LULA E O PRESIDENTE DOS EUA, JOE BIDEN, EM ENCONTRO ONTEM EM WASHINGTON.
Parece um conto de fadas. Ou um desses sonhos às avessas, que começam como pesadelos e terminam como sonhos bons. O golpe político de 2016 ocorreu há pouco tempo, sendo, na logística da história política, praticamente "ontem", e os retrocessos foram impostos pela classe política que tomou o poder, ao derrubar Dilma Rousseff. Veio Jair Bolsonaro e, de repente, tudo mudou e o tsunami de retrocessos parece que parou no meio do caminho em alto-mar e Lula voltou ao poder.
Tudo parece fácil demais. De repente, o Brasil, aparentemente, tem grandes chances de conquistar o Primeiro Mundo, com um governo teoricamente de "esquerda" e supostamente fiel às origens sindicais do atual presidente do nosso país. Tudo fácil demais, com um caminho que parece aberto demais, escancarado demais para um contexto que, até pouco tempo atrás, favorecia o reacionarismo político.
O encontro de ontem entre Lula e o presidente dos EUA, Joe Biden - em 2016, um dos mentores internacionais do golpe contra Dilma - , pareceu amistoso, como todo encontro político procura dar a impressão de ser. Falaram diversas coisas, sobretudo a garantia de proteção internacional da Amazônia - com uma doação de US$ 50 milhões para o Fundo Amazônia - , a garantia da "democracia" e a promessa em dificultar o caminho para a volta de Bolsonaro ao poder.
A única divergência visível é a de que os EUA querem que Lula adote uma posição contrária à Rússia, no caso da guerra contra a Ucrânia. Lula prefere criar um "clube da paz" e promover a negociação entre os dois países, em conflito que ocorre mais de três décadas depois que a Ucrânia deixou de se submeter à Rússia, que era o país central da antiga União Soviética.
Lula de repente virou o popstar político, com pretensões de ser o "cidadão do mundo". E isso há 40 dias sem adotar uma ação rápida e concreta para combater a fome e o desemprego. Lula se preocupa demais em desmontar o bolsonarismo e em promover e proteger a imagem do petista.
Tudo fica parecendo que as coisas vão bem no Brasil. Nossos miseráveis se tornaram invisíveis, substituídos por uma "pobreza" identitária mais perfumada e com um ranço de classe média, apenas representando uma seleção de "pobres" que conseguem conquistar prosperidade e visibilidade não pela justiça social, mas pelo caráter seletivo da meritocracia que premia apenas uma pequena parcela de oprimidos para figurarem junto ao "poder suave" dos opressores politicamente corretos de hoje.
Fico muito cético com o cenário do Brasil de hoje porque eu vejo muita mediocridade cultural, muita alegria sem motivo, uma onda de positividade tóxica que desmente o discurso lulista de que "vivíamos numa ditadura". Vejo grandiloquência em vez de grandeza, um despreparo para o Brasil alcançar o Primeiro Mundo, pois falta gente de Primeiro Mundo ou, se ela existe, é uma pequenina minoria sem voz nem vez.
Lula parece só ouvir a si mesmo. O que incomoda é que Lula acha que tem as respostas para tudo, o que, em princípio, não parece ser mal, se não fossem os erros diversos que ele fez na sua campanha e os atos que são feitos por impulso, pela vontade imperativa do presidente. Em seu malabarismo ideológico, Lula tenta unir a aliança com as elites do neoliberalismo - da burguesia empresarial da Faria Lima ao governo dos EUA - com o que restou de "palatável" ao projeto político de esquerda.
Lula apenas finge que desafia o mercado, finge que está fazendo decisões ousadas, cria uma pantomima que acaba contaminando a mídia progressista, cuja narrativa agora se corrompeu, tentando vender a imagem de um corajoso líder esquerdista que não existe mais.
As narrativas da mídia progressista se atropelam, pois, se por um lado tentaram, nos últimos tempos, justificar as alianças conservadoras de Lula - simbolizada pela figura do vice-presidente Geraldo Alckmin, aparentemente evitando a superexposição de sua imagem - , sob o rótulo um tanto tendencioso e suspeito de "democracia" (nome que cheira a desculpa de um projeto popular sabotado pela burguesia), por outro tentam manter o mito para sempre extinto do "Lulão esquerdão".
Tudo fica parecendo um jogo de cena. Falam que Lula "só quer governar". Mas seu governo, naquilo que mais importa e foi o motivo que Lula deu para os brasileiros votarem nele, que é o combate à fome, a miséria e o desemprego, nenhuma medida imediata e urgente foi adotada, apesar de tantos clamores de "urgência para reconstruir um Brasil devastado".
Muita pieguice foi usada, muita choradeira de Lula no palanque, muita paranoia da mídia progressista para ninguém votar na Terceira Via, muita agressão dos lulistas contra Ciro Gomes. Muitos atos constrangedores, vergonhosos e antidemocráticos da campanha de Lula, que desrespeitava a diversidade eleitoral, usando como "bandeira de campanha" o combate à fome. Agora que Lula é presidente da República, nada foi feito em prol dos famintos, apesar da fome não esperar jamais.
Só que ninguém vai sorrir de novo com a barriga roncando.
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