Três grandes impérios midiáticos estão em decadência. A Rede Globo vive um inferno astral com as revelações de ambientes tóxicos nos bastidores e com as demissões e cancelamentos de contratos de vários profissionais, principalmente os veteranos que, de alguma forma, definiram a "cara" de sua programação.
O SBT amarga também violentas quedas de audiência desde que a rede de propriedade do apresentador Sílvio Santos - que "desenhou" a cultura "popular demais" que hoje conhecemos - surgiu, há 42 anos. E olha que o contexto popularesco garantiu, durante anos, audiência facil para o SBT, mesmo não estando na liderança total de audiência.
Mas é a Jovem Pan que amarga a pior situação. A rede desenvolveu um paradigma de pop juvenil brasileiro - cuja linguagem foi introduzida até nas "radios rock" 89 FM (SP) e Cidade (RJ) - e criou uma linguagem de vinhetas e estética visual, copiada até por rádios noticiosas, além de ter patenteado a gíria "balada" (surgida entre jovens ricos da Faria Lima e popularizada a partir de Luciano Huck). Mas ultimamente a emissora de Tutinha virou um reduto de visões bolsonaristas.
É devido ao conteúdo reacionário que a Jovem Pan difunde há mais de cinco anos, que lhe valeu o apelido pejorativo de Jovem Klan (alcunha que virou trend topic no Twitter, ontem), o Ministério Público Federal entrou em ação para pedir a cassação de concessão da JP, o que inclui tirar do ar toda a rede de rádios Jovem Pan e a Jovem Pan News. A JP também chegou a ter uma revista, que circulou nas bancas entre os anos 1990 e 2000.
Isso significa o fim da grande mídia? Que passaremos a ser um oásis de mídia alternativa e independente e a democracia cultural finalmente se mostrará fluente como o ar que respiramos? Com toda a certeza, não!
Em primeiro lugar, mesmo os bolsonaristas que chamam a Rede Globo de "Globolixo" foram educados por ela. Há uma educação midiática em que os valores culturais - e isso inclui o entretenimento popularesco que os intelectuais, em maioria, pensam vir das mentes intuitivas do povo pobre (eita etnocentrismo!) - são desenvolvidos por um "consórcio" midiático que envolve não só Globo, SBT e Jovem Pan, mas também Record, Folha, Estadão, Rede TV! etc.
E podemos também incluir as Big Techs de hoje em dia, que dão um verniz de "independência" e "fluência" do culturalismo vira-lata que corre solto nas redes sociais. Seria ingênuo creditar, como culturalismo vira-lata, apenas a hidrofobia escancarada de bolsonaristas e lavajatistas. Muita coisa "maravilhosa", como funqueiros, "médiuns espíritas", mulheres-frutas e ídolos cafonas do passado também integram o elenco viralatista por suas caraterísticas evidentes, mas nunca assumidas. Lembremos que muita dessa "admirável cultura" foi trazida por veículos como Globo e SBT.
Isso cria um quadro sociocultural devastador, apesar da aparente facilidade de divulgação ampla de informações e da rapidez de sua transmissão. É porque a degradação cultural, trazida pela bregalização e pela mediocrização artística, faz com que o Brasil esteja culturalmente pior do que há 60 anos.
Devemos também considerar que, entre 1985 e 1987, o governo José Sarney e seu ministro das Comunicações Antônio Carlos Magalhães realizaram uma série de concessões de rádio e TV para políticos e empresários aliados, uma farra política cujos efeitos começaram a se tornar mais evidentes já no governo de Fernando Collor. Essa farra de concessões também contribuiu para a expansão da cultura brega-popularesca ou "popular demais".
O declínio da Rede Globo, do SBT e da Jovem Pan e apenas a ponta do aicebergue de toda a deterioração cultural. O reacionarismo ideológico pesa muito, para que, nesse período atual de aparente reconstrução do Brasil (ainda muito tímida, diga-se de passagem), se comece a expurgar o entulho sociocultural que encontrou seu apogeu com Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Mas há muita coisa além que pode ser desmascarada, inclusive muita coisa adorada pelas esquerdas pela pretensa associação à alegria do povo pobre. Tudo está no começo das revelações, e muita coisa tida como "maravilhosa" - embora, nos tempos do general Ernesto Geisel, corresponda ao mais rasteiro culturalismo da época - ainda vai virar "vidraça", depois das tentativas de virar pretenso ouro.
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