Do contrário que o Datafolha divulgou, a campanha de Luís Inácio Lula da Silva para a Presidência da República não é, mesmo de longe, a segunda melhor desde3 1989. Quem observa bem as coisas e evita viver no mundo fantasioso dos institutos de pesquisa - que em supostas pesquisas eleitorais se limitam a "pesquisar" um punhado de dois milhares de pessoas - sabe que a campanha atual é a pior de toda a carreira do petista.
A única vantagem é que Lula consegue envolver emocionalmente o eleitorado. Não é Lula que está tendo um bom desempenho na pesquisa, pois ele está péssimo, é o Brasil que piorou social e culturalmente, e não é por falta de verbas das leis de incentivo fiscal. As pessoas são "carregadas" pelos apelos emocionais e mitológicos de um "antigo sindical" que não existe mais.
Fazendo um trocadilho com a estrela que é o símbolo do PT, o "Lulão dos sindicatos" é apenas uma projeção atual daquilo que não existe mais, como uma estrela do céu que vemos e que, na verdade, está extinta há milhares de anos. O Lula que vemos hoje é um desesperado, alguém que não quer assumir autocrítica, que comete seus erros diversos e vergonhosos que me fizeram desistir de votar nele.
Lula até agora não explicou aos antipetistas sobre a farsa das acusações de suposta corrupção. Pior: Lula voltou a se aliar com José Sarney, Geddel Vieira Lima e Romero Jucá, botando lenha na fogueira do antipetismo. Eu acredito que Lula não é corrupto, mas ele tem que explicar a seus opositores certos equívocos, até para conquistar a confiança de quem votou no petista em 2002 e 2006, mas passou a odiá-lo cegamente, só de ver sua cara na televisão ou Internet.
Outros erros, gravíssimos, vieram. Lula fazendo clima de festa para reconstruir o país, que já sofreu várias catástrofes - os desastres ambientais de Mariana e Brumadinho, a devastação da Amazônia, os incêndios no Museu Nacional e na Cinemateca, os feminicídios, os extermínios de negros e índios - , é algo constrangedor.
Da mesma forma, a escolha de um Geraldo Alckmin sem autocrítica - esta palavra, pelo jeito, não está presente no dicionário de Lula - é outro erro gravíssimo, que fez Lula afastar seu núcleo orgânico de seguidores. Ao ter Alckmin como vice e até desejá-lo governando junto, Lula sepultou de vez o sindicalista que havia sido há cinco décadas. Não há um fio de cabelo do antigo líder sindical que tenha permanecido em Lula, hoje um neoliberal com algumas concessões assistencialistas.
Desesperado em vencer as eleições, Lula já fez concessões à direita. Seu projeto, prestando bem atenção, já descartou ousadias políticas. O teto de gastos públicos será "rompido", mas só um pouquinho, para não contrariar a disciplina da cartilha neoliberal dos novos apoiadores do petista. Lula tenta enrolar, dizendo que os investidores estrangeiros terão que investir em "algo novo" em vez de comprar empresas, e aí é que entra a PPP (Parceria Público-Privada) que lhe será prioridade.
A reforma trabalhista só será consertada, tirando pontos radicalmente danosos. A privatização da Eletrobras não tem volta e Lula terá que ficar com as subsidiárias que não foram vendidas para fazer o Luz para Todos. A cobrança de impostos para os mais ricos é só uma promessa que, se for cumprida, só vai atingir empresários bolsonaristas, porque os amigos de Lula da Faria Lima não poderão pagar a conta da festa que ajudaram a realizar. Não se agradece alguém cobrando-lhe dinheiro.
Lula terá que se contentar com o tamanho do Estado que Bolsonaro deixou. Lula não é Leonel Brizola, que, este sim, era capaz de reestatizar empresas. Não é da índole de Lula e, além disso, Geraldo Alckmin e a direita moderada não vão deixar. Além disso, teremos aumentos salariais anuais apenas com acréscimos de R$ 150 no máximo e Bolsa Família e Auxílio Emergencial de R$ 600 cada, e cada R$ 150 a mais para quem tiver criando filho de até seis anos de idade.
Diante desse programa de governo voltado a medidas paliativas, Lula não está convencendo pelas propostas. Outra coisa gravíssima é que os lulistas, dotados de muita arrogância e triunfalismo, andam agredindo a Terceira Via, alegando desde o ano passado que os terceiro-viáveis são politicamente natimortos e sem alguma chance de concorrer às eleições.
E isso agora atinge um grau extremo. Conforme noticia o blogue de Andreia Sadi no G1 e que já se observa há um tempo, a campanha de Lula passou a agredir Ciro Gomes, atribuindo ele a uma "linha auxiliar" de Jair Bolsonaro. É como se o pedetista ex-governador do Ceará - mas curiosamente conterrâneo de Alckmin, pois Ciro também nasceu em Pindamonhangaba, no interior paulista - fosse um cabo eleitoral do atual presidente da República, que busca reeleição.
Isso é um jogo sujo. Na mídia progressista, que há tempos abandonou o bom jornalismo - ainda estamos esperando uma sabatina com Geraldo Alckmin - , já se fala a mentira de que "quem vota na Terceira Via, vota em Bolsonaro". Uma insanidade sem tamanho. E mostra o quanto os lulistas estão no salto alto, e o próprio Lula, apesar de criticar o salto alto dos outros, é o primeiro a manter seu salto nas alturas.
Que moral Lula tem em querer recuperar a democracia se atropela os ritos democráticos de enfrentar concorrentes. Lula diz não querer fazer campanha rasteira, mas ele mesmo chama Ciro Gomes de "colaborador" de Bolsonaro. E acha que a Terceira Via não deveria existir, que as eleições presidenciais só deveriam ser entre Lula e Bolsonaro.
Isso não é um comportamento de quem é vencedor. Vitória não se impõe, se conquista. Lula quer impor sua vitória na marra, e mais uma vez ele entra no PIOR MOMENTO de sua campanha. Sem ir além, nas supostas pesquisas eleitorais, dos 12% sobre Bolsonaro, Lula age com muita arrogância, traindo seus princípios, sua origem proletária e mentindo ao vender como "progressista" um neoliberalismo mal disfarçado e pelego, com apenas leves concessões sociais.
Críticos dos antigos governos de Lula já falaram que o petista não aprofundou muito nas mudanças sociais prometidas. Falaram que os benefícios sociais foram insuficientes para trazer ao Brasil a prosperidade definitiva, pois os progressos foram medianos e frágeis, sem mexer nos problemas estruturais vividos há séculos pelo povo brasileiro.
Hoje as alianças de Lula são menos flexíveis que as de 2002 e 2006. As de 2002 envolveram partidos do chamado "baixo clero" (PP, PL e similares), com algum aceno populista. Em 2006 Lula teve melhor desenvoltura no seu projeto progressista, até porque ele foi sucessor dele mesmo. Mas hoje Lula se alia a neoliberais ortodoxos, que por enquanto fingem que aceitam propostas como o fortalecimento do Estado e a recuperação dos direitos trabalhistas.
Mas devemos nos lembrar muito bem que são esses novos "amigos de infância" de Lula que, há pouquíssimo tempo atrás, aplaudiram Michel Temer quando ele cancelou os direitos trabalhistas, quando vendeu estatais aos poucos, subsidiárias em fatias para vender a diferentes acionistas estrangeiros, para dar um verniz de "diversidade competitiva" na venda do patrimônio estatal brasileiro.
Como é que esse mesmo empresariado, que aplaudiu o "pacote de maldades" de Temer, agora com o apoio a Lula irão vislumbrar, com sorrisos de encantamento, o petista fortalecer o Estado e reverter os direitos trabalhistas? E como Lula, apostando no diálogo da raposa com a galinha, terá liberdade plena para implantar um projeto "mais à esquerda" do que o de seus mandatos anteriores?
Não sejamos ingênuos em acreditar que Lula fará o "governo dos sonhos" das esquerdas, se vemos que o empresariado e o setor financeiro, ao declararem que "ficaram impressionados" com o petista, estão declarando que Lula vai fazer muito menos do que nos outros mandatos. É uma questão de lógica, é um desrespeito atribuir bolsonarismo a tudo que não for Lula, e pensar desta forma mostra o quanto o lulismo está perdendo e precisa vencer na marra, a qualquer preço.
Geraldo Alckmin não tem sangue de barata e ele foi escolhido para ser o freio de Lula. O ex-governador de São Paulo, pelo que vejo, não vai tolerar as ousadias do parceiro. Eu, na esperança de poder estar errado na minha avaliação, mandei ao PSB um questionário para o Alckmin, para ver se ele mudou. Pessoalmente não acredito que ele tenha mudado, mas pelo menos eu cumpri a minha função de jornalista. Amanhã eu divulgo as perguntas que mandei para ele.
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