Começa o mês de setembro, o último mês inteiro antes das eleições presidenciais. A julgar pelas supostas pesquisas eleitorais, Lula não consegue mais do que 44% das intenções de votos. Na prática, Lula só tem para si os 30% da classe média e dos grupos identitários, mais os 14% do "voto útil" que inclui em maioria a direita moderada.
Lula perdeu votos das esquerdas, esta é a realidade. Ele se atropelou em muitas contradições, patinando entre o conservadorismo que envolve religiosos, empresários e agronegociantes e o progressismo dos movimentos sociais. O petista tenta criar uma ponte para tudo isso, mas enfrenta dificuldades.
A ênfase da parceria de Geraldo Alckmin - que não esboçou autocrítica quanto aos antigos erros, e até agora também não foi sabatinado pela mídia esquerdista - afastou muitos esquerdistas. Um Lulão com 58% a 62% de preferência do eleitorado deu lugar a um Lula se esforçando para ultrapassar 44%.
Lula, com seu papo de frente ampla e usando a "democracia" como desculpa para se aliar com os golpistas de 2016 - e escrevo isso pouco após a lembrança dos seis anos do golpe que tirou Dilma Rousseff definitivamente do poder - , perdeu muitos dos seguidores orgânicos. Eu tinha em 2020 meu voto decidido para Lula, mas vendo que ele montou chapa com Geraldo Alckmin, desisti de vez.
O petista está fazendo concessões à direita. Está sendo domesticado pela burguesia que se aliou a ele. Lula está espremendo seu programa para não comprometer suas pautas progressistas, mas nos bastidores até o abajur do quarto do petista sabe que ele abandonou as ousadias de seu governo.
Na prática, o que vai haver é um governo Lula em que o titular terá uma ação bastante limitada. Até a revogação de teto de gastos e da reforma trabalhista foram descartados, pondo no lugar uma flexibilização do orçamento para políticas públicas e apenas a eliminação de pontos "extremamente duros" da legislação trabalhista do governo Michel Temer.
Como João Goulart na fase parlamentarista, sob a batuta inicial de Tancredo Neves em 1961, o Lula de 2023 será limitado por Alckmin, que não irá permitir que o titular ouse muito no seu governo. E aí se vê o que está por trás do discurso de Lula de que Alckmin irá "governar junto". Alckmin ficará com a parte mais técnica do seu governo, e Lula, com os projetos sociais patenteados pelo PT.
Alckmin ficará com setores como Economia, Agricultura, Indústria, Infraestrutura, Finanças, entre outros itens da logística técnica do governo. A lógica será neoliberal. Lula ficará com os projetos de grife: Bolsa Família, Fome Zero, Sistema de Cotas, SUS e Mais Médicos, Minha Casa Minha Vida e, agora, com o novo SUAS, Sistema Único de Assistência Social.
Impostos para ricos? Esqueçam, porque isso não vai haver. É jogo de cena para atrair votos. O que pode haver, quando muito, é cobrar imposto de empresário que apoiou o bolsonarismo até o fim. Os novos amiguinhos de Lula, ligados a Geraldo Alckmin, não vão gostar de pagar pela festa, pois o empresariado que apoia Lula acha que está fazendo um favor a ele, ajudando o petista a ser eleito.
Lula não vai agradecer a ajuda dos amigos mais ricos cobrando dinheiro deles. A burguesia que apoia o petista não vai querer pagar pela vitória eleitoral, porque o favor da vitória eleitoral já é algo que os mais ricos vão fazer, dando uma ajuda na qual as elites envolvidas vão querer ser pagas e não pagar pela ajuda que fizeram. É desagradável essa ideia, mas é o que pensa o empresariado.
O que pode haver é Lula tentando fazer jogo de cena e, depois, criar facilidades fiscais, como permitir que empresas criem iniciativas ou entidades filantrópicas para se livrar do Imposto de Renda. Aí seus novos amiguinhos não vão se preocupar, basta criar uma Fundação Isso ou um Instituto Aquilo para manter a isenção fiscal que, vamos combinar, já acontece por imposição das elites gananciosas.
Com esse papelão de desidratar seu projeto político, com Lula se aliando aos apóstolos do Estado Mínimo acreditando que fará um Estado forte, vemos que na prática o petista está se perdendo no caminho. Estado forte é eufemismo para a aplicação dos projetos de grife, por um lado, e o auxílio dos bancos públicos (BB, Caixa e BNDES) para ações da iniciativa privada, além também da participação coadjuvante do Estado nas PPPs (Parcerias Público-Privadas).
E aí o que vemos? Lula estacionando nos 44% ou tendo uma diferença de 8% a 12% sobre Jair Bolsonaro, recentemente envolvido em compras de imóveis com dinheiro público para ele, seus filhos e sua ex-mulher Ana Cristina Valle. Bolsonaro decai a olhos vistos, mas é bom ter muita calma, porque o extremo-direitista não se incomoda com crises e tem habilidade para contornar situações que parecem poder derrubá-lo.
Daí que Bolsonaro está recuperando fôlego. Enquanto isso, Lula não tem autocrítica, se perde entre se aliar com opositores pensando que eles vão facilitar suas aventuras esquerdistas, e afastou muitos de seus eleitores. Tudo indica que haverá segundo turno e Lula pode ganhar de maneira apertada, nesta segunda etapa, mas o Brasil não será feliz de novo.
Nada do Brasil virar Primeiro Turno, sucursal do Paraíso, uma Escandinávia dos trópicos. Com a participação da direita moderada, Lula contraiu dívidas políticas enormes e isso já prejudica seu programa de governo, que com toda sua negociação só vai dar um pouquinho mais para os pobres sem tirar dos mais ricos.
Muito pelo contrário. O próprio Lula falou várias vezes que em seus governos o empresariado saiu enriquecido. E agora o empresariado sairá mais rico ainda, enquanto aos pobres sobrarão as migalhas e os paliativos.
À grande festa da democracia de 02 de outubro a 01 de janeiro se dará, em seguida, no fim do baile de Cinderela e o "governo da mudança" se revelará uma conversa para boi dormir. Com as elites dormindo tranquilas com suas fortunas repousando fortes nos paraísos fiscais, turbinadas pelas ajudas do Lula.
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