A burguesia de chinelos, invisível a olho nu, mantém seus disfarces neste Carnaval mal-disfarçado desse Brasil feito um parque de diversões. Gente que não sente o sabor dos alimentos, porque, para esse pessoal, animal consumista, tudo é só consumo, prestígio, logomarca.
Tudo é questão de popularidade, sucesso, lucro, vendas, lacração. Nada mais tem cheiro nem sabor. Apenas o visual é o sentido mais aguçado da elite do bom atraso, o mero ato de ver que dá margem a exageros, como a supervalorização de um astro nem tão genial assim, Michael Jackson, devido à grandiloquência e ao pretensiosismo de seus videoclipes.
Nosso Brasil virou uma concessão da Folha de São Paulo, do SBT, da Jovem Pan, da Rede Globo e de um consórcio de empresários do entretenimento e as empresas patrocinadoras associadas. São essas "instituições" que ditam o comportamento padrão que observamos em todo o país, supostamente movidos por uma "natural popularidade" que nada tem de natural. Vide a gíria "balada", na verdade um jargão de riquinhos para um rodízio de drogas alucinógenas, mas que se popularizou graças a um lobby liderado pela Jovem Pan e pela Rede Globo.
Pensamos que a cultura que prevalece no Brasil, com sua música popularesca, seu futebolismo tóxico, seu obscurantismo religioso, suas subcelebridades e todo o culturalismo jeca que se propaga feito um câncer terminal nas redes sociais, é fluente como se tivesse sido carregada pelo ar que respiramos.
Mentira.
Esse culturalismo que acostuma mal milhares de pessoas é forjado por uma elite burguesa que quer ditar o padrão do que deve, a seu ver, ser o comportamento do povo brasileiro, e por isso há todo um empenho da burguesia enrustida em parecer "gente como a gente", mostrando sua grande falsidade em todos os sentidos, coisa de fazer a burguesia retratada pelo cinema de Luís Buñuel parecer um poético devaneio.
Nossa burguesia atual, descendente das velhas elites que, no passado distante, exterminaram índios e escravizaram negros, e que posteriormente criaram a República Velha, derrubaram Getúlio Vargas, clamavam pelo golpe de 1964 e o AI-5 e abocanharam a fortuna do "milagre brasileiro" de forma que, quando esta farsa econômica não conseguiu disfarçar sua crise, a referida elite burguesa foi a que menos foi afetada por esse colapso "trazido de fora" pela crise do petróleo no Oriente Médio, em 1973.
A elite que, até pouco tempo atrás, ainda se empenhou para derrubar Dilma Rousseff e eleger Jair Bolsonaro, fingindo combatê-lo como fingiu combater Michel Temer para lacrar nas redes sociais, agora se passa por "boazinha" e reverte seu antigo antipetismo pelo seu extremo oposto: de tanto criticarem Lula há cerca de 15, 20 anos atrás, agora são os primeiros a reprovarem qualquer crítica a ele.
Agora que Lula virou uma mascote da burguesia enrustida, e que o lulismo 3.0 é um jogo de faz-de-conta no qual se finge um esquerdismo que há muito deixou de existir, a elite do atraso de anos atrás agora se repaginou numa classe "legal", cooptando o que havia de abastado entre os esquerdistas para todos, convertidos na "sociedade do amor", promoverem um "socialismo de boutique e de botequim".
Escondendo verdadeiros dramas sociais como o trabalho precarizado, a miséria reinante, os preços caros que não param de subir - apesar dos relatórios do "efeito Lula" e seus "recordes históricos" tentarem afirmar o contrário - , a burguesia enrustida não quer que a verdade seja dita. Ninguém pode se lembrar do que foi feito no verão passado. Agora a regra é "mais amor, por favor" e "julgue menos e ame mais", eufemismos para jogar a sujeira antiga para debaixo do tapete.
As desigualdades sociais aumentam, mas tudo isso se camufla porque a burguesia atual, no seu mimetismo social, agora se passa por "pobre", por "gente como a gente", enquanto a farsa da miséria gourmetizada - vide o que falam sobre as favelas nas últimas duas décadas - tenta transformar a pobreza humana numa pretensa "etnia", para disfarçar o elevado custo social que as elites brasileiras causaram contra os miseráveis ao longo dos séculos.
Por isso não cremos na melhoria de vida, se, ao andar pelas ruas das cidades - podendo ser no Nordeste, no Sudeste, no Sul, Norte e Centro-Oeste - , a gente vê a decadência que os relatórios do governo Lula escondem. Mas não podemos falar mal desses relatórios. Eles são como a "bíblia" da "boa" sociedade, que, sem sair de casa, se acha com autoridade para julgar os fatos que não veem e o mundo que fingem ver, sob o indisfarçável filtro da cerveja gelada.
O Brasil vive a continuidade de uma séria crise cujo ciclo atual veio com o golpismo de 2015-2016. Lula não sinaliza uma ruptura real com esse quadro, e mais parece governar com simulacros de realizações, enquanto sua "democracia do eu sozinho" não só não assusta a burguesia como ela se dá ao luxo de, aos olhos do público, se passar por contrária a si mesma.
Daí tanta falsidade. Uma burguesia que se acha "pobre", "diferente", "alternativa", "esquerdista", "nerd" e tudo o que render lacração nas redes sociais. Uma burguesia cujo histórico de classe é jogado na conta de seus antepassados, que passam a carregar um estereótipo mais ortodoxo, enquanto a atual burguesia, tornando-se heterodoxa, se espalha entre o povo se passando por "gente comum", para assim manter seus privilégios sem que as pessoas percebam. A mentira é o motor dessa classe de "boas-vidas".
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