvenil.
E aí temos coisas gozadas. Homens que, com cerca de 50 anos em 2004, juravam gostar de jazz (que no fundo lhes entediava, mas era tudo pela espiral do silêncio), hoje estão ouvindo até o Skank e o Cidade Negra e pedem cópias dos discos da coleção de seus filhos. Mulheres que foram hippies na adolescência do começo dos anos 1970, depois, aos 50 em 2004, viraram beatas, hoje, com 70 anos e menos quilos do que há 20 anos, fazem dancinhas bobas do Tik Tok.
E aí vemos mudanças nos padrões de vida. Os homens de 50 anos de 20 anos atrás deixaram de ser turrões e trocaram os sapatos de couro, que usavam até em eventos formais, pelos sapatênis que dão um jeito para usar em eventos formais mais flexíveis. Se eles tentaram entender os anos 1930 e 1940 há 20 anos, hoje já aceitam os anos 1980 e, mesmo aos 65, 70 anos de idade, falam até de Cavernas do Dragão e jogos de Pac-Man. E de repente vemos homens e mulheres de 70 anos jogando no celular, interagindo como se ainda estivessem na mais tenra juventude.
E os "moleques desprezíveis" de 30 anos que eram esnobados pelos cinquentões da época hoje falam de igual para igual com eles, afinal já são tão grisalhos e fora de forma quanto eles. E em muitos casos os "maduros" de 70 anos hoje pedem sempre a ajuda dos atuais "moleques" de 50, seja em reuniões de condomínio, seja em consultas técnicas ou em qualquer outra urgência.
Há 20 anos os "coroas" pautavam suas personalidades para agradar os seus pais, imitando seus estilos de vida e se apropriando de suas referências. Hoje os pais dos setentões de hoje estão mortos e resta a eles pautarem suas personalidades com base nos filhos.
E aí vemos homens e mulheres de 70 anos que, duas décadas atrás, dependiam da compabhia dos filhos para ir a um concerto de música jovem, indo sozinhos para tais eventos. Numa época em que até o Copacabana Palace está pop, resta aos vovós de primeira viagem desistirem do jazz que dificilmente entendem para ver um show de um artista do Rock Brasil dos anos 1980. E aí os "coroas" de 20 anos atrás descobriram, aos 70 anos, que nunca foram mais do que uma Geração Coca-Cola escondida numa garrafa de Campari.
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