GERALDO ALCKMIN, NO PAPEL DO "BOM EMPRESÁRIO" DE ANTÔNIO FAGUNDES NO NOVELÃO DAS NOVE.
As esquerdas brasileiras andam muito midiáticas. Desde quando eram crianças ou jovens durante a ditadura militar, seu mundo era o da televisão.
Nos anos 1990, era a pequena burguesia que adorava ler a Folha de São Paulo, que tratava o Brasil como um quintal do seu dono, Otávio Frias Filho, um dos patronos das causas identitárias da forma como existem no nosso país.
Temos também os mileniais, para os quais a liberdade parece fluir com o ar puro, mas se esquecem que a liberdade que exercem é apenas uma franquia controlada por Otávio (in memoriam), Sílvio Santos, Marcelo de Carvalho e Amilcar Dallevo, Tutinha, Edir Macedo e os irmãos Marinho.
E nesse contexto as esquerdas brasileiras se apegam nos brinquedos culturais da direita gurmê. Dentro de um ritual litúrgico de consumir a Rede Globo no horário nobre.
Primeiro consomem o Jornal Nacional e ficam horrorizados com a pauta centro-direitista do noticiário.
Mas aí depois se aliviam com a anestesia da novela das nove, que mostra um Brasil idealizado que, durante quatro meses por ano, é complementado pelo identitarismo vazio do Big Brother Brasil (o que já começa a valer agora, mais uma vez).
As esquerdas sonham com aquele Brasil "lindo" da novela das nove e seu maniqueísmo fácil que se reflete na compreensão da realidade fora das telas de TV.
Se horrorizam ao ver o empresário deprê, personificado, como estereótipo, na figura de um José Mayer atormentado que, em seu escritório, telefona para a secretária para cancelar uma reunião de negócios mais de uma vez.
Hoje esse personagem é a "terceira via", o João Dória Jr. aterrorizando as esquerdas médias com seu neoliberalismo bonapartista. Um antigo apresentador que era só visto pelas ricas elites do dinheiro acabar vencendo nas urnas, com o povo pobre votando nele, é um pesadelo para as esquerdas.
Já em núcleos não-ricos, reina o paraíso, embora saibamos que existe o estereótipo do "bom empresário", que na novela tem a cara do Antônio Fagundes e que, na vida real, se encaixa no perfil de Geraldo Alckmin. Fala macia, jeito paternal, expressiva elegância, assistencialismo aos pobres.
Indo para as classes modestamente prósperas, sem ser a classe média nos critérios de Jessé Souza, vemos uma situação pitoresca.
O Nelson Xavier do estereótipo do velhinho bonachão e generoso, que bondosamente diz para a esposa contrariada "Mas querida...", acaba sofrendo uma inversão simbólica.
Para as esquerdas, não é o Nelson Xavier que interpretou um tal "médium", mas é o "médium" que o imaginário esquerdista atribui, em vão, o papel do velhinho bonachão da novela das nove.
Temos também o núcleo pobre da "favela linda", que vive um eterno Carnaval 370 dias por ano.
O "funk" supostamente libertário, com a "alegria do povo" combatendo camburões, caveirões e metralhadoras, como se a "ginga popular" fosse uma "arma revolucionária".
Miseráveis sorrindo e contando piadas. Personagens engraçados. Meninas ambiciosas querendo vencer na vida através do rebolado. Favelas convertidas em estranhos paraísos de casas precariamente construídas e localizadas e onde falta luz, água, asfalto e outras condições de utilidade pública.
Até o malandro que não tem dinheiro para pagar a rodada de bebida alcoólica existe nesse imaginário das "periferias realistas" mais estereotipado do que o das chanchadas da Atlântida e Cinédia.
E aí tem o jogador de futebol feito uma moderna resposta ao atleta grego do Olimpo, o galã pobre, estereotipado em Cauã Reymond, que busca sua "humilde corrida" para o sucesso.
Temos também a glamourização de velhos ídolos cafonas, como melancólicos seresteiros que só queriam "cantar o amor" e eram vaiados, "coitadinhos", como se sua mediocridade significasse alguma genialidade.
Ídolos cafonas que, tadinhos, tiveram canções de amor sofrido censuradas pela ditadura militar e que, com a ajuda "involuntária" da Censura Federal, viraram "guerrilheiros libertários" na visão imaginária e idealista dos intelectuais "bacanas" e "coitados" tipo Paulo César de Araújo e companhia.
E na dramaturgia, o imaginário das esquerdas médias jura que o novelão do "Brasil real" identitário-festivo foi escrito pelos novelistas Karl Marx e Frederic Engels, sob direção-geral de Fidel Castro.
Marx e Engels, segundo esse imaginário, seriam também "autores" de "Xibom Bom Bom", em parceria com Wesley Rangel e Rogério Gaspar, embora a dupla de pensadores "teria dispensado" a inclusão de seus nomes nos créditos autorais.
Com esses brinquedos culturais, o Brasil "lindo" é o Brasil da novela das nove da Rede Globo.
Assim fica fácil a burguesia de centro-direita e a pequena burguesia da esquerda identitária apoiarem Lula.
Desde que Lula deixe de ser o Lula dos sindicatos.
Desde que Lula passe a ser o Rei Momo "esbelto e galântico" (?!?!?!) do Carnaval identitarista.
Desde que Lula vire um cosplay de Dom Pedro II e prometa uma nova "Lei Áurea" que deixe os pobres mais uma vez à deriva, "felizes" na "pobreza linda" nas favelas e na miséria nas ruas sob barracas ou apenas sobre colchões velhos ou panos rasgados.
Nunca foi tão fácil a "boa sociedade" brincar de ser esquerdista, com os brinquedos culturais da direita gurmê, desenhando o Brasil da novela das nove como nação próspera e feliz do Planeta Globo.
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