As três maiores paixões dos brasileiros, o futebol, a cerveja e a religião, revelam uma realidade oculta.
Essas paixões causam efeitos psicológicos tóxicos nas pessoas. Os três fenômenos são coisas supérfluas, mas são defendidas com muito fanatismo por grande parcela dos brasileiros.
O futebol brasileiro, que há 35 anos não vive mais seus tempos gloriosos - explicaremos isto em outra oportunidade - , ultimamente anda sendo movido por sentimentos tóxicos.
Há vários exemplos. Jogadores de futebol arrogantes com o sucesso e cometendo abusos no âmbito financeiro e até sexual. Radialistas esportivos falando o que não se deve. Dirigentes esportivos se enriquecendo demais. E torcedores furiosos com a derrota do respectivo time.
No Rio de Janeiro, isso chega aos níveis de uma grave doença social.
Afinal, torcer por futebol virou uma obrigação autoritária. Futebol já não é mais uma diversão, mas uma imposição social, como se fosse uma doutrina fascista.
Entre cariocas e fluminenses, essa obsessão tóxica se dá de tal forma que o sujeito, ao conhecer alguém, pergunta primeiro o time antes de perguntar o nome.
Quando joga conversa fora, um cidadão fala para outro que nem conhece sobre futebol, sem saber se o outro está interessado em ouvir aquilo.
E tem ainda o assédio moral no trabalho, no qual futebol tornou-se a pauta principal.
E não se fala de patrões torcendo por um time ameaçando os empregados que torcem por outro.
Se o patrão é vascaíno e o empregado é flamenguista, a aparente rivalidade é vista com descontração, as briguinhas mais parecem troca de piadas amistosas de uns com os outros.
O problema é quem não se interessa por futebol. Este, sim, é uma ameaça. No Rio de Janeiro, o trabalhador que não gosta de futebol, por mais talentoso que seja, é o primeiro a ser cogitado num programa de demissão de uma empresa.
Sobre a cerveja, a bebida tem sabor horrível - algo como um suco de pão emboloroado batido no liquidificador, som sabor próximo ao de uma dipirona - , mas é valorizada com certo fanatismo por muitas pessoas.
É como se a cerveja fosse o elixir da alegria, numa sociedade que, em tempos midiatizados e mercantis como os de hoje, alegrar-se necessita de um processo ao mesmo tempo artificial e tóxico.
A cerveja tem gosto ruim, faz mal à saúde, engorda e estraga a voz da pessoa, mas mesmo assim sempre tem aquela falácia de "beber aquela cerveja gostosa (sic)".
Me lembro que, em 1989, fui constrangido por colegas da Universidade Gama Filho para experimentar um gole de cerveja. Foi extremamente vergonhoso para mim.
Nas redes sociais, muitas mulheres solteiras - algumas visivelmente envelhecidas - ostentam suas fotos da vida pessoal com copos de cerveja, como se isso fosse "alguma das coisas boas da vida".
Isso também é constrangedor, e acaba promovendo uma péssima imagem dessas solteiras brasileiras, num contexto em que uma sociedade solteirófoba sempre vê na pessoa solteira uma idiota irresponsável.
Mas também temos a religião, como uma paixão tóxica. Não digo a religiosidade em si, mas o tipo obsessivo e paranoico de religiosidade.
Quando a pessoa não guarda a religiosidade para horários e lugares específicos - como na meditação particular em casa ou dentro das atividades de sua igreja - , e tenta fazer da vida afora um puxadinho de sua religião, isso se torna tóxico.
Quando a pessoa transforma o Instagram num bombardeio de mensagens religiosas, sobretudo com frases que tentam promover os ídolos religiosos como se fossem pseudofilósofos - Olavo de Carvalho que o diga - ou falsos intelectuais.
Vide por exemplo as mensagens medievais de um "médium de peruca" que, de forma constrangedora, aparecem como baratas em cozinha suja nos feeds do Instagram, sem pedir licença a quem quer que seja.
Isso é horrível. Uma religiosidade tóxica na qual a pessoa fica feliz em ser marionete de um ente de existência duvidosa chamado Deus, visto como uma espécie de "Papai Noel para adultos".
A toxicidade religiosa torna as pessoas místicas, alucinadas, submissas, escravas de um tal "mistério da fé" que praticamente transforma o terrível fenômeno da Síndrome de Dunning-Kruger numa causa messiânica, num pretenso símbolo de humildade.
E transformar a fé numa obsessão cotidiana, "religiosizando" a vida comum, torna-se uma doença, porque, em vez da religiosidade estar dentro de cada pessoa, ela está fora dela, querendo se impor a tudo e a todos.
Todas essas três paixões tóxicas causam sérios problemas psicológicos.
O fanático por futebol, vide o último jogo do Palmeiras com o britânico Chelsea, fica extremamente furioso com a derrota, de tal forma que seu semblante agressivo se torna explícito, a ponto de alguém que inocentemente lhe perguntasse as horas recebesse como resposta um soco ou um tiro de revóver.
O fanático pela cerveja sofre os efeitos coleterais causados pela bebida. Torna-se arrogante, agressivo, falsamente feliz (ou toxicamente feliz), e o hábito de beber lhe trará, no futuro, graves doenças e um físico gordo e doentio, além da voz rouca e sem vigor.
O fanático pela religião se torna desesperado por sua crença religiosa, que ele tenta impor (mesmo de forma não assumida) a outras pessoas, e, descontente com a religiosidade manifesta dentro da igreja, ele quer espalhar sua fé até em ambientes fora desse contexto.
É constrangedor ver, no feed do Instagram, ao lado de musas, hobbies e outras coisas legais, mensagens oportunistas de pastores "neopenteques", "médiuns" e outros obscurantistas religiosos atrapalhando a harmonia dos temas legais de um entretenimento digital saudável.
E são mensagens tão pedantes e confusas, que se alternam entre pedidos para valorizar a autoestima e apelos para combater o "pior inimigo dentro da própria pessoa".
Você fica louco. Ou você é seu próprio amigo, ou é seu pior rival. Ou você tem que sentir esperança na vida, ou aceitar as desgraças a troco de uma hipotética recompensa no "outro mundo".
Essas três paixões tóxicas estão estragando o Brasil. E quanto mais se apega a elas, mais as pessoas se sentem suas escravas, na busca vã de uma paz que não existe nesses fenômenos.
Comentários
Postar um comentário