O debate presidencial da Rede Globo fechou praticamente a campanha presidencial que não houve, pois contou apenas com dois "favoritos", Lula e Jair Bolsonaro, numa polarização que tornou a campanha sem graça e mostrou o lado arrivista do antes admirável Lula.
Lula compareceu ao debate, que contou também com Ciro Gomes, Simone Tebet, Luiz Felipe d'Ávila, Soraya Thronicke e o "exótico" Padre Kelmon. Como em outros debates, Simone Tebet se saiu melhor e Ciro Gomes apenas foi razoável. E, para desespero dos que surfam na "onda Lula", a performance do petista não foi das melhores.
Descontando os momentos em que ele fala das realizações de governo e das promessas básicas de campanha, Lula deixou a desejar, muito aquém da grandeza que ele tinha antes de virar o "ursinho de pelúcia" dos neoliberais. Lula em dados momentos ficou alterado, principalmente quando tentou enfrentar o Padre Kelmon, acusado de ser "linha auxiliar" de Bolsonaro. Em certo momento William Bonner se estressava e perdia a paciência.
Embora o Padre Kelmon fosse um candidato medíocre e ultraconservador, nota-se o valentonismo (bullying) dos lulistas que, na sua mania de humilhar quem é o oposto de Lula, chamaram o religioso de "padre de festa junina". Tudo bem, mas ninguém fala dos "médiuns de tabuleiro Ouija" porque estes prometem a paz mundial, apesar de defender que os sofredores suportem calados as piores desgraças. Está com fome, coma livro, já que costuma-se dizer que as "psicografias" são um "alimento para a alma". E o Padre Kelmon chega a ser menos reaça que muito "médium de alto gabarito".
Lula não se sente à vontade nesse contexto atual de campanha, quando tem que enfrentar outros concorrentes. O petista se achava preparado tão somente para enfrentar Bolsonaro. A campanha de Lula sempre se valeu pela "democracia de cabresto", pela falácia do "candidato único", que se contradisse ao querer recuperar a democracia sacrificando a mesma.
Afinal, outros concorrentes têm espaço, e isso é legítimo, e democracia é diversidade política. Não há democracia de um candidato só, pluralidade centralizada na figura de um só político. Daí que a "democracia de uma pessoa só" de Lula me fez desistir de votar no 13. Hoje eu sinto simpatia por Ciro Gomes e Simone Tebet, a Terceira Via é a verdadeira pacificadora.
Lula mostra que não é pacificador. O lulismo e o bolsonarismo são duas forças de conflito mútuo. A "onda Lula", para piorar, significou um balaio de gatos político-ideológico, com tanta gente diferente apoiando.
Festa estranha, gente esquisita. A "onda Lula" lembra muito as comédias juvenis, quando o filho adolescente, ao ver que seus pais vão passar o dia fora de casa, monta uma festa que, inicialmente, chama os amigos mais próximos para participar e, de amigo em amigo, de repente gente desconhecida entra na casa do rapaz e, entre outras coisas, esvazia a geladeira, suja todo a casa e até derruba e quebra alguns ornamentos de vidro, como cinzeiros, vasos etc.
É tanta gente nessa "onda Lula" que o petista precisa suavizar seu projeto político. Cancelou o texto final do seu programa de governo, primeiro porque precisa ter o mais heterogêneo eleitorado para garantir, pela quantidade, a vitória no primeiro turno. E, segundo, porque tem pontos que podem afastar os antigos apoiadores de esquerda. Eu mesmo pulei fora do barco lulista.
Amanhã Lula vai realizar, com Geraldo Alckmin, seus últimos compromissos de campanha, ao menos no primeiro turno. A chance de haver segundo turno é muitíssimo grande, e nas supostas pesquisas eleitorais Lula não consegue ter mais do que 17 pontos de vantagem sobre Bolsonaro, apesar de haver tanta gente diferente, de Xuxa a Celso de Mello, declarando voto no petista.
Esta foi a campanha presidencial mais surreal da História do Brasil. E Lula é o responsável direto disso tudo, com uma campanha cheia de erros, exageros e contradições. Um Lula que quer ser "o único" e jura que é o mesmo sindicalista de 50 anos atrás, mas que não só está aquém do antigo esquerdista do ABC paulista como passou a se desdobrar em várias imagens.
Entre os empresários e banqueiros, Lula é o moderado que não quer tirar dinheiro dos ricos e quer fazê-los continuar lucrando, para movimentar a economia. Entre o povo, Lula é o herói com poderes quase divinos que vai salvar o país. As esquerdas de raiz ainda sonham com o antigo líder sindical renascendo como um gigante adormecido em algum momento do possível terceiro mandato, com direito ao Incrível Exército de Brancaleone a que se reduziram os movimentos proletários e sociais.
E aí vemos que um evento de visibilidade como o debate político da Rede Globo foi o ápice de um capítulo final dessa campanha esquisita, na qual Lula passou o tempo todo impondo sua vitória e fingindo que não entrou em "salto alto" ou em clima de "já ganhou".
E Lula, para se sobressair como um grande vencedor, teve que matar o antigo sindicalista de esquerda que, hoje, não passa de um mero holograma simbólico para anestesiar seus seguidores, que, por sorte, ainda dormirão tranquilos com o espectro do extinto esquerdista que, na realidade dos fatos, está fazendo amor numa empolgante lua-de-mel com as elites da Faria Lima.
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