Depois de fazer promessas idealistas demais para o contexto do Brasil de hoje em sua entrevista com a mídia independente, Lula segue com seu plano de querer voar demais se aliando com quem irá lhe cortar as asas.
Sob a desculpa de "combater o bolsonarismo" e "garantir a democracia", Lula busca uma aproximação para o que chama de "PSDB da Constituinte".
Desta vez, Lula se encontrou com Aloysio Nunes, ex-ministro de Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, no escritório do advogado do petista, Cristiano Zanin, em São Paulo.
Mais uma vez, aquele papo de "diálogo", "entendimento", "democracia", "convívio e superação das diferenças", etc etc etc.
Assim como Geraldo Alckmin saiu entusiasmado com a entrevista de Lula e a receptividade das esquerdas médias, Aloysio Nunes, que era uma espécie de tucano mais agressivo e um dos defensores do golpe político de 2016, também manifestou sua empolgação:
"É um movimento muito positivo para a política brasileira. Esse gesto indica uma derrubada de barreiras e uma convergência, uma disposição de fazer uma política mais ampla. Eu e Lula conversamos neste contexto, em que ele dizia que, se concorrer, e se for eleito, encontrará um País muito pior que encontrou na sucessão de Fernando Henrique Cardoso".
Sobre o teor da conversa, Aloysio disse:
"Conversei sobre o Brasil, os grandes desafios que nós temos e a necessidade de ter o mínimo de boa convivência para resgatar as convergências que foram muito positivas no passado e que serão mais do que nunca, necessárias no presente".
Aloysio também "lavou as mãos" a respeito do golpe político de 2016 e defende a aliança entre o PT e o PSDB "histórico" na campanha de Lula para 2022:
"Eu falei que era uma coisa muito positiva. Eu que tomei a iniciativa de dizer que era uma coisa boa. Tanto para ele, quanto para Alckmin. No caso do PT e do PSDB, são duas vertentes da social-democracia. Com uma vertente mais à esquerda, porque o PT não é um partido revolucionário, é um partido reformista. O PSDB também é um partido reformista. Nós desenvolvemos em certo momento, especialmente no impeachment, um posicionamento muito antipetista, que foi uma coisa muito estreita, que estreitou nosso horizonte, mas que não faz parte da natureza social democrática, e o PT e o PSDB foram responsáveis pelos êxitos que nós tivemos em todos os governos que ocupamos. Foi um momento. Mas, são duas vertentes da política democrática".
É animação maior que a festa, conforme costumo dizer.
Essa empolgação toda pelos dois lados, PT e MDB / PSDB, soa muitíssimo estranha.
E o pior é que a narrativa da aliança Lula-Alckmin fez seu avanço.
Ou seja, se antes a narrativa era de que a aliança era necessária para vencer as eleições e derrubar Jair Bolsonaro, hoje a narrativa fala em "não apenas vencer as eleições, mas governar em parceria", ou seja, a tal tese da "governabilidade", que ninguém consegue explicar direito o que é.
Os esquerdistas que apoiam a aliança Lula-Alckmin são muito evasivos em suas justificativas.
Tenho que ler essas justificativas, uma a uma, e vejo que não existe consistência. Os argumentos são superficiais, as motivações bastante evasivas, o discurso não é convincente para quem espera algo mais convincente.
Tudo é feito no âmbito emocional, apesar de todo o verniz "objetivo" e "imparcial" das tais "alianças pragmáticas".
E Lula está fazendo justamente o que não devia: se aliar com quem não concorda com o seu programa de governo.
Alguém, em sã consciência, acredita que Lula preservará mesmo o seu programa de governo? Ou irá fazer uma maquiagem, reduzindo seu "grandioso projeto de transformar o Brasil" em medidas paliativas (Bolsa Família, cotas universitárias, Minha Casa Minha Vida e similares)?
Paliativos, vale lembrar, no sentido de que são projetos com relativo progresso social, mas que certamente evitarão comprometer os privilégios das classes mais ricas.
Lula disse que seu governo não será pautado pela Faria Lima. Mas chama para seu lado justamente os representantes políticos da Faria Lima.
Os esquerdistas acreditam que Geraldo Alckmin aceitará calado os desígnios de Lula e trabalhará de acordo com o projeto determinado pelo titular do Executivo federal.
É muita ingenuidade. A aliança tem seu preço, o tal "diálogo" indica que haverá concessões, e a maior parte delas partirá do próprio Lula, que fará "menos do mesmo" em relação aos dois mandatos anteriores.
O que sinaliza isso é o que o secretário-geral do Partido dos Trabalhadores, Paulo Teixeira (RS), disse em entrevista à Mônica Bergamo, substituindo "revogar" por "rever", em relação a medidas herdadas do governo Temer, como a reforma trabalhista e o teto de gastos públicos.
Talvez o PT faça concessões antecipadas para que a direita moderada não precise mandar fazer.
Lula vai fazer muito menos do que nos governos anteriores, e isso se deve a estas circunstâncias.
Há uma visão muito contraditória em relação ao PT.
A direita que agora apoia Lula afirma que o PT "não é revolucionário" e que o petista será um presidente de perfil bastante moderado.
A esquerda que apoia Lula, dentro do clima do "já ganhou", acha que o presidente fará o "governo da mudança" e "realizará grandes transformações para o Brasil nos próximos quatro anos".
E Lula está sonhando alto, falando que vai fazer "o governo dos sonhos do povo brasileiro", fazendo promessas que o nosso contexto atual não permite fazer.
Lula vai ter que ter pulso firme demais, surfar diante de tsunamis, para fazer realmente o que promete.
E isso será impossível. É como fazer corrida diante de um furacão.
A coisa se complica quando Lula se alia justamente com aqueles que se envolveram em episódios que vão da chamada "farra da privataria" à expulsão violenta de moradores do bairro de Pinheirinho, em São José dos Campos.
E o que Lula vai fazer? Manter a pureza de suas ousadias políticas, fazer o que acha que vai fazer, "um governo melhor do que os dois anteriores"?
Lula vai sentir "tesão" em governar ao lado de golpistas?
Lendo várias declarações de golpistas, como Aloysio Nunes, Fernando Henrique Cardoso, Michel Temer, Geraldo Alckmin etc, vejo que eles agora "lavam as mãos" em relação ao golpe de 2016.
Uns renegam responsabilidade, como Temer. Outros dizem que é "coisa do passado", como Aloysio. Mas nenhum deles com visão autocrítica de verdade, com arrependimento real e autêntico.
Daí que Lula se tornou decepcionante, por trás de toda essa moda de os brasileiros apoiarem euforicamente o petista.
P. S.: A propósito, Ciro Gomes foi lançado pré-candidato à Presidência da República pelo PDT. E hoje Leonel Brizola faria 100 anos e faz muita falta em aconselhar Lula quanto a certas alianças.
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