Muita besteira é dita em prol da chamada música brega e toda a música popularesca em geral. Juízos de valor completamente sentimentaloides, vindas de intelectuais e artistas com discurso coitadista, sempre defendendo o tal "mau gosto popular".
São alegações burguesas de gente que fica dentro da sua bolha de classe média bem abastada, mas prestes a xingar seus pares quando estes se "fecham" na cultura musical de qualidade. Os partidários da bregalização cultural não conhecem o povo pobre, mas julgam ser "especializados" deles a partir de narrativas que eles veem através da grande mídia.
Ou seja, tudo o que nomes diversos, seja Paulo César de Araújo, Pedro Alexandre Sanches, Thiagsson, Eugênio Raggi, Zeca Baleiro, Rodrigo Faour, Mônica Neves Leme, Milton Moura, Rogério Skylab e tantos outros, falam e escrevem em favor dos fenômenos popularescos é puro etnocentrismo, é juízo de valor de burgueses paternalistas que pensam ser "mais povo que o povo".
Eles acham que podem dar a palavra final sobre a "verdadeira cultura popular" que atribuem ao brega-popularesco. Só porque passam umas oito ou dez horas tomando cerveja num botequim vagabundo que toca música popularesca em geral, não significa que eles tenham condições de entender a cultura popular. Eles não entendem, tudo o que eles imaginam ser a "verdadeira cultura popular" é uma narrativa caricatural que eles pegam do SBT, das novelas da Rede Globo, dos artigos "cabeça" da Folha de São Paulo etc.
Portanto, a chamada cultura "popular demais" ou brega-popularesca nada tem a ver com os autênticos processos de formação de uma genuína cultura popular. A cultura popular que, no passado, nos deu verdadeiros sambas, catiras, baiões, maracatus, frevos etc era transmitida horizontalmente, ou seja, através do convívio comunitário entre as pessoas.
Já a cultura brega-popularesca, não. Ela é vertical, imposta "de cima para baixo" por um esquema que envolve da colonização cultural dos referenciais estrangeiros à divulgação na mídia regional em cada região metropolitana ou interiorana.
Esqueçam comparações com a Antropofagia Cultural de Oswald de Andrade que o etnocentrismo barato da intelligentzia eventualmente difunde: a assimilação da cultura estrangeira pelo "popular demais" em nenhum momento tem a espontaneidade, a naturalidade e a criatividade dos antropófagos artístico-culturais. Na Antropofagia Cultural, a cultura estrangeira veio para somar à local, no brega-popularesco ela veio para subtrair.
Portanto, a choradeira que tenta creditar o brega-popularesco a paradigmas do folclore, difundida sob a roupagem de monografias, documentários e reportagens, é uma grande farsa, mesmo com todo o capricho de narrativas que possam arrancar prêmios de Jornalismo e Cinema, ou apareçam em periódicos acadêmicos respeitáveis.
Vamos explicar por que isso é uma farsa. Afinal, não dá para insistir que o tal "popular demais" é a verdadeira cultura popular. Primeiro, porque quem prega essa ideia são intelectuais burgueses que se disfarçam com a pose de coitadismo (Paulo César de Araújo, por exemplo) ou com um falso esquerdismo que mal consegue disfarçar uma postura arrogante e reacionária (tipo Eugênio Raggi). Entre essas duas posturas, aparecem Rodrigo Faour, Pedro Alexandre Sanches, Rogério Skylab, Fernanda Abreu, Mônica Neves Leme, Ivana Bentes e o que vier por aí.
Segundo, porque é óbvio que a chamada cultura brega-popularesca segue esquemas de mercado que envolvem relações de poder que não devem ser ignoradas, como uma sujeira escondida sob o tapete. São coisas que saltam aos olhos, exceto pela vista grossa manifesta pela acima citada intelectualidade "bacana" e seus artistas solidários. Vamos ao processo.
1) COLONIALISMO CULTURAL - A primeira etapa da bregalização cultural se manifesta pela introdução de referências culturais estrangeiras, a partir dos EUA. Mesmo fenômenos comerciais de outros países, como Canadá, México, Suécia, Itália e, principalmente, Grã-Bretanha, só entram no mainstream brasileiro primeiro por fazerem sucesso nos EUA e, segundo, por ganharem representantes de editoras de copyright atuantes no Brasil.
São essas editoras, por exemplo, que fazem com que The Outfield, inexpressivo na Grã-Bretanha, país de origem, seja supervalorizado no gosto médio dos brasileiros;
2) DIVULGAÇÃO NA MÍDIA OLIGÁRQUICA - A divulgação desses referenciais, não só musicais mas também comportamentais, se dá pelas grandes redes de rádio e televisão, e depois por veículos da grande mídia regional, sobretudo rádios "populares demais" controladas por poderosas famílias oligárquicas longe dos chamados "grandes centros";
3) ASSIMILAÇÃO DE UM PÚBLICO PROVINCIANO - Neste processo de comunicação hierárquica, que envolve manipulação de um povo subalterno para atender a interesses políticos e econômicos estratégicos, enquanto o poder midiático traz para as chamadas periferias a visão do "grande centro" (os EUA), o povo pobre, de maneira subordinada, assimila sem questionar esses referenciais, traduzindo conforme sua visão provinciana, bairrista e culturalmente precária, normalmente isolada do mundo.
4) PRODUTOS CULTURAIS BREGA-POPULARESCOS - O resultado é toda essa multidão do "popular demais", que inclui a música brega-popularesca, mas também subcelebridades, mulheres-objetos, apresentadores de policialescos da TV, que formatam todo um processo de precarização cultural que mantém a inferioridade social das classes populares, inferioridade que só é glamourizada pela narrativa hipócrita dos defensores da bregalização cultural que acima mencionamos.
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