LULA É UM GOVERNANTE OU UM ORADOR?
Muita gente foge de textos críticos sobre o governo Lula. Gente bem de vida, que só quer ouvir coisas agradáveis, coisas do tipo dizer que o presidente Lula "trabalha duro" até se estiver na praia de Saint Tropez com sua Janja. Não é a "classe média de Zurique" que é abandonada pelo presidente quando este prioriza de maneira precipitada e obsessiva a política externa.
Ter a barriga forrada de cerveja, picanha e descansar num apartamento confortável, enquanto vê à distância as favelas que, segundo a "boa" sociedade que se diz "tradicionalmente de esquerda", no seu "bom" etnocentrismo paternalista, pensa serem cenários de um carnaval permanente, como se os pobres ficassem o tempo todo rebolando, pulando e sacudindo os braços para cima em festa.
Há um Brasil que existe fora do Instagram e que, pelo jeito, não foi captado sequer pela mídia de esquerda, cada vez mais parecida com a mídia mainstream. Nossas redes sociais são predominantemente lidas por um pessoal mais burguês, que não aceita uma vírgula de crítica a Lula, esperando coisas agradáveis como dizer que Lula "reconstrói o Brasil" até se cantar "Viva La Vida" ou mesmo a infantil "Cuppycake Song" com Chris Martin e seu Coldplay.
Não, meus caros. Não dá para viver em positividade tóxica, não se pode estar de acordo com tudo. Ver que Lula, em vez de priorizar o combate à fome e à pobreza, priorizou a política externa. Lula desperdiçou lágrimas usando o discurso da fome para arrancar votos dos brasileiros? Ou são os brasileiros que desperdiçaram seus votos acreditando no candidato chorão pedindo voto em nome dos famintos?
Vamos parar para pensar. O que tem a ver um presidente discursando no exterior com a fome dos brasileiros? Discurso de presidente no exterior vai contribuir diretamente para encher a barriga dos mais pobres? Que as pessoas tenham um pouco de humildade e encarem textos críticos, porque aqui não é pregação lavajatista, bolsonarista ou coisa parecida. É visão realista, mesmo.
Outro aspecto é a alegação de que Lula, discursando, está fazendo História. Lula apenas produz fatos políticos, ele é um malabarista político, um ilusionista político. Ele dá a impressão de que "trabalha muito" apenas estando em lugares diferentes, mas a gente não vê resultado. O "resultado" é apenas a presença midiática de Lula em lugares diferentes e em diversas situações.
Para quem está bem de vida, não faz diferença isso e a reconstrução do Brasil. Tanto faz Lula ser orador ou governante, o que importa é Lula aparecer bem nos noticiários vistos pela "boa" sociedade no conforto de suas salas de estar ou durante seus passeios de carros SUV.
Só que vamos prestar atenção em uma coisa.
O que Lula faz não é fazer História. Os jornalistas da mídia progressista, que são realmente talentosos e inteligentes, mas recentemente deixaram de fazer o dever de aula para brincar no recreio, se arrogam também a brincar de serem historiadores. Falam de atos que Lula havia feito na véspera como se fossem as maiores façanhas históricas de 50 anos atrás. Chegam mesmo à pretensão de colocar Lula acima de Getúlio Vargas, o que, como vemos, é impossível.
Não se calcula uma façanha histórica. Fazer História não é como competir uma gincana estudantil. Afinal, não se trata de seguir competições do tipo "Primeiro viaje para a Amazônia ver o drama das tribos indígenas, depois viaje para a Argentina, Paraguai e Uruguai estabelecer cooperação sul-americana, depois vai para os EUA falar com Joe Biden, depois vai promover a paz entre Rússia e Ucrânia, depois vai para a China promover o mundo multipolar".
O papel histórico de Lula tenta ser forjado através de atos grandiloquentes. Aliás, grandiloquência é o que Lula perseguiu desde a candidatura à Presidência da República, quando ele promoveu um clima desnecessário de festa, afinal o Brasil estava devastado e precisava ser reconstruído. Não será uma micareta de axé-music que vai reflorestar a Amazônia, não é mesmo?
E se Lula não fosse conhecido, muita gente veria o pomposo cenário do Vale do Anhangabaú, aqui em São Paulo, de um comício que "reeditaria o Movimento Diretas Já", como "o palco dos Rolling Stones" e Lula seria confundido com um hipotético avô do Mick Jagger. A grandiloquência não surtiu efeito, pois o comício teve muita gente, mas abaixo daquilo que o PT desejava definir como "histórico", com direito a página inteira na capa da versão impressa da Folha de São Paulo e tudo.
Lula usava argumentos que forçam muito a barra para atender suas vontades. Afinal, Lula se acha o menino mimado da História, quer que o destino lhe atenda todos os seus favores, e qualquer desculpa é usada até para abafar erros. Se Lula faltou a certos debates presidenciais, como o SBT, que iria furar a bolha petista, a desculpa foi que o evento "coincidia" com o horário de um comício de campanha, o que, sabemos, é desculpa furada, pois o comício foi marcado com este propósito de fuga.
História requer ações mais espontâneas, e não calculadas. Entendo que a História não é uma dama para se fazer afagos, para agir como se quisesse ficar bem na fita e na foto. O juízo da História leva tempo e muita coisa que parecia grandiosa no momento presente teve seu poder diminuído com o passar dos anos. Muita coisa não passa de fogo de palha, do qual não sobra muito rastro na posteridade.
Mas Lula não está destinado a ser um personagem histórico? Até 2020, pode ser, mas de 2021 para cá ele se tornou uma figura medíocre, uma caricatura de si mesmo, uma paródia, se bem que bem menos divertida que a paródia feita pelo saudoso Bussunda, do Casseta & Planeta. Até porque Lula quis ser grandiloquente e isso só tem graça para quem é muito jovem para entender os fatos com profundidade ou quem está de bem com a vida que tapa os ouvidos e os olhos para quem avisa que algo está errado.
Para mim, os discursos de Lula na Europa ou em outros eventos, no contexto dos últimos dois anos, nada me dizem. Parecem boas ideias, boas intenções, até são. Mas não havia necessidade de Lula falar tanto, quando o ideal era que ele ficasse no Brasil, trabalhar mais e falar menos pela reconstrução do Brasil. Se não tivesse viajado para o exterior, Lula já teria se empenhado para baixar os juros exorbitantes de 13,75% e mandado exonerar o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Lula brinca de fazer história. Não reconstruiu o Brasil como se devia, os preços dos alimentos caíram pouco, o combate à fome fica comprometido. Mas para quem ganha R$ 10 mil em diante, que é o que atua em 99% das redes sociais, Lula está "mandando bem", porque esse pessoal tem dinheiro para comprar picanha a R$ 55.
Esse pessoal é que não suporta senso crítico e fica aplaudindo quando Lula faz discurso como se dissesse para a História: "Veja, dona História, como o Lulinha aqui é legal, fala bem e é aplaudido. Me arranja um lugar nobre na sua galeria, vai!".
O que sobra de palavreado que sai da boca de Lula em seus discursos cheios de pompa é em proporção inversa à da comida que entra nas bocas dos pobres. Fora da bolha lulista, a população pobre vê o atual governo com o mesmo ceticismo em relação ao anterior.
Não é o julgamento de valor da "classe média de Zurique", a elite do bom atraso que aplaude Lula feito foca amestrada, que irá falar em nome dos pobres, porque estes podem não ter voz nem vez nesta sociedade desigual, o que é terrível, mas não podemos aceitar que pessoas supostamente "esclarecidas" sejam "donas dos pobres", como ocorre com a intelectualidade pró-brega e a religião "espirita", que se julgam, no seu preconceituoso etnocentrismo paternalista, conhecerem os desejos, vontades e necessidades dos pobres.
Esse juízo de valor mostra o quanto essa elite "esclarecida" é ignorante e estúpida, num país em que Lula, querendo ser gigante, se encolhe pouco a pouco para no futuro se tornar debilitado e esquecido perante o julgamento da História.
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