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A DISTOPIA BRASILEIRA E A VERGONHOSA CLASSE MÉDIA FELIZ

DESLIZAMENTO DE UM MORRO EM FRANCISCO MORATO (SP), OCORRIDO ONTEM E QUE DEIXOU QUATRO MORTOS.

"Favela feliz", "pobreza linda", "autossuficiência das periferias"...

Quem não lê Esses Intelectuais Pertinentes..., movido pelo negacionismo cultural que insiste em dizer que "está tudo bem", não conhece a realidade.

A onda de positividade tóxica que contamina a classe média "formadora de opinião" é tão vergonhosa que chega a haver casais de namorados cantando, alegres, versos como "Solidão apavora (...) / Solidão é senhora" da música "Desde Que o Samba é Samba", de Caetano Veloso.

E isso para não dizer a respeito de um fato que ocorreu há 50 anos, o Domingo Sangrento de 30 de janeiro de 1972. Um protesto pacífico de católicos em Derry, na Irlanda do Norte protestante, terminou com um massacre policial que matou 14 manifestantes da outra religião.

A canção, sabe-se, inspirou a letra da dramática canção do U2, "Sunday Bloody Sunday", lançada em 21 de março de 1983, por coincidência o dia do meu aniversário de 12 anos de idade.

E como o Brasil vive uma "grande felicidade", com pessoas insistindo em "ter esperança" na positividade tóxica que reina nas redes sociais após o golpe político de 2016, a belíssima e triste canção foi alvo de uma situação deplorável e estúpida.

O grupo Sambô, então um daqueles conjuntos que a crítica não podia falar mal - era um Virguloides invertido, pois os Virguloides ("vaca sagrada" do roquinho anos 90) fazia sambrega sob o rótulo pop-rock e o Sambô, com som parecido, tinha postura inversa - , foi gravar a canção do U2.

Com aquele inglês pedante de cursinho, apesar da tentativa da "boa pronúncia" (que ao menos serve para parecer "bem na fita" no YouTube), o Sambô foi cantar "Sunday Bloody Sunday" como se fosse uma canção alegre para animar as festas da laje movidas a muito churrasco e cerveja.

Em atitude pioneira, eu alertava sobre o fato aberrante e estarrecedor de um grupo cantar uma letra triste sobre um episódio traumático como se fosse o hino da alegria e da festa. Foi no Mingau de Aço, em 2012.

Claro que quase ninguém percebeu isso na época, e é esse pessoal que se recusa a ler Esses Intelectuais Pertinentes... por achar "muito caro", mas gasta muito mais dinheiro com sagas medíocres de cavaleiros medievais, mocinhas perdidas na floresta e vampiros universitários.

Só depois é que perceberam a situação, mas aí foi tarde demais. O Sambô conseguiu fazer sucesso e só caiu no ostracismo porque o grupo era muito, muito ruim mesmo.

São coisas de uma sociedade que tanto falou em "combate ao preconceito" como uma máscara para esconder preconceitos piores. Daí o horror em ler o meu citado livro (que esta semana chegará à terceira edição), com revelações novas que derrubariam as ilusões rosadas de muita gente.

Essas ilusões sempre viam nas favelas um "paraíso de tijolos nus", as "periferias" eram 'ambientes felizes de eterno Carnaval", e toda essa narrativa sorridente, pasmem, durante muito tempo era vista como "combate ao preconceito".

Esses Intelectuais Pertinentes... relembra esse "grande momento" da intelectualidade "bacana" e seus pensadores vitimistas, ressentidos com a dita "patrulha estética" contra o tal "popular demais".

Paciência. Há muita gente que acha que realidade é só o "riélite chou" do Big Brother Brasil.

Fora desse mundo encantado da fantasia, a situação é terrível.

Não bastassem as enchentes em Minas Gerais, Bahia e outros Estados do Nordeste, foi a vez da Grande São Paulo e parte do interior sofrer as tragédias que afligem tantos brasileiros.

As chuvas ocorridas na região metropolitana paulista, anteontem, causaram, pelo menos, 24 mortes e 600 pessoas desalojadas, segundo dados do começo da noite do último domingo.

Deslizamentos de terras, alagamentos, transbordamento de rios prejudicaram pelo menos sete cidades: Francisco Morato, Franco da Rocha, Arujá, Ribeirão Preto, Embu das Artes, Jaú e Várzea Paulista.

Em Várzea Paulista, uma família inteira morreu após uma casa ser atingida por um deslizamento. Na cidade de Arujá, um homem de 59 anos que estava dentro de um carro morreu afogado.

Isso é resultante de um grande desequilíbrio ambiental. Culpa de Jair Bolsonaro? Culpa de João Dória Jr,? Não, necessariamente.

Da parte de Bolsonaro, pode até ser, em parte, mas lembremos que a destruição ambiental que causou um desequilíbrio meteorológico que devastou a Amazônia.

Lembremos que o coronelismo reinante no Norte do país, que ao mesmo tempo elimina a bala trabalhadores camponeses, ativistas sindicais e ecológicos e até missionários, patrocina boa parte do "popular demais" que a sociedade "sem preconceitos" tanto curte, causou muitos estragos ambientais.

Eles atuam em extração predatória de madeira das árvores, realizam incêndios criminosos, cometem vários abusos em relação ao meio ambiente e à agricultura.

E isso influi no clima em todo o Brasil. A ponto de, no Rio de Janeiro, ser praticamente possível curtir o verão somente no período de inverno.

São Paulo é linda, mas tem o contraste de ter um verão chuvoso e quente e um inverno extremamente frio, embora na maioria dos dias ensolarado.

Junto a isso, temos a "pobreza linda", a "favela feliz", vista à distância pela nossa "querida" intelectualidade, que a opinião pública não quer ver desmascarada nas páginas de Esses Intelectuais Pertinentes....

Nossas elites tão "esclarecidas", "ilustradas" e "sem preconceito" veem os morros à distância, acham bonito haver casas precárias dos subúrbios, roças e sertões. Pensam que esses ambientes vivem numa festa permanente.

E não podemos criticar essas elites, porque é "injusto", pois elas são tão "generosas"... Seja um intelectual festivo glorificando a bregalização cultural que idiotiza o povo pobre, seja um Geraldo Alckmin ordenando a expulsão violenta de moradores de Pinheirinho, em São José dos Campos.

O nosso povo precisa ser assistido por políticas habitacionais decentes.

Tantos edifícios abandonados, que poderiam ser adaptados para boas residências, dependendo apenas da criatividade de algum arquiteto mais inspirado.

Tantos terrenos que deveriam ser usados para novos conjuntos habitacionais, deixando os morros para o reflorestamento que diminuiria boa parte da poluição ambiental nas cidades.

Não adianta criar um clima de Carnaval em torno do desejo de ver Lula presidente, se a nação identotária de esquerda fica indiferente aos dramas do povo pobre, forçado a improvisar residências em áreas de risco, diante da exclusão imobiliária.

E os sem-teto que vivem o horror traumático de deitar em locais molhados e doentios? E os que têm barracas que, velhas, se deterioram com sucessivas chuvas e, furadas, causam até goteiras?

Vergonha ver que o Brasil vive uma realidade distópica e uma boa parte da sociedade brasileira achar que vive um período de "muita felicidade". Precisam prestar atenção aos sofrimentos dos outros e tomar alguma providência para resolver ou evitar essas tragédias.

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